Agravo de instrumento - Direito sucessório - Qualidade de herdeiro - Inexistência - Guarda exercida pelo de cujus - Relação que não qualifica a parte como descendente

- Aquele que se encontrava sob a guarda do de cujus não é herdeiro para fins sucessórios, a teor do que dispõe o art. 1.829 do CCB, uma vez que não se enquadra na categoria de descendente do guardião.

Agravo de Instrumento Cível n° 1.0701.09.285502-5/001 - Comarca de Uberaba - Agravante: Paulo Ricardo da Silva - Agravados: Espólio de Feliciano Ferreira da Silva e outro - Relator: Des. Dídimo Inocêncio de Paula

A C Ó R D Ã O

Vistos etc., acorda, em Turma, a 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, em negar provimento.

Belo Horizonte, 17 de dezembro de 2009. - Dídimo Inocêncio de Paula - Relator.

N O T A S T A Q U I G R Á F I C A S

DES. DÍDIMO INOCÊNCIO DE PAULA - Trata-se de agravo de instrumento aforado contra a decisão do digno Juiz de Direito da 3ª Vara de Família e Sucessões da Comarca de Uberaba/MG (anexada às f. 35-TJ), prolatada nos autos da ação de inventário pelo rito de arrolamento proposta pelo agravante.

Combate o recorrente a decisão proferida pelo douto Julgador a quo, que declarou serem os falecidos tão somente guardiões do agravante, o que não lhe concede o título de herdeiro do bem em questão.

Despacho de minha lavra às f. 41-TJ, determinando a requisição de informações ao Juízo primevo.

Informações do magistrado monocrático às f. 48-TJ.

Ausente contraminuta.

É o relatório.

Conheço do recurso, porquanto tempestivo e presentes os pressupostos de sua admissibilidade; ausente o preparo, uma vez deferido o pedido de justiça gratuita para fins recursais em meu despacho primevo proferido nos autos.

Preliminares não havendo a serem examinadas, passo ao deslinde do mérito.

Não vejo como ser provido o presente recurso.

Segundo informações trazidas pelo próprio agravante, encontrava-se ele apenas na guarda dos falecidos, cujo inventário ora pretende abrir.

Conforme preceitua o art. 1.829, inciso I, do CCB, apenas o descendente figura na ordem da vocação hereditária.

"Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:

I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;

II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;

III - ao cônjuge sobrevivente;

IV - aos colaterais".

E cediço é que a mera guarda não confere ao menor a condição de descendente do guardião, mormente quando não é deferida para regularizar a convivência decorrente da adoção, mas sim como mera medida de colocação do menor em família substituta, para atender a situações peculiares ou suprir a falta eventual dos pais ou responsáveis, tal como se deu na hipótese em comento, a teor do termo de guarda de f. 19-TJ.

Veja-se o que dispõe o art. 33 do ECA a respeito:

"Art. 33. A guarda obriga à prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais.

§ 1º A guarda destina-se a regularizar a posse de fato, podendo ser deferida, liminar ou incidentalmente, nos procedimentos de tutela e adoção, exceto no de adoção por estrangeiros.

§ 2º Excepcionalmente, deferir-se-á a guarda, fora dos casos de tutela e adoção, para atender a situações peculiares ou suprir a falta eventual dos pais ou responsável, podendo ser deferido o direito de representação para a prática de atos determinados.

§ 3º A guarda confere à criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários".

Ressalte-se que nem mesmo a previsão contida no retrotranscrito § 3º do dispositivo legal em comento justifica o acolhimento da pretensão recursal, haja vista que o fato de se outorgar àquele que se encontra sob a guarda de terceiro a condição de dependente não lhe confere também o título de herdeiro, reservado apenas aos descendentes do de cujus.

Desse entendimento não discrepa a jurisprudência:

"Ementa: Extinção do processo - Habilitação em inventário - Filiação - Sua definição - Adoção não demonstrada - Necessidade de processo contencioso - Matéria de prova - Oportunidade e legalidade da decisão extintiva. - Se não demonstrada salienter tantum a existência de regular adoção, mas tão só o encargo de guarda, fica desautorizada a habilitação dos alegados filhos adotivos no inventário de seu pretenso pai - o que acarreta a extinção do respectivo processo habilitatório, sem julgamento do mérito. Contudo, fica-lhes facultada a utilização das vias ordinárias para, em feito contencioso, buscarem definir a pretendida filiação adotiva" (TJMG, Apelação Cível nº 1.0000.00.241559-4/000, Rel. Des. Hyparco Immesi, DJ de 11.03.2004).

Por fim, é de se ver que tampouco se há de acolher a alegação do recorrente no sentido de que deve ser reconhecida a paternidade socioafetiva dos falecidos, uma vez que tal questão é de alta indagação, devendo ser decidida em sede de ação ordinária, em que se possa apurar a convivência, afetividade e estabilidade na relação entre o agravante e seus guardiões.

A esses argumentos, nego provimento ao recurso.

Custas recursais, pelo agravante, suspensas por litigar sob o pálio da justiça gratuita.

Votaram de acordo com o Relator os Desembargadores Elias Camilo e Kildare Carvalho.

Súmula - NEGARAM PROVIMENTO.


Fonte: Diário do Judiciário Eletrônico do TJMG - 16/04/2010.

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