No último dia 28 foram completados 30 anos da
Lei 6.515, que permitiu o divórcio. O divórcio fez bem à sociedade
brasileira? Fez mal? A meu ver, nem bem, nem mal. Se a balança tiver de
pender para um dos lados, fez bem. Há quem atribua ao divórcio grande parte
do agravamento do conflito das gerações e o crescimento da participação dos
jovens na criminalidade, com o rompimento da presença de pais e filhos no
lar familiar, base da estabilidade social. Não há dado científico aceitável
nesse sentido. É melhor a tese de que o divórcio correspondeu à evolução
social, impulsionado por alterações pelas quais o mundo passou e às quais a
lei teve que se ajustar.
O exemplo do confronto das gerações tem, contudo, seu lado útil na discussão
do tema. Em primeiro lugar porque sempre existiu, mesmo quando o pai tinha
autoridade incontestada. A novidade da ampliação do hiato entre pais e
filhos, em tempos modernos, nasceu de fontes sociais numerosas e variáveis.
Está, desde antes de 1977, na velocidade das mudanças comportamentais. Está
na maioridade civil e no questionamento da maioridade penal, na distinção
diminuída entre a mulher e o homem no mercado de trabalho, a absorver toda a
família.
Se houvesse necessidade de ampliar casos de comportamentos alterados que não
dependeram da adesão do Brasil ao divórcio, lembraria os novos direitos pela
mulher casada (com o Estatuto de 1962), livrando-a de restrições
discriminatórias, que então existiam... Restrições excluídas de nossos
costumes e do ordenamento jurídico. O homem que matasse sua mulher, pela
simples suspeita de ser traído, raramente era condenado. O adultério deixou
de ser criminalizado. O mesmo se deu com a sedução: é inconcebível hoje que
uma jovem se entregue ao namorado pela promessa de casamento que este lhe
faça. As famílias, em que pais e mães têm filhos de mais de uma união, geram
conflitos que antes eram impensáveis, mas aos poucos promovem soluções
novas.
No campo da Justiça, a estatística fornece um dado da transformação. O
número dos divórcios vem crescendo sempre, mas em percentual insignificante
se comparado aos milhões de causas de outros tipos.
Foi até possível mudar a lei para permitir, em certas situações, o divórcio
por acordo, em escritura pública, chegando ao mesmo resultado sem
intervenção do juiz, o que sugere um viés interessante, inspirado em
pronunciamento recente do presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São
Paulo, desembargador Vallim Bellochi. Ele referiu o crescimento acelerado do
volume de litígios em juízo, sem julgamento previsível em prazo curto.
Acrescentou que os dirigentes do tribunal esperaram tempo demais para
impedir a acumulação, por meio das providências cabíveis. O avanço
quantitativo aumentou os atrasos, tornando problemática a solução.
O divórcio não contribuiu para o crescimento relativo desses índices e para
a insuficiência indicada por Bellochi. Passados 30 anos, a permissão de que
a sociedade conjugal fosse dissolvida por ato voluntário dos esposos não foi
a tragédia prevista pelos antidivorcistas. Não originou nem estimulou as
turbulências da sociedade de hoje, no Brasil e no mundo. A história é velha.
A roda da vida mudou muito. Trouxe o direito a reboque.
Jornal do Commércio - RJ |