- Verificado o recebimento de intimação de
protesto pelo devedor, diante da certidão exarada pelo escrivão
competente, que goza de fé pública, irrelevante a falta de aviso de
recebimento, tornando-se patente a sua validade para fins de pedido de
falência.
- V. v.: - Embora os atos do tabelião gozem de fé pública, tal presunção
apenas pode alcançar aqueles atos que ocorreram no âmbito de sua
serventia e praticados por ele ou por serventuário autorizado. O mesmo
não se pode afirmar dos atos realizados fora do cartório, promovidos
pelos empregados dos correios ou equivalente, para os quais permanece
indispensável a confirmação do recebimento da intimação do protesto, bem
como a identificação do recebedor, sem o que não se pode, com base
naquele título, pedir falência. (Des. Brandão Teixeira)
Apelação Cível nº 341.104-8/000 - Comarca de Belo Horizonte - Relator:
Des. Nilson Reis
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a Segunda Câmara Cível do Tribunal de
Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de
fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas,
em dar provimento, vencido o vogal.
Belo Horizonte, 30 de setembro de 2003. - Nilson Reis - Relator.
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
O Sr. Des. Nilson Reis - Conheço dos recursos, porque presentes os
requisitos de admissibilidade.
Trata-se de recurso de apelação contra a r. sentença de fls. 146/150,
que julgou extinto o processo, pedido de falência, ajuizado pela
apelante em face da apelada, sem julgamento de mérito, nos termos do
art. 267, IV, do CPC, ao argumento de que não restou comprovada a
regularidade dos protestos, diante da ausência de identificação da
pessoa que recebeu a intimação.
Sustenta a apelante, em síntese, que "o título foi devidamente
protestado, sendo que a intimação foi efetuada pelo Correio" e que "não
há prova, em sentido contrário, de que a apelada não tenha sido
intimada, não havendo qualquer menção à devolução de Aviso de
Recebimento. Além disso, nos termos do art. 14 da Lei 9.492/97, tem-se
por intimada a parte, bastando para tanto, a entrega da intimação no
endereço fornecido pela apelante".
Tenho que assistida de razão.
O pedido da falência está embasado na documentação acostada à inicial,
ou seja, duas duplicatas sem aceite (fls. 52 e 55), notas fiscais (fls.
54 e 56) e protesto (fls. 53).
Infere-se do documento de protesto que a apelada foi intimada mediante
notificação entregue à ECT, razão pela qual se tem que o protesto
observou as formalidades legais, diante da não-exigência de que se
conste certidão de notificação pessoal do representante legal da
requerida.
É que a duplicata está sujeita ao protesto comum, sendo prescindível que
seja este título protestado na forma estabelecida no art. 10 do
Decreto-lei nº 7.661/45.
Dessa forma, concessa venia, não há exigência legal para que a intimação
recaia na pessoa do representante legal do devedor, uma vez que o
determinado no parágrafo 1º do art. 10 do referido diploma legal somente
é aplicável em relação aos títulos não sujeitos a protesto comum, o que
não é o caso dos autos.
A propósito, decidiu este egrégio Tribunal:
"Falência - Protesto - Inexistência de previsão legal que determine a
indicação, no instrumento, do nome da pessoa notificada pelo Oficial do
Registro de Protestos - Cassação da decisão que se impõe - Recurso
provido" (Ap. Cível 116.777-4/00; Relator Des. Sérgio Lellis Santiago;
j. em 04.05.99).
"Falência - Instrumento de protesto - Intimação por via postal -
Inexigível a juntada do AR comprovando a intimação. - É apta a inicial
desacompanhada de aviso de recebimento de intimação de protesto, posto
que de fé pública a certidão exarada por escrivão de haver intimação ao
devedor" (Ap. Cível nº 114.538-2, Relator Des. Abreu Leite, j. em
1º.09.98).
Portanto, como o protesto contém certidão de intimação da devedora e
este documento tem fé pública, inócua a exigência de comprovante de
intimação, tanto assim que a recorrida compareceu regularmente aos autos
e apresentou contestação às fls. 79/85.
Assim sendo, com estes fundamentos, dou provimento ao recurso, para
cassar a r. sentença, determinando seja dado prosseguimento ao feito.
Custas, ex lege.
O Sr. Des. Jarbas Ladeira - De acordo com o Relator.
O Sr. Des. Brandão Teixeira - Sr. Presidente. Peço vista dos autos.
Súmula - PEDIU VISTA O VOGAL. O RELATOR E O REVISOR DAVAM PROVIMENTO.
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
O Sr. Presidente (Des. Francisco Figueiredo) - O julgamento deste feito
foi adiado na sessão do dia 16.09.2003 a pedido do Vogal, após votar o
Relator e o Revisor dando provimento.
Com a palavra o Desembargador Brandão Teixeira.
O Sr. Des. Brandão Teixeira - Os presentes autos versam sobre recurso
voluntário contra sentença que, na ação falimentar proposta por Ale
Combustíveis S.A. contra Posto Mauá Ltda., julgou extinto o processo,
sem julgamento de mérito, a teor do artigo 267, IV, do Código de
Processo Civil.
Com a devida vênia dos ilustrados Desembargadores que me antecederam,
ouso divergir da orientação por eles adotada.
Como é por demais sabido, para que o credor requeira a falência do
devedor com amparo no artigo 1º da Lei de Quebras, é necessário haver
obrigação líquida, vencida, e não paga, constante de título que legitime
ação executiva. É necessário, ainda, que a impontualidade esteja
demonstrada com a certidão de protesto do título (artigo 11 do
Decreto-lei nº 7.661/1945).
No caso em análise, o pedido falimentar está embasado no artigo 1º do
Decreto Lei nº 7.661/75, fato este que implica a necessidade de
comprovar a impontualidade do devedor, mediante regular protesto.
Depreende-se do instrumento de protesto colacionado à fl. 53 que o
Oficial do 4ª Tabelionato de Protestos de Documentos de Dívida de Belo
Horizonte não indicou a pessoa que teria sido intimada, in verbis:
"Certifico que intimei o(s) devedor(es) através de notificação entregue
pela ect. Nada respondeu (eram)" (sic - v. fls. 53).
De acordo com o artigo 11, também da Lei de Quebras, o credor (artigo
9º), para requerer a falência do devedor com fundamento no artigo 1º,
deve "instruir o pedido com a prova da sua qualidade e com a certidão do
protesto que caracteriza a impontualidade do devedor".
José da Silva Pacheco, em comentários ao referido artigo 11, assinalou:
"Deve o pedido ser acompanhado da certidão do protesto, que caracteriza
a impontualidade do devedor. O protesto deve ter sido regular. Do seu
instrumento deve constar, pelo menos, o nome da pessoa que recebeu a
intimação, uma vez que somente quando identificada a pessoa intimada é
que se considera que o devedor foi intimado a pagar, e não o fez" (obra
já citada, p. 198).
Ressalta-se que a certidão do protesto que caracteriza a impontualidade
do devedor, para autorizar o pedido de falência por duplicata ou mesmo
triplicata não paga, há que ser extraído corretamente, de tal forma que
não enseje dúvidas quanto à pessoa que recebeu a intimação.
Como reforço dessa afirmativa, vale transcrever dispositivo contido na
lei que "define competência, regulamenta os serviços concernentes ao
protesto de títulos e outros documentos de dívida e dá outras
providências" (Lei nº 9.492/1997):
"Art. 14 - Protocolizado o título ou documento de dívida, o Tabelião de
Protesto expedirá a intimação ao devedor, no endereço fornecido pelo
apresentante do título ou documento, considerando-se cumprida quando
comprovada a sua entrega no mesmo endereço.
§ 1º - A remessa da intimação poderá ser feita por portador do próprio
tabelião, ou por qualquer outro meio, desde que o recebimento fique
assegurado e comprovado através de protocolo, aviso de recepção (AR) ou
documento equivalente".
Não há dúvida de que os atos do tabelião gozam de fé pública. No
entanto, tal presunção apenas pode alcançar aqueles atos que ocorreram
no âmbito de sua serventia e praticados por ele ou por serventuário
autorizado, em conformidade com normas legais de atribuição de
competência. O mesmo não se pode afirmar dos atos realizados fora do
cartório, promovidos pelos empregados dos correios ou equivalente, para
os quais permanece indispensável a confirmação do recebimento da
intimação do protesto, bem como a identificação do recebedor.
Outra não é a orientação desta douta Segunda Câmara, manifestada nos
autos da Apelação Cível nº 161.011-2, na qual funcionou como Relator o
eminente Desembargador Sérgio Lellis Santiago:
"Tem valor relativo, e não absoluto, a certidão do Sr. Tabelião no
instrumento de protesto. Esta Câmara, inclusive, em posição mais
rigorosa, tem inadmitido o pedido de falência sem que a prova da
intimação especifique até mesmo o nome de quem a recebeu, como se vê na
publicação da 'Jurisprudência Mineira', v. 145, p. 184, Relator o em.
Des. Abreu Leite, em que funcionamos como Vogal.
Temos, pois, acompanhado o entendimento jurisprudencial no sentido de
que 'O protesto, revestido das formalidades legais, inclusive com a
intimação pessoal do sacado, é conditio sine qua non para a legitimidade
do pedido de falência e, se irregular, não configurará título executivo
falencial e será imprestável para instruir a petição de quebra' (RF,
339/371).
A par das disposições do artigo 10 da Lei de Falências, diz a Lei nº
9.492, de 10.09.97, que, inobstante a superveniência ao protesto, vem
rechaçar as divergências jurisprudenciais e reforçar a posição que já
adotávamos sobre a matéria:
'Art. 14 - Protocolizado o título ou documento de dívida, o Tabelião de
Protesto expedirá a intimação ao devedor, no endereço fornecido pelo
apresentante do título ou documento, considerando-se cumprida quando
comprovada a sua entrega no mesmo endereço.
§ 1º - A remessa da intimação poderá ser feita por portador do próprio
tabelião, ou por qualquer outro meio, desde que o recebimento fique
assegurado e comprovado através de protocolo, aviso de recepção (AR) ou
documento equivalente' (grifamos).
Da mesma forma, o Código de Processo Civil, que se aplica supletivamente
à Lei de Falências, complementando as disposições do artigo 10 do
Decreto 7.661/45, claramente explicita a forma como se proceder ao
protesto, ao dispor em seu artigo 883:
'O oficial intimará do protesto o devedor, por carta registrada, ou
entregando-lhe em mãos o aviso'.
Não há dúvidas de que a intimação do protesto haverá de revestir-se de
maiores cautelas e formalidades, a fim de afastar dúvidas ou
inseguranças sobre o efetivo recebimento do aviso pelo seu destinatário,
levando-se em conta as sérias conseqüências que decorrem da decretação
da quebra de uma empresa" (pub. DJMG de 29.09.2000).
Nesta esteira, o egrégio Superior Tribunal de Justiça assim se tem
posicionado:
"Falência. Protesto. - Sendo o protesto precedido de notificação, a
regularidade desta exige seja identificada a pessoa que a recebeu. A
falta leva a que não se possa, com base naquele título, pedir-se
falência". (Superior Tribunal de Justiça, REsp 109.678/SC, Reg.
199600622817, Terceira Turma, v.u., julg. em 24.05.1999, Relator Min.
Eduardo Ribeiro, pub. DJ de 23.08.1999, p. 120.)
"Falência. Protesto. Necessidade da indicação da pessoa que recebeu a
intimação. Precedentes da Segunda Seção. Recurso especial.
Prequestionamento. Ausência. Recurso desacolhido.
- I. Na linha da orientação das Turmas da Segunda Seção, 'do instrumento
de protesto deve constar, pelo menos, o nome da pessoa que recebeu a
intimação'.
- II. O recurso especial não merece conhecimento quando ausente o exame,
pelo Tribunal de origem, da questão impugnada". (Superior Tribunal de
Justiça, REsp 130.292/SC, Reg. 199700305660, Quarta Turma, v.u., julg.
em 04.06.2002, Relator Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, pub. DJ de
12.08.2002, p. 212.)
Diante da irregularidade na efetivação dos protestos obrigatórios, os
títulos que acompanham a inicial não se prestam para o fim colimado.
Por fim, a falência é o resultado de uma situação de insolvência, que
não pode ser de modo algum superada a não ser com a quebra da empresa.
Contudo, em inúmeras ocasiões, credores desvirtuam a finalidade do
processo falimentar, empregando-o como forma de coação para a cobrança
de dívidas. Exatamente pela excepcionalidade da medida e pelos drásticos
efeitos sociais e econômicos que gera, devem-se examinar com máximo
rigor formal os pedidos de falência, para que não sejam distorcidos por
credores apressados (REsp 157.637, Relator Min. Ruy Rosado de Aguiar).
Ressalte-se que tal medida é tomada não apenas em razão do dever do
julgador de verificar a regularidade formal do processo, sobremaneira
dos requisitos e pressupostos de formação válida e regular deste, mas
também para evitar que atos processuais sejam praticados, em vão, nestes
autos, com prejuízos para as partes e para a máquina judiciária,
indevidamente movimentada.
Conclusão.
À luz do exposto e pedindo vênia aos meus Pares, nego provimento ao
recurso de apelação, para manter a sentença que extinguiu o processo,
sem julgamento de mérito.
Custas, pela apelante.
Súmula - DERAM PROVIMENTO, VENCIDO O VOGAL. |