TJMG - TRIBUNAL DE
JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS - Campina Verde
Processo nº 6359
AÇÃO MANDADO DE SEGURANÇA
Impetrantes: Etelvina Francisca Franco e Miraí Francisca Franco Barcelos
Impetrada: Silda Maria Macedo
MANDADO DE SEGURANÇA - Ilegitimidade passiva não reconhecida -
Averbação de Reserva Legal - Exigência Ofensiva ao direito de
propriedade constitucionalmente garantido - Falta de suporte na norma
legal - Writ concedido.
Vistos, etc.
As impetrantes, Etelvina Francisca Franco e Miraí Francisca Franco
Barcelos, interpuseram a presente Writ contra ato da Oficial Substituta,
Silva Maria Macedo, traduzindo que a oficial nega proceder registros da
homologação e da adjudicação extraídas do processo de inventário
do espólio de Venâncio José Franco.
A homologação e a adjudicação são de glebas de terras rurais.
Pós proceder o registro de duas glebas, a oficial nega levar a efeito
os demais atos de registros, alegando que só fará os outros registros
após a averbação da reserva legal, previsto pelo Provimento 92/2003
da Egrégia Corregedoria de Justiça do Estado de Minas Gerais.
Com a negativa, as impetrantes se sentem lesadas em seus direitos
líquidos e certos e exigíveis.
Citando julgados do Judiciário mineiro, sob o amparo da mais alta Corte
de Justiça do País, concluíram que não se pode exigir das
impetrantes a averbação da chamada reserva legal para fins de simples
transmissão de propriedade, porque não se trata de exploração ou
supressão de floresta ou da vegetação, mas do registro da
transmissão de propriedade que ocorreu por força de meação em
herança de marido e do pai, respetivamente.
Alegam que esta negação, a de não registrar as propriedades rurais,
é o mesmo que negar o direito à propriedade entabulada na
Constituição Federal.
Diante de tais fundamentos requereram a concessão da liminar para no
final a tornar em definitivo.
Documentos que acompanham a inicial são de fls. 8 a 43.
Nas informações à autoridade coatora, com muita habilidade, não nega
que fora exposto na inicial, e afirma que está a cumprir determinação
advinda do Órgão Corregedor, o provimento 92/2003 (da Corregedoria de
Justiça deste Estado).
A RMP manifestou em folhas 50 a 59, alegando em primeiro plano a
ilegitimidade passiva porque há de considerar que a autoridade coatora
é a pessoa que ordena a prática do ato atacado. E quem ordena ato em
desconformidade com o ordenamento jurídico positivo é quem detém
competência para corrigir a ilegalidade, porque a autoridade coatora
não confunde com a executora, aquele que age subordinadamente, o qual
não tem poder para corrigir o ato inquinado de ilegalidade.
Estriba o seu falar em julgado.
Quanto ao mérito, a zelosa RMP alega que a averbação da área de
reserva legal no registro de imóvel não é uma opção do
proprietário nem faculdade do registrador de imóveis, mas uma
imposição legal. - Cita o art. 2º da Lei 6.015/73 e art. 16 do
Código Florestal.
Ao final conclui pelo não conhecimento do mandamus.
É o relatório.
Passa-se ao decisorium litio.
Decidindo a preliminar de ilegitimidade passiva suscitada pela digna RMP.
Não assiste razão, a zelosa Promotora de Justiça que, por suas
razões, alega que, Silda Maria Macedo e a outra, é parte ilegítima
para figurar na polaridade passiva.
Entende-se por ato de autoridade toda a manifestação ou
omissão do poder público ou de seus delegados, no desempenho de suas
funções ou a pretexto de exercê-la. E há de ter idéia por autoridade
a pessoa física investido de poder de decisão dentro da esfera
de competência que lhe é atribuída pela norma legal.
A oficial do Cartório de Registro de Imóveis é a competente para
praticar atos administrativos decisórios, os quais, se ilegais ou
abusivos, são suscetíveis de impugnação por mandado de segurança
quando ferem direito líquido e certo.
O Tribunal Mineiro, por unanimidade, deram provimento ao mandado de segurança,
em grau de apelação, oriundo da Comarca de Ibiraci, em que o Mandado
de Segurança interpelava o Oficial do Cartório de Registro de Imóveis.
Aliás, tendo como o mesmo tema a matéria que nestes autos é debatida.
Desta feita, entendo que a autoridade coatora, neste caso é a Oficial
Substituta, vez que é ela quem pratica o ato, ora atacado pela presente
Writ, assim supra definido. Logo, é a Oficial Substituta parte
legítima para responder o mandamus na polaridade passiva (tal decisão
foi proferida pela Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do
Estado de Minas Gerais).
Desta feita não conheço a preliminar.
Quanto o mérito.
Os impetrantes adquiriram as propriedades rurais por sucessão
hereditária, conforme constam dos documentos acostados nos outros, e
foram registrá-las, quando a zelosa oficial do cartório local negou o
pedido.
A recusa foi baseada no Provimento de nº 92/2003 da Corregedoria de
Justiça de Minas Gerais e no artigo 16 do do Código Florestal.
Tais disposições legais condicionam o registro à averbação da
reserva legal na matrícula do imóvel.
A reserva florestal será instituída como forma de preservar as
florestas e matas nativas existentes, evitando-se o desmatamento e a degradação
do florístico brasileiro.
O Código Florestal (art. 16) estabelece que devem ser excluídos da
exploração econômica 20% de todas as florestas de domínio privado,
ressalvadas as de preservação permanente e com a exceção àquelas feitas
ao regime de utilização limitada.
Não se pode dar uma interpretação extensiva a ponto de abranger as
áreas de cultivos, já sem a cobertura florístico original, obrigando
que o proprietário de imóvel rural com estas características reserve
20% da área para reinserção de vegetação nativa, tal atitude, se
assim o exigir, é a ofensiva do direito de propriedade
constitucionalmente garantido. Tal ato não se encontra suporte na norma
legal.
O Código Florestal estabelece, em seu artigo 16, que devem ser excluídos
da exploração econômica 20% de todas "as florestas de domínio
privado", exceção feita àquelas "sujeitas ao regime de
utilização limitada" e "ressalvadas as de preservação
permanente", estas últimas definidas nos artigos 2º e 3º do mesmo
diploma (REsp. nº 162547 - Relator Ministro Franciulli Neto. DJU
02.04.2001 - p.00280).
"Entender que o legislador deu à expressão sentido mais amplo,
abrangendo áreas de cultivo, já sem a cobertura florístico original,
obrigando que o proprietário de imóvel rural com estas
características reserve 20% da área para reinserção da vegetação nativa,
revela-se ofensivo ao direito de propriedade constitucionalmente garantido,
não encontrando suporte na norma legal".
O Provimento nº 92/2003 da Corregedoria de Justiça regulamenta a averbação
da área de reserva legal de forma genérica, nos termos do parágrafo
8º do artigo 16 do Código Florestal, não se aplicando ao caso em exame
pelos motivos já aduzidos acima. Ele dispõe:
Art. 1º - A averbação da área de reserva legal, no registro de
imóveis obedecerá às disposições da Lei Federal nº 4.771, de
15/09/65, com as alterações da Medida Provisória nº 1.956-50, de
26/05/2000, e das publicações subseqüentes, e da Lei Federal nº
6.015, de 31/12/73, com as modificações da legislação posterior.
Art. 2º - "A área de reserva legal dever ser averbada à margem
da inscrição de matrícula do imóvel, no registro de imóveis
competente, sendo vedada a alteração de sua destinação, nos casos de
transmissão, a qualquer título, de desmembramento ou retificação da
área, com as exceções previstas neste Código" (art. 16, § 8º,
do Código Florestal).
Art. 3º - Os emolumentos pela averbação da reserva legal no registro
de imóveis devem ser cobrados em consonância com disposto na Lei
Estadual nº 12.727, de 30/12/97, com as alterações e acréscimos da
Lei nº 13.438, de 30/12/99, Anexo I, Tabela 4, nº 1, alínea e, e Nota
V.
§ 1º - A "averbação da reserva legal de pequena propriedade ou
posse rural familiar é gratuita", nos termos do artigo 16, § 9º,
da Lei Federal nº 4.771, de 15/09/65.
Art. 4º - Este Provimento entra em vigor na data de sua publicação,
ficando revogados o Provimento nº 23, de 24/10/97, e o Provimento nº
30, de 02/03/98.
Averbar área de reserva legal ditada pelo § 8º do art. 16 do Código
Florestal pressuporia exploração ou supressão de alguma reserva
florestal e não poderia ser alterada por ocasião de transmissão, desmembramento
ou retificação.
Não sendo o caso de exploração ou supressão de floresta ou forma de
vegetação nativa, não há precedente para averbação das reservas.
Posto isto e considerando que mais dos autos constam, conheço do writ e
concedo a segurança para que o Oficial do Cartório de Registro de Imóveis
da Comarca de Campina Verde abstenha-se de exigir dos impetrantes a prévia
adjudicação ou averbação da área, se for o caso,de reserva legal como
requisito para que se proceda aos registros na forma solicitada no
presente mandamus.
Oficie a Autoridade coatora, que por sinal sabiamente desempenha seu ofício,
para que providencie os registros solicitados no mandamus.
Após o trânsito em julgado para as partes subam os Autos para reexame
necessário.
Publique-se. Registre-se. Intime(em)-se.
Campina Verde, 13 de maio de 2003.
Eleusa Maria Gomes
Juíza de Direito
TJ-1193-2
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