Pela primeira vez no Brasil um imóvel rural é desapropriado por
descumprimento da função social em relação à legislação ambiental. A Fazenda
Nova Alegria, no município de Felisburgo (MG), vai se transformar em
assentamento de reforma agrária para 37 famílias de trabalhadores rurais.
A decisão, publicada no Diário Oficial da União (DOU) desta quinta-feira
(20), tem como justificativa o descumprimento do artigo 186 da Constituição.
O artigo cita que uma propriedade rural cumpre a função social ao atender,
simultaneamente, aos seguintes requisitos: aproveitamento racional e
adequado; utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e
preservação do meio ambiente; observância das disposições que regulam as
relações de trabalho; exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários
e dos trabalhadores.
A procuradora chefe da Procuradoria Federal Especializada (PFE) do Incra,
Gilda Diniz dos Santos, diz que o próximo passo é ajuizar uma ação judicial
de desapropriação da área. "Em até 50 dias o Incra deve estar de posse da
área, depois de preparar a documentação e solicitar tal pedido à justiça",
disse.
Gilda afirma ainda que a decisão abre um precedente jurídico para que
diversas outras áreas que também não cumpram a legislação ambiental sejam,
da mesma forma, desapropriadas para fins de reforma agrária. "Com essa
desapropriação, cria-se jurisprudência, que pode ser aplicada em casos
correlatos. Essa é uma vitória almejada há duas décadas", opina.
O superintendente regional do Incra em Minas Gerais, Gilson de Sousa,
considera a decisão uma vitória. "O estado de Minas Gerais está em festa,
pois diversas entidades tiveram parte decisiva nesta vitória. Isso é também
uma lição para o latifúndio que pratica crime ambiental", afirma o
superintendente.
O integrante da coordenação nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais
Sem Terra (MST), Vanderlei Martini, acredita que o precedente jurídico
aberto com a decisão irá possibilitará novas áreas reforma agrária. "Várias
áreas esparramadas por Minas Gerais e pelo Brasil podem ser desapropriadas
utilizando a jurisprudência deste caso. Esta decisão e a atualização dos
índices de produtividade rural são boas notícias para os movimentos sociais
que defendem a reforma agrária", assegura o coordenador. A atualização dos
índices de produtividade deve sair em 15 dias como anunciou o ministro do
Desenvolvimento Agrário, Gulherme Cassel, na última terça-feira (18).
Massacre
A Fazenda Alegria foi palco de um massacre, em novembro de 2004, quando
cinco trabalhadores rurais sem-terra foram assassinados e outros 20 feridos.
Houve ainda a queima de 30 barracos e a destruição de uma escola.
Os trabalhadores rurais acusaram, à época, proprietário da fazenda, Adriano
Chafik, acompanhado de jagunços, de atirar contra dezenas de famílias
causando os assassinatos.
Processo
A Advocacia Geral da União (AGU) ratificou o parecer da PFE. O processo foi
suspenso por duas vezes graças a liminares concedidas a favor do
proprietário da área que responde a processos criminais por responsabilidade
na morte dos trabalhadores.
Desde maio 2002, dezenas de famílias de trabalhadores rurais sem-terra
mantêm acampamento no local.
O laudo de vistoria do Incra/MG realizado em 2006 atestou a produtividade do
empreendimento rural, mas observou o descumprimento da função social, haja
vista, a utilização de toda a Área de Preservação Permanente (APP) para a
criação de gado.
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