O imóvel adquirido antes do casamento por
um dos cônjuges, mas registrado no cartório de imóveis somente durante o
matrimônio não se comunica ao cônjuge sobrevivente. O entendimento,
unânime, é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
A questão começou a ser discutida na Justiça em uma ação da mãe contra a
nora, viúva do proprietário do imóvel, falecido em novembro de 1997.
Afirmou que o filho foi casado sob o regime de comunhão parcial de bens,
de fevereiro de 1994 até a data em que morreu, tendo adquirido o imóvel
– um apartamento no Setor Sudoeste, bairro nobre da capital federal – em
dezembro de 1993. O registro do imóvel, contudo, só foi feito em 6 de
junho de 1995. Para confirmar suas alegações, foram apresentados o
contrato de cessão de direitos em promessa de compra e venda de imóvel e
o recibo de compra e venda dele.
Em primeiro grau, o pedido foi julgado improcedente, levando a mãe do
falecido proprietário do imóvel a apelar ao Tribunal de Justiça do
Distrito Federal e dos Territórios, onde conseguiu o reconhecimento da
incomunicabilidade do bem, garantindo seu direito sobre o apartamento.
A decisão levou a viúva a recorrer ao STJ. Em seu recurso especial, ela
alega que os documentos que foram apresentados são imprestáveis como
prova documental, pois destituídos de qualquer valor jurídico. Afirma,
também, que não há título aquisitivo do imóvel anterior ao casamento,
tampouco termo ou condição na escritura pública de compra e venda
"lavrada um ano e três meses depois do casamento e em sua plena
vigência, assegurando, desta forma, a comunicabilidade do imóvel".
Para a viúva, "se porventura tivessem qualquer valor probante, como
efetivamente não têm, as datas lançadas nos aludidos papéis de fls. 12 e
31/33 não poderiam ser opostas à recorrente, a qual é terceira em
relação a eles, os quais, se lhes fosse possível conferir qualquer valor
jurídico, considerar-se-iam datados da morte do seu falecido marido".
Para a ministra, Nancy Andrighi, relatora do processo, não é possível ao
STJ apreciar se prestam ou não os documentos apresentados como prova,
pois o tribunal, ao julgar o apelo, destacou vários fatos cuja
apreciação pelo STJ importaria reapreciar provas, o que é vedado pela
Súmula 7.
Em relação à questão central do recurso – se há comunicabilidade ou não
de imóvel adquirido antes do casamento realizado sob regime de comunhão
parcial de bens, mas registrado já na vigência do matrimônio –, a
ministra Nancy Andrighi entendeu que não havia o que ser corrigido na
decisão do Judiciário brasiliense. Dessa forma, não conheceu do recurso,
mantendo assim a interpretação do TJDF sobre a questão no sentido de que
"o imóvel disputado resta incomunicável porquanto sua aquisição tem por
título causa anterior ao casamento".
Para embasar seu posicionamento, a ministra apresenta doutrina de Pontes
de Miranda, segundo o qual todas as conseqüências de ações que nasceram
antes do casamento são pertinentes aos bens incomunicáveis. "O que
decide é o momento em que nasceu a ação". Destaca, ainda, o jurista Caio
Mário da Silva, para quem "o que determina a exclusão é o fato de o
título aquisitivo ser anterior ao casamento, embora a aquisição se
aperfeiçoe na constância do casamento, como no caso de uma promessa de
compra e venda celebrada antes e somente executada depois das núpcias".
Nesse contexto – afirma a ministra –, a própria jurisprudência do STJ
tem abrandado a necessidade da regra jurídica "que sobreleva a
formalidade em detrimento do direito subjetivo perseguido". Contudo,
para que tal ocorra, "é necessário que a forma imposta esteja
sobrepujando a realização da Justiça". Ressaltando ser o caso da Súmula
84 do STJ que admite embargos de terceiro sob alegação de posse advinda
de compromisso de compra e venda de imóvel ainda não registrado em
cartório.
A relatora cita, ainda, voto do ministro Eduardo Ribeiro, também da
Terceira Turma, que embora não trate do caso específico, discute questão
semelhante: "Incomunicabilidade do bem, em virtude da norma contida no
artigo 272 do Código Civil, uma vez que a escritura de venda, feita após
o casamento, traduziu o cumprimento da promessa a ele anterior e a
parcela paga naquele ato o foi por doação de terceiro e os bens assim
havidos não se comunicam".
|