A inexistência da prova de patrimônio adquirido pelo esforço comum é
circunstância suficiente para afastar a configuração de sociedade de fato,
porque é pressuposto para seu reconhecimento. A conclusão é da Terceira
Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O processo teve início com ação de reconhecimento de sociedade de fato
proposta por concubina contra a esposa legítima, após a morte de deputado
estadual da Paraíba, com quem manteria relacionamento amoroso concomitante
ao casamento. Ela afirma que era funcionária da Assembleia Legislativa
quando o caso começou, em 1973, tendo nascido dois filhos da relação.
Na ação, a concubina pediu que fosse reconhecida a sociedade de fato mantida
por 31 anos com o deputado, pois ela e os filhos viviam sob sua dependência
econômica e afetiva, durante o relacionamento que durou até a morte do
parlamentar, em 2004. Ele foi casado desde 1962 até morrer e também tinha
dois filhos com a esposa.
Ao contestar a ação, a defesa da viúva alegou, em preliminar, a
impossibilidade jurídica do pedido, pois o marido jamais deixou o lar
conjugal ao longo dos 42 anos do casamento. Afirmou que cuidou do marido em
sua enfermidade anterior à morte violenta, em longa peregrinação médica. Por
fim, rebateu a existência tanto de concubinato quanto de união estável.
A sentença julgou improcedente o pedido. Segundo o juiz, não houve prova da
contribuição do esforço comum para a aquisição de bens que pudessem
constituir um patrimônio. Ao julgar apelação, no entanto, o Tribunal de
Justiça da Paraíba declarou a existência da sociedade de fato. O tribunal
estadual entendeu ser desnecessária a comprovação do patrimônio adquirido
pelo esforço comum quando não se está pedindo a dissolução judicial da
sociedade de fato, mas apenas a sua declaração, como no caso.
A viúva recorreu, então, ao STJ. Por maioria, a Turma reformou a decisão.
Segundo a ministra Nancy Andrighi, relatora para o acórdão, embora a
concubina tivesse mantido relacionamento com o falecido, não fez prova
alguma da existência de bens eventualmente acumulados ao longo do
concubinato.
A relatora considerou que a “simples convivência sob a roupagem de
concubinato não confere direito ao reconhecimento de sociedade de fato, que
somente emerge diante da efetiva comprovação de esforço mútuo despendido
pelos concubinos para a formação de patrimônio comum. Isso porque a
existência de sociedade de fato pressupõe, necessariamente, a aquisição de
bens ao longo do relacionamento, para que se possa ter por caracterizado o
patrimônio comum”.
Em seu voto, a ministra afirmou, ainda, que, de um homem na posição
ostentada pelo deputado no cenário social e econômico, espera-se sagacidade
e plena consciência de seus atos. Segundo a ministra, se ele pretendesse
extrair efeitos jurídicos, notadamente de cunho patrimonial, em relação à
sua então concubina, promoveria em vida atos que demonstrassem sua intenção
de com ela permanecer na posse do estado de casados, afastando-se, dessa
forma, do lar conjugal. “Se não o fez, não o fará, em seu lugar, o Poder
Judiciário, contra a vontade do próprio falecido”, concluiu Nancy Andrighi. |