por Roberto Padua Cosini
A rigor do que estabelece a legislação fiscal, considera-se imóvel rural,
para efeito de determinação da base de cálculo do Imposto Territorial Rural
(ITR), a área contínua formada de uma ou mais parcelas de terras, localizada
na zona rural do município, ainda que, em relação a alguma parte do imóvel,
o sujeito passivo detenha apenas a posse. É o que se extrai da análise
conjunta dos seguintes dispositivos legais: Lei 9.393/96 e Decreto 4.382/02.
Por tratar-se de tributo sujeito ao lançamento por homologação, o ITR é
apurado e pago pelo próprio contribuinte, independentemente de qualquer
procedimento prévio da administração tributária, sujeitando-se, como tal, à
posterior homologação pelo fisco (artigo 10, da Lei 9.393/96 cumulado com o
artigo 8º do Decreto 4.382/02).
Por esse motivo, a legislação fiscal não só estabelece a forma pela qual o
contribuinte apura a área de seu imóvel rural que deve ser submetida à
tributação, como também exclui do campo de incidência do imposto as áreas
que, dada a qualificação legal, não devem ser tributadas (Artigo 10,
parágrafo 1º, inciso II, alínea “a” da Lei 9.393/96)
Essa última hipótese, que se refere à não-incidência do imposto sobre
determinadas áreas, contempla as áreas de preservação permanente e de
reserva legal previstas pela Lei 4.771, de 15 de setembro de 1965 (Código
Florestal).
O que se tem atualmente é que, independentemente de qualquer ato do poder
público, as restrições criadas pelo Código Florestal para um imóvel rural
atinentes às áreas de reserva legal e de preservação permanente, são de
eficácia geral, plena e imediata e, salvo as exceções legais, deve o
proprietário da área abster-se de utilizá-la, sendo certo que, para a
análise que deve ser feita para o cálculo do ITR, esses áreas podem ser
excluídas.
O ADA foi criado pela Portaria Ibama 162/97, cujas informações nele contidas
servem para instruir o Ibama, dentre outras, com informações referentes às
áreas de preservação permanente e de reserva legal situadas no imóvel rural.
E apesar de sua entrega ser importante para fins de apuração do ITR, a falta
do ADA não deve ser confundida com sua entrega atrasada.
Em vista do atraso na entrega do ADA, mesmo diante de um procedimento fiscal
— no qual se solicita farta documentação técnica a respeito das áreas de
não-incidência declaradas pelo proprietário — instaurado para apurar se o
valor de imposto pago (ITR) foi correto diante das informações prestadas na
Declaração do Imposto Territorial Rural (DITR), vêm sendo constantes as
autuações que agentes da Receita Federal do Brasil vêm promovendo em vista
de não reconhecerem essas áreas de não incidência, sem sequer produzir um
documento técnico que pudesse contrariar os laudos técnicos elaborados por
engenheiros agrônomos apresentados nos procedimentos fiscalizatórios.
Nesse sentido, a despeito de ter procedido corretamente à declaração e ao
recolhimento do ITR apurado, considerando verdadeiramente as áreas de
preservação permanente e de reserva legal, o proprietário vem sendo
surpreendido com a lavratura de auto de infração e notificação de lançamento
de imposto a pagar sobre as áreas de não incidência, e pior, sujeitando o
autuado ao pagamento de multa e juros moratórios.
Com relação a esse aspecto, que se refere à exclusão — pelo próprio
contribuinte — de áreas que não estão sujeitas à tributação pelo ITR, é
importante que se faça o seguinte destaque: a Medida Provisória 1.956-53
trouxe, no ano de 2000, louvável disposição em favor dos contribuintes
rurais, assegurando-os contra os desmedidos abusos então cometidos pelo
fisco.
Com a redação atribuída pela Medida Provisória 2.166-66/01, o parágrafo 7º
do artigo 10 da Lei 9.393/96, introduzido no ordenamento pátrio em 2000 (MP
1.956-53/00), assim determina:
“Art. 10. (...).
§ 7º. A declaração para fim de isenção do ITR relativa às áreas de que
tratam as alíneas ‘a’ e ‘d’ do inciso II, § 1º, deste artigo, não está
sujeita à prévia comprovação por parte do declarante, ficando o mesmo
responsável pelo pagamento do imposto correspondente, com juros e multa
previstos nesta Lei, caso fique comprovado que a sua declaração não é
verdadeira, sem prejuízo de outras sanções aplicáveis.”
Nota-se, pois, que a declaração do contribuinte, no sentido de que existe,
em seu imóvel rural, alguma daquelas áreas legalmente excluídas do campo de
incidência do ITR, como é o caso das áreas de preservação permanente e
reserva legal, ou sob regime de servidão florestal ou ambiental, NÃO depende
de prévia comprovação.
Nesse sentido, existem diversas decisões de nossos tribunais, como por
exemplo: STJ, 1ª Turma, Rel. Min. Denise Arruda, REsp 812.104/AL; e 2ª
Turma. Rel. Min. Eliana Calmon, REsp 665.123/PR; e TRF da 3ª Região, 3ª
Turma, AMS nº 2003.61.02.014652-0/SP, Rel. Juiz Silvio Gemaque.
Observa-se, pois, que o Poder Judiciário já reconheceu que o ADA não é
imprescindível para que o contribuinte exclua, da base de cálculo do ITR, as
áreas de preservação permanente e de reserva legal.
Aliado ao fato de a exigência do ADA para redução da base de cálculo do ITR
ser indevida, a sua não-apresentação, ou ainda, a sua apresentação fora do
prazo estabelecido pelas normas infra-legais, não poderia ensejar a
presunção de que as áreas excluídas da base de cálculo do ITR não existam.
Noutras palavras, a apresentação intempestiva de um documento não poderia
gerar a presunção absoluta de que as áreas caracterizadas como reserva legal
e de preservação permanente não existem, sobretudo porque, se a própria lei
determina que o contribuinte NÃO está obrigado a comprovar, previamente, que
seu imóvel possui áreas amparadas pela isenção do ITR, não pode um
instrumento infra-legal fazê-lo, como comumente vem sendo alegado pela RFB
ao sustentar seus atos com base em decreto e portarias.
Por essas razões, sobretudo porque comprovada a efetiva existência e
conservação de áreas que deveriam ser excluídas da base de cálculo do ITR
(aquelas que, por lei, não integram o conceito de área tributável da
propriedade rural), a autuação fiscal não merece subsistir.
Por fim, a RFB vem esquecendo-se de analisar o estimulo à proteção ambiental
a determinadas áreas que a regra de não incidência do ITR procurou
estabelecer, já que, se vem autuando proprietários preocupados em preservar
áreas de interesse ambiental, acaba por desestimulá-los, embora deva ficar
bastante claro que o respeito a essas áreas deve ser absoluto,
independentemente de isenção tributária, em vista do que está previsto na
legislação ambiental, principalmente quantos às sanções criminais e
administrativas nos caso de desrespeito a essas áreas.
Sobre o autor
Roberto Padua Cosini: é advogado da Miguel Neto Advogados Associados
|