- Por expressa disposição legal, discordando a inventariante do pedido de
habilitação de crédito no inventário, as partes devem ser remetidas às vias
ordinárias, admitindo-se a reserva de bens suficientes para pagar o credor
quando a dívida constar de documento que comprove suficientemente a
obrigação e a impugnação não se fundar em quitação.
Apelo provido.
Apelação Cível n° 1.0344.05.021790-2/001 - Comarca de Iturama - Apelante:
Espólio de Elson Queiroz de Freitas, representado pela inventariante Maria
de Fátima Freitas Queiroz - Apelada: MGI - Minas Gerais Participações S.A. -
Relator: Des. Nilson Reis
A C Ó R D Ã O
Vistos etc., acorda, em Turma, a 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do
Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na
conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade
de votos, em rejeitar preliminar de não-conhecimento suscitada pelo Vogal e,
no mérito, dar provimento, à unanimidade.
Belo Horizonte, 26 de fevereiro de 2008. - Nilson Reis - Relator.
N O T A S T A Q U I G R Á F I C A S
DES. BRANDÃO TEIXEIRA - Sr. Presidente, pela ordem. Gostaria de levantar uma
preliminar.
A decisão que resolve habilitação de crédito em inventário decide mero
incidente no processo. O processo de inventário continua a despeito de
decidir se é de um ou de outro, ou de qualquer forma tal incidente.
Trata-se de uma decisão interlocutória, desafiadora de agravo, razão por que
dela não conheceria como apelação.
DES. NILSON REIS - Rejeito a preliminar suscitada, data venia.
DES. JARBAS LADEIRA - Também rejeito.
DES. NILSON REIS - Conheço do recurso, presentes os pressupostos de sua
admissibilidade.
Trata-se de habilitação de crédito requerida por MGI - Minas Gerais
Participações S.A., nos autos do inventário dos bens deixados por Elson
Queiroz de Freitas, afirmando-se credora do espólio, como cessionária dos
créditos pertencentes ao Banco do Estado de Minas Gerais S.A. - Bemge -,
pela importância de R$ 310.115,85 (trezentos e dez mil cento e quinze reais
e oitenta e cinco centavos). Juntou contrato de cheque especial, de mútuo e
de financiamento agrícola, além dos extratos bancários e dos cálculos dos
saldos devedores.
Discordando, a inventariante ofereceu "contestação", argüindo,
preliminarmente, a nulidade do processo, por não ter o banco credor
notificado o espólio da transferência do seu crédito à MGI - Minas Gerais
Participações S.A.; carência de ação e ilegitimidade ativa e passiva. No
mérito, entende necessário que se ajuste o contrato ao Código de Defesa do
Consumidor, de modo que incida multa de 2% (dois por cento) sobre o valor
nominal e juros de 0,5% (meio por cento), sem cobrança da comissão de
permanência.
Contra a decisão de f. 127-TJ, que rejeitou, de plano, as preliminares
suscitadas, a inventariante ofereceu o agravo retido de f. 128/129-TJ.
Julgado procedente o pedido para habilitar o crédito da autora (sentença de
f. 140/143-TJ), apelou o espólio de Elson Queiroz de Freitas, requerendo a
apreciação do agravo retido e, no mérito, enfatizando a sua discordância com
a habilitação postulada.
Recebido (f. 155-TJ), o recurso foi contra-razoado (f. 157/159-TJ).
A Procuradoria-Geral de Justiça opina pelo desprovimento do recurso (f.
165/170-TJ).
Este o relatório. Decido.
Do agravo retido (f. 128/129-TJ).
Satisfeita a condição do art. 523, § 1º, do CPC, conheço do agravo retido
aviado contra a decisão de f. 127-TJ, que rejeitou as preliminares de
nulidade do processo, de carência de ação e de ilegitimidade ativa e passiva
suscitadas na "contestação" ao fundamento de que "na cessão de crédito não
se exige o consentimento do devedor".
Como se observa, o agravante argüiu, como fundamento das preliminares
suscitadas, a nulidade da "cessão de crédito", porque dela não foi
notificado, donde faltar ao cessionário legitimidade ativa para requerer a
habilitação pretendida, e a ele, agravante, legitimidade passiva para
responder por ela, matéria de mérito, portanto, que com ele deverá ser, em
momento oportuno, examinada.
Assim sendo, nego provimento ao agravo retido.
Do recurso principal.
Versam os autos sobre habilitação de crédito requerida pela MGI - Minas
Gerais Participações S.A., cessionária dos créditos pertencentes ao Banco do
Estado de Minas Gerais S.A. - Bemge, no inventário dos bens deixados por
Elson Queiroz de Freitas, resistida pela inventariante, que dela discordou.
Sabidamente, a habilitação de crédito em inventário é procedimento de
jurisdição voluntária que segue as formalidades previstas nos arts. 1.017 a
1.021 do CPC.
Discordando o espólio, incide o disposto no art. 1.018 do CPC, verbis: "Não
havendo concordância de todas as partes sobre o pedido de pagamento feito
pelo credor, será ele remetido para os meios ordinários".
A propósito, ensina Humberto Theodoro Júnior:
"É indispensável o acordo unânime, porque a habilitação, in casu, é não
contenciosa. Por isso, não havendo concordância de todas as partes sobre o
pagamento, será o credor remetido para os meios ordinários (art. 1.018), ou
seja, terá ele de propor a ação contenciosa contra o espólio, que for
compatível ao título de seu crédito (execução ou ordinária de cobrança,
conforme o caso).
Há, porém, uma medida cautelar que o juiz toma, ex officio, em defesa do
interesse do credor que não obtém sucesso na habilitação: se o crédito
estiver suficientemente comprovado por documento e a impugnação não se
fundar em quitação, o magistrado mandará reservar, em poder do
inventariante, bens suficientes para pagar ao credor, enquanto se aguarda a
solução da cobrança contenciosa (art. 1.018, parágrafo único)" (in Curso de
direito processual civil. 30. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, v. 3, p.
245).
Ora, na hipótese sub judice, o crédito está suficientemente comprovado por
documento, e a impugnação não se fundou em quitação, razão pela qual
prudente se revela a reserva de bens em poder da inventariante, suficientes
para pagar à credora.
Nesse sentido, confira-se no trato jurisprudencial:
"Inventário - Impugnação oposta a pedido de habilitação de crédito. - Se o
espólio se manifesta contrariamente à habilitação de crédito, o feito deve
ser remetido às vias ordinárias. Admite-se a reserva de bens, quando se
trata de pedido instruído com documentos que comprovem suficientemente a
dívida e a impugnação não estiver fundada em quitação" (4ª CC, Apelação
Cível nº 1.0024.02.857382-2/001, Relator Des. Audebert Delage, p. em
10.12.2003).
"Habilitação de crédito em inventário - Ausência de concordância do
inventariante - Remessa das partes para as vias ordinárias - Bens reservados
em poder do inventariante para o pagamento da dívida - Inteligência do art.
1.018, caput e parágrafo único, do CPC. - Conforme determina o art. 1.018 do
Código de Processo Civil, não havendo concordância de todas as partes sobre
o pedido de pagamento feito pelo credor, será ele remetido para os meios
ordinários. O parágrafo único desse mesmo artigo, por sua vez, estabelece
que o juiz pode determinar a reserva de bens em poder do inventariante se a
dívida constar de documento que comprove a obrigação e a impugnação não se
fundar em quitação do débito" (8ª CC, Apelação Cível nº
1.0000.00.304042-5/000, Relator Des. Pedro Henriques, p. em 21.11.2003).
Assim sendo, com esses fundamentos, dou provimento à apelação para reformar
a sentença, indeferir a habilitação e determinar que sejam reservados bens
em poder da inventariante, suficientes para pagar à credora.
Custas, pela requerente.
DES. JARBAS LADEIRA - De acordo com o Relator.
DES. BRANDÃO TEIXEIRA - De acordo.
Súmula - REJEITARAM PRELIMINAR DE NÃO-CONHECIMENTO SUSCITADA PELO VOGAL E,
NO MÉRITO, DERAM PROVIMENTO, À UNANIMIDADE.
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