Averbar é preciso
Depois de 20 anos trabalhando com a compra
e venda de imóveis, percebo que muita gente menospreza um dos cuidados
mais importantes que se deve ter para conseguir uma transação
imobiliária rápida e segura: a análise cautelosa da documentação
imobiliária. Se for constatado algum erro ou má-fé nessa área, negócios
podem ser desfeitos, mesmo depois de anos de a transação ter sido
realizada.
Antigamente, não se obrigava o registro do nome da mulher do comprador.
As escrituras mencionavam apenas: "compareceu como outorgante comprador
fulano de tal, casado". Imagine só se o fulano ficou viúvo e, sem fazer
o inventário, casou-se novamente e depois compareceu ao tabelionato para
vender o imóvel. O tabelião, que não sabia o nome da primeira mulher,
vendo a segunda, considera-a como a única e efetiva a venda. Porém,
metade daquele imóvel legalmente pertenceria aos filhos da primeira
mulher. Esse registro, no futuro, poderá ser anulado e também serem
anulados todos os que lhe seguirem.
As pessoas não têm consciência do que é um registro imobiliário e
desconhecem a necessidade de se averbar tudo que diz respeito à
propriedade e à posse. O registro é a "carteira de identidade" do
imóvel. Nele consta toda e qualquer situação que poderá permitir ou
impedir a transferência do domínio da propriedade. Ele exige seqüência.
Qualquer alteração dos dados do imóvel ou das pessoas a que ele se
vincula é suficiente para impedir a venda do imóvel.
Vejo constantemente vendas se prolongarem ou não ocorrerem por causa
desse procedimento. O Cartório de Registro de Imóveis demora, em média,
cinco dias úteis para entregar a matrícula atualizada do imóvel. Em Belo
Horizonte, apenas o 4º Ofício a entrega no mesmo dia. Com a certidão em
mãos, na maioria das vezes, o corretor surpreende o dono do imóvel ao
mostrar que existem várias pendências a serem regularizadas no cartório
para se poder efetivar a venda do imóvel.
As pendências mais comuns referem-se à forma de partilha, separação,
renúncia de usufruto, baixa de hipoteca ou penhora. Depois são mais
dias, e até semanas, para atualizar toda a identidade do imóvel. O ideal
é que as pessoas fossem orientadas a regularizar o registro à medida que
os fatos fossem acontecendo: casamento, separação, morte. Os juízes
deveriam exigir que o registro fosse juntado ao processo após a
averbação. Assim, as pessoas ficariam mais atentas e evitariam problemas
no momento de vender o imóvel.
Cabe ao corretor de imóveis analisar a documentação imobiliária e, ao
vendedor, regularizar as pendências. O imóvel percorre quase todas as
esferas do direito, por isso não existe nenhuma forma de pesquisar, em
termos nacionais, com segurança absoluta, as ações que poderiam se
refletir na propriedade do imóvel. Muitos dizem que o único modo
teoricamente seguro de comprar qualquer imóvel no Brasil seria tirar
todas as certidões de todos os donos do imóvel nas últimas duas décadas
anteriores à compra, em todas as esferas do direito (trabalhista, cível,
penal, fiscal) e em todos os estados e municípios do país.
Como estamos falando de dezenas de milhares de certidões, sabemos que a
busca por essa segurança absoluta inviabilizaria qualquer negócio, tanto
pelo tempo que gastaria quanto pelo dinheiro que demandaria. Porém, há
como diminuir os riscos aos analisar o título de propriedade, a
identidade e capacidade das partes e as certidões atualizadas do imóvel
e do vendedor. Vale lembrar que cada certidão tem um tempo de validade,
uma vez que num curto espaço de tempo os acontecimentos na vida das
pessoas podem resultar em grandes transformações na sua idoneidade moral
e financeira.
Por mais que no Brasil cartório seja sinônimo de burocracia e falta de
modernização, ele ainda é a chave principal para se aproximar de uma
negociação mais segura. Poupar nesse momento também não é a melhor
saída, uma vez que a falta de uma simples certidão pode gerar negócios
malfeitos e pôr em risco as economias de uma vida inteira de trabalho.
Adriana Magalhães - Administradora |