A ação popular é um instrumento inadequado para que os entes estatais
recuperem possíveis prejuízos sofridos com fraudes à herança que possam vir
a compor o patrimônio público. A decisão é do Superior Tribunal de Justiça
(STJ), que rejeitou tentativa do município de Porto Alegre de utilizar esse
tipo de ação para anular um testamento milionário e suspeito de fraude,
deixado por uma senhora aposentada no Rio Grande do Sul.
Segundo decisão da Quarta Turma, a ação popular é o meio utilizado para
questionar atos lesivos ao patrimônio público, à moralidade administrativa,
ao meio ambiente, ao patrimônio histórico e cultural, mas não para defender
perspectiva de direito dos entes estatais. O relator, ministro Luis Felipe
Salomão, sustentou, no caso, que, ainda que prosperasse a alegação de
fraude, não teria por certo uma lesão ao patrimônio público, pois eventuais
herdeiros podem aparecer.
O município de Porto Alegre reclama, na ação principal, a anulação do
testamento, com o objetivo de retomar a herança jacente – recebida quando
não há ou não se conhecem herdeiros legítimos. O testamento está sendo alvo
de discussão judicial desde o final dos anos 90. Só no município, são 60
imóveis, em uma fortuna calculada em mais de 10 milhões em valores da época.
Segundo a defesa, o testamento foi fraudado. A senhora não tinha a mínima
condição de firmá-lo: estava em coma e em estágio terminal.
Os suspeitos de fraude são sócios da imobiliária que gerenciavam os imóveis
da falecida e o único herdeiro a reclamar direito na Justiça é de quinto
grau, e, por isso, excluído pela juíza de primeira instância da ordem de
vocação hereditária. Segundo decisão da Quarta Turma do STJ, o município não
pode reclamar via ação popular por uma herança incerta, fruto de um litígio
de ordem eminentemente privada. “O interesse da administração pública é
reflexo, em razão da possível razão da herança em vacante”, esclareceu o
ministro Luis Felipe Salomão.
“Não Há dano direto causado à administração, nem tampouco lesão frontal a um
interesse seu, apenas se, eventualmente, acolhida a tese de nulidade de
testamento e não havendo outros herdeiros, portanto sob condições futuras e
incertas”, afirmou Luís Felipe. “A jacência, ao reverso do que pretende
demonstrar o recorrente, pressupõe a incerteza de herdeiros, não
percorrendo, necessariamente, o caminho rumo à vacância, tendo em vista que,
após publicados os editais de convocação, podem eventuais herdeiros se
apresentarem, dando-se início ao inventário, nos termos dos artigos 1819 a
1823 do Código Civil”.
REsp 445653
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