Felipe Leonardo Rodrigues*
“a profissão notarial é quiçá, entre todas as sociais, aquela cujo
exercício maior moralidade demanda...1”
A classificação das atas não é tarefa das mais fáceis. Uma corrente da
doutrina notarial classifica as atas notariais em duas facetas:
A primeira faceta depõe que o notário documenta mediante atividade “ativa”,
isto é, verifica os fatos subjetivamente, incluindo aí o juízo fático. Nessa
classificação, as atas caminham por si só, assim, necessitam tão somente do
impulso pelo requerimento feito pelo solicitante.
Desta forma, o tabelião age de forma ativa, sem a necessidade de coordenadas
ou de pedidos feitos pelo solicitante para o que constatar. Citamos p. ex.
as atas de notificação (sem intuito de registro), atas de constatação da
compra de produto em estabelecimento comercial, atas de constatação de
pagamento de sua recepção ou negativa por parte do credor de um crédito.
A segunda faceta diz que o notário documenta mediante atividade “passiva”,
ou seja, constata os fatos objetivamente, sem ilações quanto ao assunto de
fundo que movimenta os interesses das partes. Nessa classificação, as
coordenadas (os pedidos) para o que constatar é feito pelo solicitante,
desta forma, o tabelião age conforme os pedidos que lhe são dirigidos e
requeridos. Do contrário, o notário pode cometer equívocos descritivos sobre
o objeto da constatação, daí podendo incorrer em responsabilidades
desnecessárias.
Frisamos que as coordenadas (ou pedidos) lançadas pelo solicitante,
intervenientes ou requeridos para o que constatar se trata tão somente ao
objeto da constatação e não a sua redação, procedimento exclusivo do
tabelião.
No direito notarial, sabemos que nas atas notariais a intervenção notarial é
sempre requerida – o requerimento (verbal ou escrito) é o impulso para o
labor notarial.
Não há intervenção de ofício, exceto em casos específicos de direito difuso
e coletivo, ao que me consta, somos os únicos que defende tal posição.
No direito tabelionar, denomina-se solicitante ou requerente o sujeito de
direito que solicita a atuação do tabelião para tutelar (autenticar) um
direito ou interesse próprio ou de outrem (pessoa em cujo nome de outrem
atua).
Os notarialistas lecionam que, pelo principio da inescusabilidade notarial,
se o direito ou interesse invocado é legítimo - a juízo do tabelião -, e o
requerimento se efetuou, o tabelião que não tenha impedimento justificado
vincula-se à solicitação e, portanto, obrigado a realizar a diligência
notarial solicitada, do contrário poderá sofrer sanções administrativas.
Não é de mais frisar, para a confecção da ata notarial, basta o interesse
legitimo do solicitante em preservar e autenticar o fato desejado; não deve
imiscuir-se, o notário, em pedidos de provas ou outros elementos para a
operação notarial – o assunto de fundo diz respeito ao solicitante e ao
requerido.
Recebido a solicitação, o notário deve identificar e qualificar o
solicitante da ata postulada, em atenção supletivamente ao conteúdo ao art.
215 e incisos (exceto o IV), do Código Civil, bem como as Normas de Serviço
Extrajudicial dos Estados que também rege a atividade notarial – no caso das
atas – com as devidas adaptações, já que ata notarial não é e nem se parece
com escritura pública.
Os requeridos não estão obrigados a se identificarem, mas pedem ser
convidados a assinar a ata notarial, se se recusarem, basta a declaração de
quem são.
Ressaltamos que ata é ata, escritura é escritura. Tínhamos que a técnica nas
atas era a mesma que nas escrituras, no entanto a prática cotidiana nos
expôs que são práticas distintas, com particularidades individuais e
próprias.
O notário, ao entrar na atuação notarial, deve agir somente em virtude dos
pedidos do solicitante, regra que se afasta quando haja fato de relevância
social ou de interesse da justiça, e se a solicitação for contra esses
interesses, ela não será atendida.
Na relação entre o solicitante (ou terceiros) e o notário, este deve primar
pelo decoro profissional, isto é, na autenticação dos fatos o tabelião deve
agir com correção moral; compostura, decência.
Outro aspecto importante é a certeza plena dos fatos que ocorrem e jamais
certificar fatos dos quais não esteja plenamente convencido de que
ocorreram. Se o tabelião não tem convicção se os fatos efetivamente
ocorreram, ele deve ser abster de certificar, sob pena de responsabilidade
civil, penal ou administrativa.
É frequente (e sumamente necessário) que antes do início de qualquer
constatação (especialmente quando se prevê um desenvolvimento dificultoso)
se faz necessário instruir pormenorizadamente os atores da ata notarial
sobre seus requisitos e efeitos.
Esta tarefa quiçá deva continuar no momento em que se autentica o fato; é
habitual que o notário se veja obrigado a estar recordando o cliente
(leia-se o solicitante) às regras que o regem, especialmente quando se
produzem fatos que este considera opostos a seus interesses e devem ser
consignados no documento (“tabelião, isso não coloque na ata…”) (E. Jorge
Arévalo in Superficial Estudo Das Atas Notariais).
O tabelião deve atuar com independência e imparcialidade na verificação dos
fatos sem ater-se ao pano de fundo que rege os interesses do cliente, sob
pena de quebrar o protocolo e entrar numa seara que poderá, dependendo do
caso, custar à própria delegação.
Devemos procurar lavrar atas notariais robustas e protegê-las de ataques
(incidente de falsidade). Não podemos deixar que banalizem referido
instituto aos olhos da população e do judiciário; ato notarial tão
importante para a atividade notarial e em franca ascensão.
Há outras particularidades das atas notariais, considerados como próprios
delas. Mencionam-se:
a) exigência de que a narração do notário se ajuste à verdade;
b) a atuação imparcial por parte do notário que se cumpre, basicamente,
atendendo este procedimento:
1. se perguntado, ou a juízo do tabelião, dar-se a conhecer como tal ante
terceiros ou requeridos e demais presentes no começo do ato;
2. se perguntado, ou a juízo do tabelião, comunicar a estes o propósito da
diligência;
3. informar aos partícipes sobre a possibilidade de fazer constar na ata
declarações de toda índole que se relacionem com o objeto da diligência;
4. recordar que, a exceção do solicitante, as demais pessoas podem negar-se
a assinar o instrumento notarial, mas deve-se mencionar que houve o convite
para a assinatura;
c) a presença do notário como única fonte de narração dos fatos na ata -
princípio da imediação notarial;
Princípios este que fazem à essência da função notarial e fundamentam
suficientemente o afirmado. Mas convém mencionar que, segundo corresponda à
instrumentação de atas ou de escrituras, variam certas circunstâncias às
quais o notário deve adequar-se.
O intuito deste modesto artigo é alertar notários e escreventes sobre os
tentáculos de terceiros que rodeiam a redação das atas notariais,
especialmente para se beneficiarem com apontamentos e sugestões
tendenciosas, que podem por em xeque o ato notarial. O tabelião deve estar
atento e vigilante.
Referencia:
1Gutiérrez-Álveres, Jorge. Sobre la ética notarial. http://www.juridicas.unam.mx.
Acesso 15/02/2009.
*O autor é bacharel em Direito, especializando em Direito Notarial e
Registral, colunista do Boletim Eletrônico INR, colaborador do Boletim
Cartorário - DLI e atua no 26º Tabelionato de Notas de São Paulo.
Ao leitor interessado em conhecer outros assuntos relacionados ao tema
notarial, indicamos a consulta a nosso blog Crônica Notarial em
http://tabellios.blogspot.com/.
|