Praça de pagamento
por George Washington T. Marcelino
A praça de pagamento da duplicata é requisito da regular emissão e validade
deste título de crédito. Esta norma exige a correta observação dos
princípios legais, doutrinários e jurisprudenciais, sob pena de
inexigibilidade da cártula. E não poderia ser diferente, visto que a
duplicata é título formal, vinculado a todo um sistema legal.
Hoje, com a globalização, podemos entender ainda que a definição da praça de
pagamento fosse à primeira vista parecer uma exigência não muito importante.
Contudo, devemos reconhecer efetivamente sua relevância, pois a praça de
pagamento definirá de forma imutável o local do protesto da cambial, o foro
competente para a execução e, via de conseqüência, para as demais demandas
relacionadas a este título de crédito, entre outros aspectos.
A lei das duplicatas não impõe que a praça de pagamento seja o domicílio do
devedor. Assim, vemos a disposição do artigo 17 da Lei 5.474, de 18 de julho
de 1968: “O foro competente para a cobrança judicial da duplicata ou
triplicata é o da praça de pagamento constante do título, ou outra de
domicílio do comprador, e, no caso de ação regressiva, a dos sacadores, dos
endossantes e respectivos avalistas”.
Uma análise ainda que perfunctória desse dispositivo legal deixa claro que a
regra — no que tange a praça de pagamento dos títulos — será o domicílio do
comprador, que figura como o devedor da duplicata.
De outra parte, a regra do artigo 327 do atual Código Civil não diverge do
acima colocado: “Efetuar-se-á o pagamento no domicílio do devedor, salvo se
as partes convencionarem diversamente, ou se o contrário resulta de lei, da
natureza da obrigação ou das circunstâncias”.
Assim, por conseqüência, temos que as disposições legais pertinentes à
matéria sob estudo optam no estabelecer a regra geral no sentido de que os
títulos devam ser pagos no domicílio do sacado-devedor.
A doutrina também entende que a dívida representada pelas duplicatas é “querable”,
ou seja, deverá ser paga no domicílio do devedor ou no local indicado pelo
mesmo.
Entretanto, não podemos deixar de lado que o próprio texto legal admite
exceção, sendo possível que as partes optem a convencionar outra praça de
pagamento. Ora o artigo 887 do novo Código Civil conceitua os títulos de
crédito como sendo documentos autônomos, liberais e independentes que
traduzem relações crediticias entre pessoas, inicialmente determinadas,
produzindo efeitos jurídicos quando estiverem precedidos os requisitos
previstos em lei.
Maria Helena Diniz (Curso de Direito Civil Brasileiro, São Paulo, Saraiva,
2002, 2º v., pág. 223), a respeito do local de pagamento preleciona: “O
lugar de pagamento é o local do cumprimento da obrigação em regra estipulado
no título constitutivo do negócio jurídico, ante o princípio de liberdade de
eleição”.
Para o pagamento poderá, então, para este título ser eleito o domicílio do
próprio credor, o local da entrega das mercadorias, o local da prestação de
serviço, dentre outros.
Porém, é mister, que esta convenção seja expressa e indiscutível: estar
prevista por escrito, no contrato que gerou as duplicatas, ou no pedido que
antecedeu o saque dos títulos, ou na própria nota fiscal.
O Tribunal de Justiça de Santa Catarina, por exemplo, adota a regra do local
indicado para pagamento. “O protesto de duplicatas deve ser tirado no lugar
do pagamento, que é o domicílio do vendedor se outro não foi fixado. A
intimação deve ser procedida no endereço constante do título ou declinado
pelo apresentante. Sendo a duvidosa a intimação da devedora, o protesto é
inválido, tornando inexigível o título” (TJSC, Apelação Cível 97.005186-7,
de Itajaí. relator Desembargador Pedro Manoel Abreu).
Diante dos fatos expostos, entendemos que, apenas a convenção expressa entre
as partes, demonstrando a concordância inequívoca do devedor sacado (fato
inafastável face a regra do artigo 327 do Código Civil), autorizará que a
praça de pagamento seja diversa do local onde o devedor exerce suas
atividades. Para tanto, esta disposição deve constar do pedido ou do
contrato, sendo mencionada na nota fiscal.
Não existindo esta estipulação com muita clareza e aceitação do devedor, com
sua assinatura no contrato, poderá esta com facilidade sustentar a nulidade
do protesto e a incompetência do juízo da sede do credor.
É manifesto que para o credor, face às regras de globalização e em nosso
país o gigantismo geográfico, seja mais conveniente que o local de pagamento
seja o de sua sede; entretanto, essa estipulação terá sua validade sujeita
ou à sua existência em contrato e pedido, ou ao aceite do devedor na
cártula, que equivale à plena anuência sua.
Estes pressupostos, pois, deverão estar presentes na fiscalização pelo
cartório de protesto quando da apresentação do título, quanto no próprio e
direto ajuizamento.
São regras que a prática comercial esquece. Contudo, pela sua
inexorabilidade, sua prática não ocasionará prejuízos e nem tornará irrita a
cártula. |