O Ementa: Processual civil. Cumprimento de sentença. Depósito judicial.
Nomeação de bens à penhora. Discordância do exeqüente. Penhora on line.
Princípio da menor onerosidade. Recurso provido.
- A ordem legal estabelecida para a nomeação de bens à penhora não tem
caráter rígido, devendo sua aplicação atender às circunstâncias do caso
concreto, à potencialidade de satisfazer o crédito e à forma menos onerosa
para o devedor.
- A penhora de valores de conta corrente pode acarretar o comprometimento
dos compromissos financeiros e atividades econômicas e administrativas da
devedora.
- Havendo indicação de bens cujos valores são capazes de garantir a
execução, além de depósito judicial da quantia incontroversa, a determinação
da penhora em dinheiro contraria a legislação processual que determina que a
execução deve fazer-se pelo modo menos gravoso para o devedor.
Agravo ndeg. 1.0024.00.127623-7/003 - Comarca de Belo Horizonte - Agravante:
Telemig Celular S.A. - Agravada: Celulares BH Telecomunicações Ltda. -
Relator: Des. José Flávio de Almeida
A C Ó R D Ã O
Vistos etc., acorda, em Turma, a 12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do
Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na
conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade
de votos, em dar provimento.
Belo Horizonte, 30 de maio de 2007. - José Flávio de Almeida - Relator.
N O T A S T A Q U I G R Á F I C A S
DES. PRESIDENTE - O julgamento deste feito foi adiado na sessão anterior, a
pedido do Des. Primeiro Vogal, quando, então, o Des.Relator dava provimento.
DES. JOSÉ FLÁVIO DE ALMEIDA - Telemig Celular S.A. interpõe recurso de
agravo de instrumento, nos autos de execução de sentença, que lhe move
Celulares BH Telecomunicações Ltda. contra a decisão de f. 184-TJ, proferida
pelo MM. Juiz da 30ª Vara Cível da Comarca de Belo Horizonte, que concluiu:
"Tendo em vista que a nomeação à penhora não observou a ordem do artigo 655
do CPC, fica portanto ineficaz, com fulcro no art. 656, I, V e VI do mesmo
Diploma Legal. Ademais, não houve aceitação por parte do exeqüente (f.
695/696). Assim, indefiro a referida nomeação" (sic).
Conheço do recurso, visto que presentes os pressupostos de admissibilidade.
Trata-se de cumprimento de sentença em virtude de condenação em processo de
conhecimento, no qual a agravante foi condenada ao pagamento de "remuneração
pelos serviços prestados" no valor de R$ 74.026,39 (setenta e quatro mil e
vinte e seis reais e trinta e nove centavos), acrescidos de multa de 0,3%
(três décimos por cento), a contar da data do implemento da condição
resolutiva (30.09.1998) a título de multa pela rescisão contratual, por dia
que exceder o prazo para o pagamento".
Contra a sentença foram interpostos recursos de apelação pelas partes,
autora e ré, às quais foi negado provimento, transitando em julgado em
18.04.2006, conforme certidão de f. 50-TJ.
Iniciada a fase de cumprimento de sentença (f. 51/56-TJ e f. 65-TJ), a
agravante foi intimada para pagar o débito apontado na memória de cálculo
apresentada pela agravada.
Devidamente intimada (f. 104-TJ), a executada apresentou comprovante de
pagamento da importância que entende devida, nos termos da memória de
cálculo ofertada, e ofereceu bens à penhora. (f. 105/106-TJ).
Peticionando nos autos, a agravada não concordou com a nomeação, por não
obedecer à ordem estabelecida no art. 655 do CPC, requerendo a penhora em
dinheiro sobre os valores depositados em conta corrente de titularidade da
agravante no Banco do Brasil, conforme informado nos autos. (f. 180-TJ, sic)
O Magistrado entendeu que a penhora não observou a ordem do art. 655 do CPC,
sendo, portanto, ineficaz, além do fato da não-aceitação pela exeqüente,
indeferindo a nomeação de f. 105/106-TJ.
A Lei 11.232/2005 trouxe modificações ao Código de Processo Civil quanto ao
procedimento de cumprimento de sentença.
O art. 475-J, em seu SS 3º, prevê a possibilidade de o exeqüente indicar
bens do devedor no momento em que requerer a penhora e a avaliação.
É pacífico o entendimento de que a execução se dará, sempre, da forma menos
onerosa possível ao devedor, princípio concernente ao processo de execução,
agora cumprimento de sentença, com o objetivo de satisfazer o credor (CPC,
art. 620).
Assegurado o cumprimento da sentença pelo depósito do valor incontroverso e
indicação de bens à penhora, tem-se assegurada a finalidade do processo
executório.
Depreende-se da documentação acostada aos autos que a agravante efetuou o
depósito da quantia que entende incontroversa, informada em memória de
cálculo, no valor de R$ 234.100,97 (duzentos e trinta e quatro mil e cem
reais e noventa e sete centavos) (f. 107-TJ e f. 178-TJ).
Além do depósito, ofereceu à penhora o imóvel comercial localizado na Rua
Doutor Ismael de Faria nº 91, Bairro Luxemburgo, "Registro: lotes nº 04-A,
06-A, 08-Ada quadra 418, da ex-colônia Afonso Pena" (f. 150/152-TJ), e do
imóvel residencial situado na Rua Tômpson Flores, nº 80, no Bairro Prado,
"Registro: Casa da Rua Tômpson Flores, 80, casa residencial de 2 pavimentos,
com todas suas benfeitorias, instalações e pertences, e seu respectivo
terreno, lote nº 4-A, do quarteirão nº 129, da 3ª Seção Suburbana, com área,
limites e confrontações de acordo com a planta respectiva" (f. 154/156-TJ)
Os registros dos imóveis oferecidos à penhora comprovam a propriedade da
agravante, sendo possível que se exijam certidões atualizadas.
Colhem-se das avaliações juntadas aos autos (f. 160-TJ, f. 162/162-TJ, f.
164/166-TJ) os valores dos imóveis, que se mostram suficientes para garantir
o juízo.
O depósito judicial da quantia incontroversa demonstra a intenção da
agravante de quitar seu débito.
A agravante é empresa que possui idoneidade econômica e financeira para
assegurar a satisfação do crédito, mas penhorar capital de giro necessário
ao regular desenvolvimento de sua atividade precípua não se afigura menos
oneroso.
Conforme afirmado pela agravante, a penhora de valores em sua conta corrente
pode "afetar sobremaneira as atividades da empresa, indisponibilizando parte
de seu capital de giro" (f. 07-TJ, sic).
Theotônio Negrão leciona:
"A ordem legal estabelecida para a nomeação de bens à penhora não tem
caráter rígido, devendo sua aplicação atender às circunstâncias do caso
concreto, à potencialidade de satisfazer o crédito e à forma menos onerosa
para o devedor" (RSTJ 1.27/343). No mesmo sentido: RSTJ 150/405.
Ainda:
"Locação. Processual civil. Execução de aluguéis. Nomeação de bens à
penhora. Ordem legal. Caráter relativo. Art. 620 do CPC.
- A ordem legal estabelecida para a nomeação de bens à penhora não tem
caráter absoluto, devendo sua aplicação atender às circunstâncias do caso
concreto, à potencialidade de satisfazer o crédito e ao "princípio da menor
onerosidade da execução", inscrito no art. 620 do CPC. Precedentes.
- In casu, a e. Corte a quo entendeu, acertadamente, que a constrição
deveria recair sobre os bens imóveis indicados, porquanto a penhora sobre o
dinheiro existente na conta bancária da executada comprometeria o próprio
capital de giro da empresa em detrimento dos fins por ela colimados. Recurso
não conhecido" (REsp 445684/SP; REsp 2002/0080078-1. Relator: Ministro Felix
Fischer (1109). Órgão julgador: T5 - Quinta Turma. Data do julgamento:
05.12.2002. Publicação: DJ de 24.02.2003, p. 284).
Dessa forma, entendo estar garantido o juízo da execução pelo depósito
judicial e pelos bens oferecidos à penhora, não sendo plausível a penhora de
valor em conta corrente da agravante.
Ante o exposto, dou provimento ao recurso, para reformar a decisão agravada,
considerando como eficaz a nomeação de bens à penhora pela agravante.
Custas recursais, pela agravada.
DES. NILO LACERDA - Acuso o recebimento de substanciosos memoriais de ambas
as partes. O da agravante firmado pelas ilustres advogadas Lucila de
Oliveira Carvalho e Carolina Andrade M. Bernardes e o da agravada, pelo
conceituado advogado Marco Túlio de Carvalho Rocha. Dispensei a devida
atenção às bem-elaboradas peças nas quais cada parte defende as suas razões.
Pedi vista do processo antes de proferir o meu voto para melhor me situar
sobre o seu conteúdo, uma vez que não havia tido tempo para um exame mais
minucioso como o caso "sub lite" exige.
Em que pese serem de grande profundidade as razões elencadas pela agravada,
não me convenci do seu acerto.
É que a execução deve dar-se da forma menos gravosa para o executado,
segundo inteligência do art. 620 do Código de rito.
O valor executado, segundo os cálculos da exeqüente, é de R$ 1.615.287,99. O
"quantum" reconhecido e depositado pela executada foi de R$ 234.100,97. A
diferença em debate é de R$ 1.381.187,00 (um milhão trezentos e oitenta e um
mil cento e oitenta e sete reais).
Em que pese a ordem de preferência contida no art. 655 do CPC, considerando
o valor da diferença debatida e, mais, a solidez pública e notória da
executada, além de que o valor da diferença demandada pode influir nos
planos e administração de qualquer empresa, entendo razoável a aceitação dos
imóveis oferecidos em garantia do juízo até mesmo porque, em se concluindo
estar a razão com a exeqüente, em se fracassando a tentativa de alienação
judicial dos imóveis, a parte poderá, amparada no inciso VI do art. 656 do
Código de Processo Civil, requerer a substituição da penhora por dinheiro,
operacionalizando o ato nos termos do contido no art. 655-A do CPC, que
reza:
"Para possibilitar a penhora de dinheiro em depósito ou aplicação
financeira, o juiz, a requerimento do exeqüente, requisitará à autoridade
supervisora do sistema bancário, preferencialmente por meio eletrônico,
informações sobre a existência de ativos em nome do executado, podendo no
mesmo ato determinar sua indisponibilidade até o valor indicado na
execução".
Com essas considerações, acompanho o entendimento esposado pelo digno
Relator e também dou provimento ao presente recurso para reformar a r.
decisão agravada e considerar eficaz a nomeação de bens à penhora feita pela
agravante.
DES. ALVIMAR DE ÁVILA - Acompanho os votos que me antecederam, uma vez que o
juízo já se encontra devidamente garantido, tal qual devidamente explicitado
no voto do ilustre Relator.
Súmula - DERAM PROVIMENTO. |