JURISPRUDÊNCIA CÍVEL
ARROLAMENTO - INVENTARIANTE - INÉRCIA - ABANDONO DA CAUSA - EXTINÇÃO DO
PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO - NULIDADE - INOBSERVÂNCIA DO ART. 995,
II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
Ementa: Inventário. Arrolamento. Extinção. Inércia da parte.
- Ante o manifesto interesse público, não pode o juiz extinguir, de ofício,
o inventário, sob a forma de arrolamento, por inércia da inventariante,
mesmo intimando-a, pessoalmente, a dar andamento ao feito, no prazo de 48
(quarenta e oito) horas. Em casos tais, ante a desídia da inventariante,
impõe-se sua remoção do cargo, mas não a extinção do processo. Decidindo
dessa forma, incorreu em nulidade o julgado recorrido.
Apelação Cível ndeg. 1.0479.03.055260-4/001 - Comarca de Passos - Apelante:
Maria Penha Lima Reis - Inventariante Espólio de Gaspar dos Reis e outro -
Relator: Des. Edivaldo George dos Santos
A C Ó R D Ã O
Vistos etc., acorda, em Turma, a 7ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do
Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na
conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade
de votos, em dar provimento.
Belo Horizonte, 04 de julho de 2006. - Edivaldo George dos Santos - Relator.
N O T A S T A Q U I G R Á F I C A S
DES. EDIVALDO GEORGE DOS SANTOS - Conheço do recurso interposto, visto que
presentes os pressupostos de sua admissibilidade.
Cuida-se de arrolamento de bens, deixados em virtude do falecimento de
Gaspar dos Reis, aforado por Maria Penha Lima Reis e outros, o qual foi
julgado extinto, sem apreciação de mérito, pelo r. Juiz de primeiro grau,
com base no disposto no art. 267, inciso II, do CPC.
Inconformados, os autores aviaram recurso de apelação, alegando, em resumo,
que, por entraves burocráticos, a inventariante não conseguiu carrear aos
autos todos os documentos necessários para ultimar o feito; que, porém, ante
o manifesto interesse público, não era dado ao Julgador extingui-lo, sem
julgamento de mérito; que tal procedimento pode ser instaurado até de ofício
pelo juiz; que também não foi adotada a providência do art. 995, II, do CPC,
que regula a hipótese de abandono; que não foi aplicado corretamente o
disposto no art. 267, VIII, SS 1º, do CPC, o qual obriga a intimação pessoal
da parte antes da extinção do processo; que, para tanto, não basta a
intimação da inventariante, mas sim de todos os interessados, culminando, ao
final, por pedir o provimento do recurso.
Analisando detidamente a questão, vejo que o inconformismo dos apelantes
merece acolhida:
É certo que o SS 1º do art. 267 do CPC é expresso ao condicionar a extinção
do feito paralisado há mais de um ano à intimação pessoal da parte, como se
infere de seu teor:
"Art. 267. Extingue-se o processo, sem julgamento do mérito:
I - Omissis.
II - quando ficar parado durante mais de 1 (um) ano por negligência das
partes;
(...)
SS 1º O juiz ordenará, nos casos dos ns. II e III, o arquivamento dos autos,
declarando a extinção do processo, se a parte, intimada pessoalmente, não
suprir a falta em 48 (quarenta e oito) horas".
Analisando-se os autos, vê-se que o ínclito Julgador singular cuidou de
determinar a concretização da intimação da inventariante, antes de proferir
a decisão guerreada. Só que, ante a desídia da inventariante, seria o caso
de substituí-la, e não de extinguir o processo, o que, no meu entender,
afronta o disposto no art. 995, II, do CPC, verbis:
"Art. 995. O inventariante será removido: (...)
II - se não der ao inventário andamento regular, suscitando dúvidas
infundadas ou praticando atos meramente protelatórios;".
Só a partir disso já se vê que se impõe a cassação do julgado primevo.
Colha-se a respeito a lição do Mestre Humberto Theodoro Júnior:
"O acertamento da transmissão de bens entre o morto e seus sucessores não
interessa apenas a estes. A Fazenda Pública e toda a sociedade têm real
interesse na definição do processo sucessório, tanto que até de ofício o
juiz deve instaurar o respectivo procedimento (art. 989).
Firmou-se, por isso, a jurisprudência no sentido de que a paralisação do
inventário ou arrolamento 'não justifica seja decretada a extinção do
processo'. Na verdade, 'cuidando-se, no inventário, de uma forma de
prestação de serviço público, por via judiciária, com o objetivo de
legitimar situações jurídicas de interesses particulares, que exigem o
concurso do Estado, para final constituição, nada justifica a extinção do
processo em face de sua paralisação'.
Por conseguinte, 'se o inventariante, porventura, se mostra desidioso,
deixando o feito paralisado indevidamente por tempo superior a 30 dias, o
que cumpre ao juiz fazer, de ofício ou a requerimento de qualquer
interessado, é simplesmente removê-lo e nomear outro em substituição, nos
termos dos arts. 995, nº II, e 996 do Código de Processo Civil, e nunca
declarar extinto o feito, mormente de ofício, por manifesta
incompatibilidade dessa providência com o processo de inventário'" (in Curso
de Direito Processual Civil. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1996, v. I, p.
310).
Corrobora a lição supra a jurisprudência desta egrégia Corte de Justiça:
"Ementa: Inventário - Arrolamento - Extinção do processo sem julgamento do
mérito por abandono da causa - Intimação pessoal do autor, nos termos do
art. 267, SS 1º, do CPC - Existência de bens - Ausência de intimação dos
demais herdeiros e interessados - Necessidade, diante da redação do art. 995
do CPC - Extinção do feito - Inadmissibilidade - Recurso provido.
- Em se tratando de arrolamento, ademais, não pode o magistrado extinguir o
feito sem antes intimar o espólio e os demais herdeiros, porquanto, nos
termos do art. 995, II, do CPC, se o inventariante não der andamento regular
ao inventário, a medida a ser tomada não é a extinção do feito, mas sim a
sua remoção'.
- Diante da norma contida no CPC, 995, II, o juiz não pode extinguir o
processo sem julgamento de mérito se o inventariante não der andamento
regular a ele. Isto porque prevalece a norma especial à geral do CPC 267 III
(Nelson Nery Junior)" (TJMG: Ap. Cív. nº 1.0245.03.023932-2/001, 7ª Câm. Cív.,
Rel. Des. Alvim Soares, v.u., DJ de 04.10.2005).
"Ementa: Inventário - Inércia do inventariante - Sentença que julgou extinto
o processo sem julgamento do mérito, com base no art. 267, II do CPC -
Intimação pessoal do inventariante - Inexistência.
- 1. Ante a inércia do inventariante, não pode o magistrado a quo extinguir
o feito sem julgamento do mérito, devendo nomear outro, já que detém o poder
de fazê-lo de ofício, conforme o art. 995, do CPC.
- 2. Ademais, para que ocorra a extinção do feito, elencada no art. 267, II,
do CPC, faz-se necessário a intimação pessoal do inventariante em
observância ao SS 1º deste" (TJMG: Ap. Cív. nº 306131-4, 8ª Câm. Cível, Rel.
Des. Pedro Henriques, v.u., DJ de 06.02.2004).
Sendo assim, conclui-se que incumbia ao Julgador singular providenciar a
remoção da inventariante de seu cargo, em vez de extinguir o feito, sem
julgamento de mérito. Assim procedendo, impõe-se cassar a sentença.
Com tais considerações, dou provimento ao recurso para cassar a sentença,
determinando o retorno dos autos à origem, a fim de que o feito tenha seu
regular processamento.
Custas, ex lege.
Votaram de acordo com o Relator os Desembargadores Wander Marotta e
Belizário de Lacerda.
Súmula - DERAM PROVIMENTO.
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