Proposta que será enviada ao Congresso dá a outras instituições, como
o Exército, poder para emitir certidões
BRASÍLIA
O governo federal decidiu comprar uma briga com os cartórios e vai mandar
para o Congresso proposta de emenda à Constituição que dá a outros agentes e
instituições o poder de emitir certidões de nascimento. O ministro da
Secretaria de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, não descarta, por exemplo,
recorrer ao Exército – que tem unidades espalhadas em regiões isoladas do
país – para assumir essa tarefa nessas localidades.
Um grupo criado no governo, com participação de outros setores, como o
Conselho Nacional de Justiça (CNJ), prepara o texto da proposta. O grupo
discute ainda que essa missão possa ser atribuída também a servidores
públicos que vivem e trabalham em regiões onde há ausência de cartório.
Em 2006, 406 mil crianças ficaram sem registro
A falta de registro atinge, todo ano, uma parcela da população que não tem
acesso aos cartórios em regiões longínquas. Dados do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE) revelam que, em 2006, 12,7% dos nascidos –
cerca de 406 mil bebês – não foram registrados. Não há sequer um cartório de
registro civil em 422 cidades do país. O problema atinge principalmente as
regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, onde os pais, quando informados da
necessidade de registrar seus filhos, enfrentam dificuldades de acesso à
sede do cartório.
Na Amazônia, às vezes é necessário enfrentar dias de barco e de caminhada
até chegar ao local do registro.
O registro civil é a identificação da pessoa e condição para exercício de
sua cidadania e, por essa razão, o assunto está sob o comando da Secretaria
dos Direitos Humanos. Mas qualquer iniciativa que exclua os cartórios dessa
função enfrenta resistência de entidades como Associação Nacional dos
Notários e Registradores do Brasil (Anoreg), que não aceita estranhos
fazendo seu papel.
O presidente da Anoreg, Rogério Bacelar, afirmou que somente pessoas com
formação jurídica, caso de advogados, podem atuar como cartorários. Ele é
contra entregar a missão a militares ou servidores públicos que desconhecem
o trabalho.
- Não é uma função para qualquer um. Senão, um fugitivo da polícia vai para
uma cidade dessas e faz novo registro civil e nova identidade e ninguém mais
nunca acha ele. Sem falar no risco de exploração eleitoral desse serviço –
disse Rogério Bacelar.
Donos de cartórios dizem que têm prejuízo
Os donos de cartório de registro civil argumentam que não têm como atender a
toda a população e apontam a gratuidade do registro e da emissão de
documentos como certidão de nascimento e também óbito como o principal
entrave. Rogério Bacelar afirma que, por esse motivo, não interessa aos
proprietários abrirem cartórios em localidades onde não há demanda, pois
eles acabam tendo prejuízo.
- Quanto à gratuidade criada, em 97, não se estipulou como esse serviço
seria pago. Se gasta papel, livro de registro, luz, aluguel e não se recebe
nada. É quase um trabalho escravo – disse.
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