Estado do RS e Tabelião condenados a indenizar por danos morais

Aproximadamente 10 anos depois de ter sido indevidamente incluído como sócio da empresa “Vulcatenis”, tendo contra si mais de 50 ações de cobrança que somavam cerca de R$ 3 milhões, o funcionário público da Prefeitura Municipal de São Leopoldo, André Luiz Bier, obteve reconhecimento pelos danos morais sofridos ao longo desse período. A 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça, em apelação julgada na tarde de hoje (12/5) condenou de forma unânime o Estado do Rio Grande do Sul e o Tabelião Lauro Assis Machado Barreto, do 2° Tabelionato de Notas de Novo Hamburgo, a indenizarem solidariamente o autor da ação em 300 salários mínimos nacionais. “A situação faria inveja a Kafka, seguramente”, lastimou o relator do recurso no TJ, Desembargador Adão Sérgio do Nascimento Cassiano.

A apelação foi interposta contra sentença da 15ª Vara Cível da Capital, que julgou improcedente a ação em que Bier postulava reparos por danos sofridos desde que teve seus documentos furtados, em 1992, o que ensejou reconhecimento de firma, em procuração falsificada, junto ao Tabelionato. De posse desse documento em nome de Bier, foi procedida alteração do quadro societário da empresa “Vulcatenis” na Junta Comercial do Estado. A falsidade da assinatura foi comprovada por perícia realizada pela Polícia Federal.

Em 1994, Bier teve ciência de edital em que figurava em ação trabalhista. No mesmo ano, foi impossibilitado de registrar sociedade, por haver débitos em seu nome. Em 1997, diante das tentativas infrutíferas de comprovar a fraude, registrou notícia-crime na Polícia Civil, que não foi investigada pela perda da ocorrência. Também realizou o registro junto à Polícia Federal, que efetuou perícia comprovando a falsidade da assinatura utilizada na procuração apresentada à Junta Comercial. Esta, por sua vez, extraviou documentos que haviam sido protocolados no órgão.

“Houve erro grosseiro do agente que reconheceu a firma por autenticidade”, acentuou o Desembargador Adão Cassiano, considerando ter ficado comprovado o nexo causal com os danos sofridos, uma vez que a procuração possibilitou a alteração no quadro societário da firma. “Cabia ao Tabelião, e não ao autor, provar que agiu com toda a diligência, trazendo aos autos, no mínimo, a referida carteira de identidade apresentada no momento do registro da firma.”

O magistrado assinalou a imprudência e negligência da Polícia Civil, que tinha a obrigação de manter em banco de dados a notícia-crime e proceder à investigação. A conduta da Junta Comercial também foi censurada pois, mesmo reconhecendo ser a procuração inábil, com poderes limitados, procedeu ao arquivamento da alteração societária, além de extraviar posteriormente documentos. “O Estado é co-responsável pelos atos de seus agentes delegados”, sintetizou.

Destacou o abalo emocional e o sentimento de impotência experimentados por anos a fio pelo autor, modesto funcionário público municipal, submetido a traumas dificilmente superáveis.

Foi determinada também a anulação do ato de arquivamento, devendo o Estado desfazer o procedimento que incluiu André Luiz Bier como sócio na empresa “Vulcatenis”. Os danos materiais pleiteados não foram concedidos, pois não devidamente quantificados e demonstrados nos autos.

Acompanharam o voto os Desembargadores Luís Augusto Coelho Braga e Fabianne Breton Baisch.

Proc. 70006761506 (Adriana Arend)


Fonte: Site do Tribunal do Justiça do Estado do Rio Grande do Sul - 13/05/2004