A anulação de registro de nascimento, por meio de ação negatória de
paternidade, só é possível quando há prova clara e incontestável de vício de
consentimento, como coação irresistível ou indução a erro. O ministro Sidnei
Beneti, em voto acompanhado de forma unânime pela Terceira Turma do Superior
Tribunal de Justiça (STJ), usou esse argumento para negar recurso de pai que
pretendia anular o registro do filho por ele assumido previamente.
Ao pedir a anulação do registro de nascimento, o autor da ação declarou que
sempre soube que não era o pai biológico da criança, mas mesmo assim
concordou em registrá-la como sua por pressão de seus próprios pais – que
acabaram criando o neto adotivo, pois o autor trabalhava em outra cidade, e
até o presentearam com carros e terra, conforme registra o processo.
Em 1999, pai e filho se submeteram a exame de DNA, o qual confirmou que
realmente não há vínculo biológico entre eles. O pai só entrou com a ação
anulatória quatro anos depois. O Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO) negou a
anulação, considerando que a paternidade foi reconhecida voluntariamente no
passado e que não havia no processo prova suficiente da alegada coação
psicológica.
Para o tribunal estadual, a adoção – mesmo a socioafetiva ou “à brasileira”,
quando as pessoas simplesmente registram filhos que não são seus – é
irretratável, com base nos princípios da dignidade humana e da efetividade.
Em recurso especial ao STJ, o pai adotivo alegou que o TJGO, mesmo admitindo
que se tratou de uma “adoção à brasileira”, não reconheceu a falsidade do
registro. E insistiu na tese de que o registro deveria ser anulado por vício
de consentimento, uma vez que ele teria registrado a criança sob coação.
Porém, para o relator do caso, ministro Sidnei Beneti, as alegações do pai
não procedem. Ele observou que, segundo concluiu o TJGO ao analisar as
provas do processo, o exame de DNA realmente afastou a paternidade
biológica, porém não ficou demonstrado que o registro foi feito sob coação.
Diante disso, o tribunal estadual decidiu conforme orientação estabelecida
pela Terceira Turma do STJ em julgamentos anteriores: “O reconhecimento
espontâneo da paternidade somente pode ser desfeito quando demonstrado vício
de consentimento.”
De acordo com os precedentes citados pelo relator, quando alguém que não é
pai biológico registra voluntariamente uma criança como sua, esse registro
até pode ser anulado no futuro, desde que haja prova convincente de que a
pessoa foi induzida a erro ou coagida a reconhecer a paternidade. Sem essa
prova, não há como desfazer um ato realizado de vontade própria, em que a
pessoa, mesmo sabendo não haver vínculo biológico com o menor, aceitou
reconhecê-lo como filho.
“A conclusão a que chegou o tribunal estadual decorreu da análise das provas
constantes nos autos, que formaram o convencimento acerca da ausência de
vício de consentimento quanto ao registro da paternidade. Rever tal ponto e
declarar existente o defeito propalado pela parte necessitaria de incursão
no conjunto probatório dos autos” – afirmou o ministro, lembrando que essa
revisão de provas não é possível no julgamento de recurso especial.
O número deste processo não é divulgado em razão de segredo de justiça.
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