A 11ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) reformou
sentença da comarca de Juiz de Fora e decidiu, por maioria de votos, tornar
sem efeitos os contratos de empréstimos e seguro assinados por um menor.
Segundo entendimento dos desembargadores Duarte de Paula e Fernando Caldeira
Brant, o Código Civil estabelece que “a validade do negócio jurídico requer
dentre seus requisitos o agente capaz. Assim, se exige daquele que pretende
celebrar um contrato, a necessária aptidão para praticar os atos da vida
civil”.
O caso chegou ao conhecimento da Justiça porque o menor, representado por
sua mãe, moveu ação para questionar as cláusulas e condições do contrato.
A.M.S. tinha sete anos quando sua mãe procurou uma seguradora para contratar
um empréstimo de R$ 5 mil, em novembro de 2005.
Condições contratuais
O contrato foi feito em nome do menor, mas com a data de nascimento dele
alterada para constar que ele tinha 27 anos. As prestações do empréstimo e
mais R$ 100 de seguro passaram a ser descontadas da pensão do garoto. Um ano
depois, a mãe do menino procurou a seguradora para renovar o empréstimo e
recebeu mais R$ 1080, mas disse não ter sido informada de qual seria o valor
da nova parcela.
Com a renovação, a prestação subiu de R$ 325,27 para R$ 436,75. Inconformada
com os descontos na pensão, a mãe do garoto acionou a Justiça alegando que
havia negociado o pagamento em carnê e não consignado em folha. Ela também
questionou a cobrança de R$ 100 de seguro, acusando a empresa de venda
casada, e pediu que o valor total descontado mensalmente da pensão não
ultrapassasse 30% da renda líquida, além de indenização por danos morais.
A empresa se defendeu alegando que o desconto em folha é a única forma de
pagamento prevista no contrato de empréstimo. Por ser uma seguradora, ela
argumenta que só está autorizada a “conceder auxílio financeiro aos seus
segurados e que a cliente sempre esteve ciente de tal condição, bem com de
todos os contratos firmados”.
A decisão de 1ª Instância determinou que a seguradora limitasse os descontos
em 30% da pensão líquida e indeferiu os pedidos de ressarcimento da quantia
paga pelo seguro e de indenização por danos morais.
A seguradora recorreu ao TJMG pedindo que o limite de desconto fosse fixado
em 70% como autorizado por lei para a fonte pagadora da pensão.
O garoto, representado por sua mãe, também recorreu alegando que nem ele nem
sua mãe assinaram os contratos apresentados como prova pela seguradora e que
a empresa ainda teria falsificado a sua identidade, alterando a data de
nascimento para conseguir liberar o crédito.
Decisão
O desembargador Duarte de Paula votou pela nulidade absoluta do contrato.
Para Duarte de Paula, “não se pode considerar ratificado o ato praticado
pelo menor, pois em nenhum dos contratos consta a declaração da mãe neste
sentido”. O desembargador considerou que as falsificações são grosseiras, “é
tão absurda a falsificação dos dados que, da simples visualização da
carteira de identidade apresentada nos autos, se constata uma fotografia e
uma digital de criança, com data de nascimento de um adulto”. Ele ainda
acrescentou que o Código Civil não dá poder aos pais para contrair, em nome
de seus filhos, obrigações que ultrapassem a simples administração de seu
patrimônio.
O desembargador Fernando Caldeira Brant acompanhou o voto de Duarte de
Paula.
Já o desembargador Marcelo Rodrigues considerou que o reconhecimento
expresso da mãe do garoto da sua iniciativa em tomar o empréstimo valida o
contrato. Porém seu voto foi vencido.
Com a anulação do contrato, o autor deverá devolver à seguradora os valores
que recebeu pelo empréstimo, devidamente corrigidos desde o desembolso,
devendo, em contrapartida, a seguradora restituir ao autor os valores,
igualmente atualizados desde a data de cada desconto, que foram por ela
cobrados a título de seguro e de pagamento dos empréstimos.
Foi determinado também o encaminhamento de cópia do processo à Promotoria de
Justiça Criminal da Comarca de Juiz de Fora.
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