Comprar um carro a prazo pode parecer fácil, mas o consumidor deve ficar
atento, pois em alguns casos o financiamento de veículos pode lhe custar
muito caro. O número de compras de veículos financiados tem crescido
substantivamente nos últimos anos, principalmente pela facilidade do crédito
no país, no entanto, problemas com as financeiras também se tornam cada dia
mais comuns e a obtenção do crédito fica muitas vezes mais onerosa para o
consumidor do que realmente deveria ser. Além de juros abusivos, taxas
ilegais, nomeadas como serviços de terceiros, são cobradas nos contratos de
financiamento, que não são claros em especificá-las. Isso tudo apesar de
essa prática ser proibida pelo Código de Defesa do Consumidor, que completou
20 anos no sábado.
De acordo com a advogada e especialista em direito do consumidor Míriam
Parreiras de Souza, as taxas ilegais de cobranças mais comuns são a taxa de
retorno, de abertura de crédito, de liquidação antecipada e de emissão de
boleto. “A ilegalidade dessas tarifas é reconhecida pelo Banco Central e
pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), com exceção para a taxa de retorno,
que ainda carece de uma manifestação legal e é, talvez, a mais abusiva”,
ressalta. Além da cobrança irregular, Míriam de Souza alerta para as
empresas que não cumprem o dever legal de oferecer informações claras e
precisas nos contratos, ferindo o Código de Defesa do Consumidor.
A taxa de retorno, a menos conhecida pelos compradores dos veículos, é uma
comissão que o banco repassa para os vendedores de carros por terem feito a
venda e que aparece no contrato das financeiras, na maioria das vezes como
serviços de terceiros. Segundo Míriam, o custo da taxa está embutido no
valor total do financiamento. “Pode variar de 1% a 10% do valor total
financiado. As revendedoras dos veículos não têm critério para aplicá-la,
definindo a taxa de forma aleatória, de acordo com o valor das prestações do
financiamento que o consumidor se dispõe a pagar”, explica. A advogada
lembra que a taxa é ilegal porque as revendedoras estão aferindo lucro sob o
financiamento e ainda de forma obscura nos contratos.
Outra taxa abusiva é a de abertura de crédito (TAC), que é proibida por
regulamentação do Conselho Monetário Nacional, desde 2008. De acordo com
Míriam de Souza, a TAC é paga pelo consumidor em virtude da concessão do
crédito pela instituição financeira. “Os bancos continuam cobrando com a
denominação de taxa de efetivação de cadastro (TEC). Ela costuma variar de
R$ 50 a R$ 120”, alerta. Segundo a economista do Instituto Brasileiro de
Defesa do Consumidor (Idec), Ione Amorim, a TAC pode ser cobrada se o
consumidor for adquirir crédito em uma financeira ou em um banco com o qual
não tem vínculo prévio. “A taxa de abertura de crédito não pode ser cobrada
em caso de o consumidor obter o empréstimo em uma instituição na qual já tem
algum vínculo”, revela.
Já a taxa de emissão de boletos consiste na cobrança feita pelas financeiras
por cada boleto bancário emitido ao consumidor e, de acordo com a advogada
Míriam de Souza, sua ilegalidade também já foi reconhecida pelo CMN, em
2009. “No entanto, ela ainda aparece em alguns casos de financiamento de
veículos e varia normalmente de R$ 3 a R$ 5 por boleto.” Outra taxa ilegal
que ainda vem sendo cobrada é a de liquidação antecipada, que custa em torno
de R$ 500. “É cobrada pelas financeiras em razão da quitação do débito antes
do prazo previsto, quando o cliente paga de uma só vez. A taxa é abusiva,
pois configura quebra de contrato e faz com que a financeira não receba os
juros até então contratados. Além disso, a quitação antecipada é garantida
pelo Código de Defesa do Consumidor, que torna ilegítima a cobrança de
qualquer tarifa no ato da quitação antecipada da dívida.”
Saída é ler contratos com muita atenção
A melhor estratégia para não ser penalizado com as taxas abusivas no momento
de adquirir um veículo está na leitura detalhada do contrato do
financiamento antes de assiná-lo. A advogada Míriam de Souza orienta que,
caso identifique a existência de alguma dessas taxas, ou até mais de uma no
contrato, o consumidor solicite que elas sejam retiradas ou procure outra
financeira. “O comprador que já efetuou ou ainda paga alguma dessas taxas
deve acionar o Judiciário para receber a devolução em dobro dos valores
pagos indevidamente e cancelar as cobranças futuras.”
A professor Elaine Aparecida de Souza financiou um veículo de R$ 21 mil e em
seu contrato constava a cobrança da taxa de retorno, de abertura de crédito
e de emissão de boletos. “Quando percebi que as prestações mensais estavam
bem acima do combinado, reli o contrato e encontrei a cobrança dessas taxas,
que não haviam sido informadas pela financeira. Entrei com uma ação judicial
para reaver os valores e espero recebê-los de volta em dobro”, reclama.
A servidora pública Fabiana Daniele Simões da Paz também foi vítima da
cobrança das taxas ilegais. “Além do financiamento do meu veículo, que
custava R$ 22 mil, foi cobrada taxa de retorno de quase R$ 2,5 mil, taxa de
emissão de boleto de R$ 3,99 e, taxa de abertura de crédito de R$ 500. Era
difícil reconhecê-las no contrato, pois elas eram identificadas como
serviços de terceiros. Entrei com uma ação judicial para buscar meus
direitos e em próximos financiamentos vou ser mais cuidadosa e pedir a
especificação de serviços no contrato previamente.” |