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    Propriedades rurais devem ser classificadas como pequenas, médias ou 
    grandes, na desapropriação para reforma agrária, a partir do tamanho de sua 
    área aproveitável, e não de toda a extensão do imóvel. O entendimento é da 
    Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que indeferiu pedido do 
    Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) e manteve 
    acórdão do Tribunal Federal Regional da 1ª Região (TRF1). A decisão, no 
    entender dos ministros, pode inibir abusos no processo de desapropriação e 
    preservar áreas de importância ambiental. 
 O caso refere-se à desapropriação da “Fazenda das Pedras", situada no 
    município de Arenópolis (GO). Em outubro de 2005, o imóvel foi declarado de 
    interesse social para fins de reforma agrária. Seu proprietário, no entanto, 
    protestou judicialmente contra a medida. Alegou que pequenas e médias 
    propriedades rurais são imunes à desapropriação pelo Incra, tal como define 
    a Constituição, e que, realizando os cálculos adequados, sua fazenda deveria 
    ser classificada como média propriedade, e não grande, sendo descabida a 
    cessão do imóvel ao domínio público.
 
 O argumento prosperou em primeira e segunda instâncias federais, que 
    decidiram em sentido oposto ao entendimento do Incra. Para o órgão, a 
    classificação da propriedade rural em pequena, média ou grande deve 
    subordinar-se à extensão da área, o que inclui tanto a área aproveitável 
    quanto a área não aproveitável do imóvel. Segundo esse critério, a “Fazenda 
    das Pedras" estaria, sim, sujeita à desapropriação.
 
 A Justiça Federal, porém, entendeu de modo diferente. Em seu acórdão, o TRF1 
    apontou a incidência do Estatuto da Terra (Lei n. 4.504/1964) para 
    estabelecer que a área não aproveitável de um imóvel rural não integra o 
    cálculo em que se define o tamanho da propriedade. Utilizando o conceito de 
    módulos fiscais como forma de medição – um a quatro módulos para a pequena 
    propriedade, superior a quatro até 15 para a média –, o órgão decidiu que o 
    número de módulos fiscais deverá ser obtido dividindo-se tão somente a área 
    aproveitável do imóvel rural pelo módulo fiscal do município (nos termos da 
    Lei n. 4.504/1964, artigo 50, parágrafo 3º, com a redação da Lei n. 
    6.746/1979).
 
 A decisão contrariou o Incra, que recorreu ao STJ. No entanto, ao relatar o 
    processo, o ministro Humberto Martins entendeu como correta a disposição do 
    TRF1 de interpretar a questão dentro da lógica do Estatuto da Terra. Segundo 
    Martins, o conceito de módulo fiscal, instituído pela Lei n. 6.746/1979, 
    sucede ao conceito de módulo rural previsto no referido estatuto. Mas a lei 
    que o regulamenta (Lei n. 8.629/1993) silencia sobre sua forma de aferição – 
    se deve incluir ou não a área não aproveitável do imóvel rural. Diante 
    disso, o TRF1 integrou a norma com as disposições constantes do parágrafo 3º 
    do artigo 50 do Estatuto da Terra, com redação dada pela Lei n. 6.746/1979. 
    Ali, está expressa a disposição de que somente a área aproveitável do imóvel 
    faz parte do cálculo.
 
 “O conceito de módulo fiscal foi estabelecido como um critério técnico 
    destinado a aferir a área de propriedade rural para efeitos do cálculo do 
    Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR), nada mais”, afirmou o 
    ministro Humberto Martins. “Trata-se de conceito de cunho meramente 
    arrecadatório ou fazendário.” Segundo o magistrado, tal conceito é mais 
    afeiçoado ao Direito Tributário que ao Direito Agrário, motivo por que o 
    entendimento firmado pelo TRF1 é tão acertado.
 
 “Entendo que é imprópria a ideia de se tripartir o cálculo do tamanho da 
    propriedade, diferenciando-o de acordo com o fim almejado, quer seja: para 
    efeitos de indivisibilidade; para efeitos de desapropriação para fins de 
    reforma agrária; ou para cálculo do Imposto sobre a Propriedade Territorial 
    Rural – ITR”, explicou o magistrado em seu voto. “Pelo contrário, andou bem 
    o tribunal a quo ao aproximar tais conceitos, interpretando-os 
    sistematicamente dentro da lógica do Estatuto da Terra, e do próprio Direito 
    Agrário”, concluiu.
 
 O voto foi seguido de forma unânime pelos demais ministros da Segunda Turma, 
    que ressaltaram, na própria sessão de julgamento, a importância da decisão 
    proferida. Para os magistrados, a decisão do STJ pode inibir eventuais 
    abusos no processo de reforma agrária brasileiro, evitando que o poder 
    público intervenha em áreas de interesse ecológico que, a partir de 
    critérios equivocados, pudessem ser classificadas como grandes propriedades 
    improdutivas.
 
 REsp 1161624
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