Espólio é parte legítima para figurar no polo passivo de ação de
reconhecimento e dissolução de união estável. A conclusão unânime é da
Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que não conheceu de
recurso especial do espólio contra alegado ex-companheiro do falecido.
A ação de reconhecimento de dissolução de sociedade de fato foi proposta
pelo suposto companheiro contra o espólio do alegado companheiro. O espólio
contestou o pedido, alegando ilegitimidade de parte com base no artigo 1.572
do Código Civil de 1916, que dispõe: “aberta a sucessão, o domínio e a posse
da herança transmitem-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e
testamentários". Segundo defendeu, a legitimidade para figurar no polo
passivo da ação seria dos herdeiros, não do espólio.
Em decisão de saneamento do processo, a ilegitimidade foi afastada sob o
fundamento de que, enquanto não concluída a partilha, o espólio é
representado pela inventariante sem prejuízo do ingresso dos demais
herdeiros. Insatisfeito, o espólio interpôs agravo de instrumento.
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) negou provimento, entendendo que,
se a partilha ainda não foi efetivada nos autos do inventário, é do espólio
a legitimidade para responder aos atos e termos da ação proposta. Segundo o
tribunal, os herdeiros, se desejarem, poderão ingressar nos autos como
litisconsortes facultativos. Embargos de declaração foram opostos, mas
acolhidos apenas para rejeitar o pedido de aplicação de pena por litigância
de má-fé.
No recurso para o STJ, o espólio insistiu em seus argumentos, afirmando,
ainda, que a decisão do TJSP ofendeu o artigo 267, VI, do Código de Processo
Civil (CPC), bem como os artigos 1.577, 1.572 e 1.580 do Código Civil de
1916.
A Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial, “Os
artigos 1.577 e 1.580 [...] não têm pertinência para a causa”, afirmou
inicialmente a ministra Nancy Andrighi, relatora do caso. Para a ministra,
“com efeito, não há controvérsia, nos autos, nem acerca da capacidade para
suceder no tempo da abertura da sucessão (art. 1.577), nem a respeito da
indivisibilidade dos bens (art. 1.580)”, observou.
Segundo afirmou a relatora, o caso diz respeito apenas à legitimidade
passiva dos herdeiros ou do espólio, que tem, sim, capacidade processual
tanto ativa quanto passiva, sendo claro o artigo 12 do CPC ao indicar, em
seu inciso V, que o espólio, em juízo, é representado pelo inventariante.
“Dessa norma decorre que, em regra, as ações que originariamente teriam de
ser propostas contra o de cujus devem, após seu falecimento, ser propostas
em face do espólio, de modo que a eventual condenação possa ser abatida do
valor do patrimônio a ser inventariado e partilhado”, esclareceu,
ressalvando, ainda, a possibilidade de os herdeiros ingressarem no processo.
“Mas não há ilegitimidade do espólio ou litisconsórcio unitário”, ressaltou.
Após negar provimento ao recurso especial, a relatora observou, ainda, que
tal conclusão não é contrária à regra que determina a imediata transferência
da herança aos herdeiros, com a morte do de cujus (princípio da saisine). A
norma destina-se a evitar que a herança permaneça em estado de jacência até
sua distribuição aos herdeiros, como ocorria no direito português antigo, de
inspiração romana.
“Antes da partilha, porém, todo o patrimônio permanece em situação de
indivisibilidade, a que a lei atribui natureza de bem imóvel (artigo 79, II,
do CC/1916). Esse condomínio, por expressa disposição de lei, em juízo, é
representado pelo inventariante. Não há, portanto, como argumentar que a
universalidade consubstanciada no espólio, cuja representação é
expressamente atribuída ao inventariante pela lei, seja parte ilegítima para
a ação proposta pelo herdeiro”, concluiu Nancy Andrighi.
REsp 1080614
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