Por maioria, a 8ª Câmara Cível do TJRS autorizou adoção póstuma,
reconhecendo a vontade inequívoca do falecido em adotar a enteada com a qual
estabeleceu filiação socioafetiva. Os magistrados determinaram, ainda, a
destituição do poder familiar do pai registral, que abandonou por completo a
filha, autora da ação. Deverá ser anotado no registro de nascimento da
adolescente o nome e sobrenome do falecido, em substituição ao do pai
biológico.
Apelação
Representada pela mãe, a menina apelou ao Tribunal de Justiça contra a
sentença, que julgou improcedentes a adoção e a destituição do poder
familiar. Sustentou que o pai biológico apenas a registrou, sem nunca
prestar auxílio material ou emocional.
O relator do recurso, Desembargador José Trindade, informou que a partir de
um ano de idade, a menina passou a conviver com o novo companheiro e
posteriormente esposo de sua mãe. A convivência com a menor durou três anos,
quando ele morreu. Ela também era dependente dele junto ao INSS.
Relação socioafetiva
Para o magistrado, a adoção póstuma é possível quando demonstrada a
inequívoca vontade dos adotantes, mesmo que falecidos antes do ajuizamento
da ação. Salientou entendimento do Desembargador Rui Portanova, em caso
análogo, referindo que a justificativa para essa interpretação é a
relevância conquistada pelas relações socioafetivas que se instauram no seio
familiar. “Fazendo com que o rigorismo formal seja abrandado em face da
prevalência dos interesses tutelados, quais sejam: o superior interesse da
criança e sua identidade enquanto filho dos pretensos adotantes, identidade
essa que tem relação direta com sua personalidade e seu referencial de
indivíduo na sociedade.”
Vontade
O Desembargador José Trindade destacou estar comprovado que o falecido havia
manifestado vontade em adotar a filha da sua esposa, “o que só não fez ante
a sua muito prematura morte por acidente.” Quando morreu aos 21 anos,
atropelado, a menina tinha 4 anos. Há provas no processo denotando a
condição do estado de filha, porque a autora foi criada como tal. O fato é
confirmado pela sucessão dele, representada pela sua genitora, e também por
outras testemunhas. Referiu que a menina também foi reconhecida como
dependente junto ao INSS para receber pensão por morte, na qualidade de
filha.
O magistrado ressaltou que o primeiro estudo social concluiu que a menina
não seria beneficiada com o deferimento da adoção, pois trocaria um pai
biológico desidioso por outro já falecido. Entretanto, ponderou, no
relatório constou que a autora do processo percebe o falecido como seu pai.
Já o segundo estudo social apontou que durante a convivência de ambos, ele
sempre foi muito amoroso com a enteada, fazendo com que ela ficasse muito
apegada.
Destituição familiar
Segundo o Desembargador José Trindade, o pai biológico, quanto à filiação,
procedeu somente ao registro do nascimento. “Simplesmente sumiu da vida da
filha, tendo sido citado por edital, e só foi encontrado por estar cumprindo
pena em razão de sentença criminal condenatória.” Ele não só concordou com a
destituição do poder familiar, como também revelou que o término do vínculo
familiar “está ótimo.”
Votou de acordo com o relator, o Desembargador Claudir Fidélis Faccenda,
Presidente.
Divergência
O Desembargador Alzir Felippe Schmitz negou provimento ao recurso da menina,
mantendo a sentença que julgou improcedente a adoção póstuma e destituição
do poder familiar do pai biológico.
A decisão de 1º Grau foi proferida pelo Juiz José Antônio Daltoé Cezar, da
2ª Vara do Juizado da Infância e da Juventude de Porto Alegre.
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