Código civil estabelece
possibilidade de que juiz nomeie curador para gerir patrimônio de quem não
tem condições de fazê-lo
Isabella Souto
CÓDIGO CIVIL
M., de 85 anos, sofre de Alzheimer há 12 anos. Incapacitada pela doença para
tomar qualquer decisão sobre sua vida e patrimônio, foi alvo de uma ação de
interdição, que resultou na nomeação da filha mais nova como curadora. A
decisão judicial deu à filha autonomia para a administração de todos os seus
bens e atos da vida civil. A história é verídica, semelhante a muitos casos
que chegam todos os dias ao Poder Judiciário. Trata-se da interdição de
maior incapaz, com conseqüente nomeação de um curador – que pode ser um
parente, conhecido e, em casos raros, o Ministério Público.
O instituto da curatela, presente no artigo 1.775 do Código Civil, não é
novo. É originado do direito romano e tem como pressupostos a incapacidade
de um maior e a decisão judicial em um processo de interdição. Sua principal
finalidade é proteger os interesses e patrimônio daquele que se tornou
incapaz, evitando a sua dilapidação, além da preservação de negócios
realizados em relação a terceiros. Na maioria das vezes, a curatela é
decretada para idosos ou pessoas com problemas neurológicos, como o acidente
vascular cerebral (AVC), ou infarto do miocárdio e coma.
Uma vez ajuizada a ação de interdição, o provável incapaz é ouvido para sua
defesa. Atualmente, são feitas inspeções judiciais até mesmo com o
deslocamento do juiz até os hospitais, quando há impossibilidade de
locomoção do pretenso interdito. A partir de um laudo pericial médico, o
juiz vai decidir se cabe ou não a interdição e em que grau, que pode ser
parcial ou integral. “Há casos em que o incapaz não terá discernimento para
gerenciar uma conta em banco, mas pode, por exemplo, dirigir um carro”,
exemplifica o advogado especializado em direito de família Luiz Kignel.
A ação poderá ser ajuizada pelos pais, filhos ou parentes mais próximos. Na
ausência de familiares, pelo Ministério Público. Decretada a curatela, o
juiz definirá se o autor da ação tem condições para ser ou não o curador. A
partir dessa definição, repassará ao mesmo suas obrigações em relação ao
interdito. Uma delas é prestar contas sobre todos os gastos e bens, na forma
e periodicidade definidas pelo juiz.
BALANÇO Descumpridas as regras, o juiz poderá destituir o curador e
nomear outro, entre os parentes mais próximos ou um terceiro. A família ou o
MP poderá mover ação se verificar que houve desvio de dinheiro. E não são
raros os casos em que há desavenças familiares com os curadores. Segundo o
advogado Luiz Kignel, os interessados têm o direito de acompanhar de perto
todo o balanço financeiro.
No caso de negativa do curador, poderão documentar essa situação e ajuizar
uma ação de cobrança de prestação de contas com pedido de destituição do
curador. “Essa ação é necessária porque o curador é aquele que vai defender
os interesses do incapaz. Então, ele tem que ser alguém em quem se tenha
confiança”, diz o advogado. O curador também poderá ser acusado de omissão,
caso deixe de tomar atitudes que atendam ao interesse do interdito.
O Código Civil de 2002 trouxe algumas inovações em relação à curatela. Entre
elas, a inclusão dos ébrios habituais, viciados em tóxicos e aqueles que não
puderem exprimir sua vontade por causa duradoura. Também foi abolida a
expressão, adotada no Código de 1916, loucos de todo gênero, substituída por
portadores de enfermidade ou deficiência mental. Houve ainda a inclusão da
interdição por prodigalidade, quando alguém corre o risco de tornar-se
miserável por não ter condições de gerir seus próprios bens.
O que é curatela
Modalidade de proteção ao maior incapaz, que não tiver o discernimento para
os atos da vida civil; aos que, por outra causa duradoura, não puderem
exprimir sua vontade; aos deficientes mentais, aos ébrios habituais e aos
viciados em tóxicos; aos excepcionais sem completo desenvolvimento mental e
aos pródigos. O curador será aquele que receber a obrigação de defender e
administrar os bens de outra pessoa ou de responder em seu nome pelos atos
da vida civil.