De Número do processo:
1.0024.03.995070-4/002(1) Númeração Única:
9950704-22.2003.8.13.0024
Processos associados:
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Relator: Des.(a) SELMA MARQUES
Relator do Acórdão: Des.(a) SELMA MARQUES
Data do Julgamento: 11/05/2011
Data da Publicação: 18/05/2011
Inteiro Teor:
EMENTA: AÇÃO REIVINDICATÓRIA - DOMÍNIO NEBULOSO - REQUISITO INTRANSPONÍVEL.
Na ação reivindicatória, a parte autora deve demonstrar de forma inequívoca
o seu domínio sobre o imóvel objeto de litígio, porquanto tal modalidade de
ação é destinada a assegurar ao proprietário a possibilidade de reaver a
coisa das mãos daquele que injustamente a possui.
EMBARGOS INFRINGENTES Nº 1.0024.03.995070-4/002 COMARCA MARILDA MACIEL
PASSOS
EMBARGANTE(S) LUZENI APARECIDA DE COSTA ROCHA
EMBARGADO(A)(S)
A C Ó R D Ã O
Vistos etc., acorda, em Turma, a 11ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do
Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, por maioria,
em .
Belo Horizonte, 11 de maio de 2011.
DES.ª SELMA MARQUES,
RELATORA.
DES.ª SELMA MARQUES (RELATORA)
V O T O
< Trata-se de embargos infringentes interpostos contra o acórdão de ff.
169/182 que, por maioria, deu provimento ao apelo interposto por Luzeni
Aparecida de Costa Rocha e outro nos autos da ação reivindicatória que move
contra Marilda Maciel de Passos e outros, para julgar procedente o pedido
inicial e declarar a posse em favor dos autores, ressalvada a questão da
titularidade a ser discutida oportunamente em sede própria.
Inconformada a parte apelada interpôs estes embargos infringentes no intuito
de que prevaleça o voto minoritário do i. Revisor, no sentido de que
prevaleça a sentença de primeiro grau, a qual afastou o direito dos autores
da reivindicatória de obterem a posse do imóvel, porque há dúvidas sobre o
seu domínio.
Na resposta oferecida ao recurso às ff. 191/198, há preliminar de não
conhecimento dos embargos infringentes, porque o voto vencido não acompanha
os fundamentos exarados na sentença. No mérito, pugnam pelo seu não
provimento.
Cumpre inicialmente apreciar os requisitos de admissibilidade dos
infringentes.
Neste sentido, cumpre anotar que estão presentes todos os requisitos
elencados pelo art. 530, do CPC.
Não houve unanimidade no julgamento colegiado e o voto minoritário foi no
mesmo sentido da r. sentença apelada que julgou improcedente o pedido
inicial.
Ou seja, considerando o resultado do julgado no Tribunal e o pronunciamento
proferido em 1º grau existe divergência numericamente qualificada, (2x2) a
justificar o cabimento dos embargos infringentes.
Ao voto minoritário se agrega o dispositivo da r. sentença, ainda que os
fundamentos adotados em um e outro tenham levado em consideração aspectos
diversos da demanda reivindicatória.
Ora, com a modificação introduzida pela Lei 10.532/2001, a admissibilidade
dos infringentes "afina-se com a origem história deste recurso, já que seu
fundamento, ao menos na sua gênese, baseava-se na existência de dois votos
em um sentido e dois em outro - dois votos no colegiado, no sentido
contrário à sentença, e um voto no colegiado mais o entendimento do
magistrado a quo, no sentido da sentença. O 'empate' então gerado
autorizaria a revisão da decisão por um colegiado maior, de forma a
superá-lo". (Marinoni. Manual do Processo de Conhecimento. 4ª ed. 2005, p.
547).
Por isto, há falar em empate ou em divergência numericamente qualificada a
ensejar os presentes infringentes.
Confira-se:
"(...) a decisão do juiz de primeira instância passa a ter importância no
cálculo do resultado final da causa que autoriza os embargos... (...) cabem
os infringentes, de outra parte, se o acórdão reforma a sentença definitiva
do juiz, porque, nessa hipótese, pela soma dos pronunciamentos decisórios, o
julgamento está empatado em 2x2 (o juiz de direito e um juiz do tribunal, de
um lado, e dois juizes do tribunal, de outro). Somente a divergência
numericamente qualificada passa, então, a justificar os embargos, (2x2)".
(Costa Machado. CPC Interpretado... 2ª ed. 2008, p. 971).
Logo, rejeito a preliminar.
Presentes os requisitos legais admito os embargos.
Cuidam os autos de pedido de natureza reivindicatória, onde alegam as
autoras que detém o título de domínio do imóvel constituído pelo lote 25, da
quadra 20 do Bairro Flávio Marques Lisboa, nesta Capital, devidamente
registrado no Cartório de Registro de Imóveis local, sob o nº 67835, o qual
foi invadido pelos réus.
A questão colocada no processo revelou-se truncada e bastante controversa,
pois nos autos da ação de usucapião em apenso, o Estado de Minas Gerais
manifestou interesse no litígio, demonstrando haver duplicidade de registros
em relação ao imóvel, impedindo-o, inclusive, de ser usucapido, por
caracterizar-se como bem público.
Sobre este aspecto, vale a leitura do voto minoritário da lavra do i.
Desembargador Marcelo Rodrigues, o qual analisou minuciosamente a questão, à
luz da evolução histórica do Registro Público no país.
Logo, como se vê, existe controvérsia sobre a legitimidade da propriedade da
parte autora sobre o imóvel descrito na inicial, pois conforme restou
aferido na ação de usucapião, há também titularidade do Estado de Minas
Gerais sobre o bem litigioso, precedente àquele.
Deste modo, o requisito concernente à titularidade do domínio sobre a coisa
reivindicada não restou satisfatoriamente preenchido pela autora.
Lado outro, há prova nos autos de que a posse exercida pelos réus não é
injusta.
Como é cediço, na ação reivindicatória, o que a parte autora deve demonstrar
de forma inequívoca não é a sua posse sobre o imóvel objeto de litígio, mas,
sim, o domínio, porquanto tal modalidade de ação é destinada a assegurar ao
proprietário a possibilidade de reaver a coisa das mãos daquele que
injustamente a possui, conforme preceito inserido no artigo 524 do CC/1916,
direito garantido atualmente pelo artigo 1.228 do NCC.
Discorrendo sobre a ação reivindicatória, preleciona Orlando Gomes (in
Direitos Reais, Rio de Janeiro, Forense, 13ª ed., 1998, p. 256) que:
"Um dos direitos elementares do domínio é a faculdade do seu titular de
reaver a coisa do poder de quem quer que injustamente a detenha ou
possua.Essa pretensão se exerce mediante a ação de reivindicação que,
segundo conhecida fórmula, compete ao proprietário não-possuidor contra o
possuidor não-proprietário.O fundamento da ação reivindicatória é o direito
de seqüela, esse poder de seguir a coisa onde quer que esteja, que é um dos
atributos dos direitos reais. Objetiva-se no direito de propriedade pela
faculdade de recuperá-la:
1ª) quando o possuidor não-proprietário contesta a propriedade do
proprietário não-possuidor, julgando-se proprietário do bem;
2ª) quando o possuidor não-proprietário, embora não conteste a propriedade
do dono do bem, o retém sem título, ou causa.
A primeira hipótese é a mais comum. Configura o conflito entre a propriedade
e a posse, entre a realidade e a aparência. Quem está privado da coisa que
lhe pertence quer retomá-la de quem a possui injustamente. Para esse fim,
propõe a ação reivindicatória."
E acrescenta:
"A ação reivindicatória dirige-se contra o detentor da coisa, ou seu
possuidor, de boa ou má-fé. Numa palavra, contra quem quer que injustamente
a possua. Será esse o réu da ação." (ob. cit. P. 257).
A respeito dos requisitos essenciais para se obter a tutela reivindicatória,
lecionam PAULO TADEU HAENDCHEN E RÊMOLO LETTERIELLO, (apud "Ação
Reivindicatória", Saraiva, 5ª edição, 1997, p. 34), verbis:
"São requisitos para a admissibilidade da ação:
a) que o autor tenha a titularidade do domínio sobre a coisa reivindicanda;
b) que a coisa seja individuada, identificada;
c) que a coisa esteja injustamente em poder do réu, ou prova de que ele
dolosamente deixou de possuir a coisa reivindicanda.
São esses os requisitos oriundos do art. 524 do Código Civil, que assegura
ao proprietário o direito de usar, gozar e dispor de seus bens e de
reavê-los do poder de quem quer que injustamente os possua."
Sobre a ação reivindicatória, registre-se ainda:
"Na ação reivindicatória se pede a posse da coisa. No entanto, a ação
reivindicatória pode ser proposta pelo proprietário contra o possuidor. Ou
melhor, tal ação é atribuída ao proprietário sem posse contra o possuidor
que não é proprietário.
A ação de funda no domínio, e a reivindicação somente será procedente quando
a sentença reconhecer que o réu detém injustamente a posse da coisa.
Para que seja possível compreender de forma mais fácil essa ação, é
importante comparar as situações do locador com a do proprietário. A ação de
despejo assegura ao locador a recuperação da coisa entregue em locação, ao
passo que a ação reivindicatória garante ao proprietário a recuperação da
coisa que lhe pertence. Em ambos os casos, há técnica de recuperação da
coisa injustamente possuída". (Luis Guilherme Marinoni. Técnica Processual e
Tutela dos Direitos. 2004. p. 567).
Importante observar que a faculdade de "reivindicar é a prerrogativa do
proprietário de excluir a ingerência alheia injusta sobre coisa sua. É o
poder do proprietário de buscar a coisa em mãos alheias, para que possa
usar, fruir e dispor, desde que o possuidor ou detentor a conserve sem causa
jurídica. É efeito dos princípios do absolutismo e da seqüela, que marcam os
direitos reais. A ação reivindicatória, espécie de ação petitória, com
fundamento no jus possidendi, é a ajuizada pelo proprietário sem posse,
contra o possuidor sem propriedade. Irrelevante a posse anterior do
proprietário, pois a ação se funda no ius possidendi e não no ius
possessionis; ou em termos diversos, não no direito de posse, mas no direito
à posse, como efeito da relação jurídica preexistente". (Francisco Eduardo
Loureiro. Código Civil Comentado. Coord. Min. Cezar Peluso. 2007. p. 1044).
Por esta razão, concluo que laborou com acerto o ilustre sentenciante, ao
julgar improcedente o mérito da demanda, diante da controvérsia que paira
sobre a prova da propriedade sobre o imóvel, requisito indispensável à
presente ação.
Isso posto, ACOLHO OS EMBARGOS INFRINGENTES, para que prevaleça o voto
minoritário que julgou improcedente a reivindicatória.
Custas, pelos embargantes, suspenso o pagamento, porque amparados pelos
benefícios da assistência judiciária.
É como voto.
DES. FERNANDO CALDEIRA BRANT (REVISOR)
V O T O
Em que pese o judicioso voto da Em. Desembargadora Relatora, em consonância
com o voto que proferi em sede de apelação, rejeito os embargos infringentes
pelos fundamentos já apostos no acórdão de f. 169/182 - TJ.
DES. MARCELO RODRIGUES
V O T O
Em síntese, pretende os embargantes o acolhimento dos presentes embargos
infringentes para prevalecer o voto minoritário, de minha lavra, quando do
julgamento do recurso de apelação (f. 173/182-TJ), na qual atuei como
Revisor, e embora por fundamentos diversos neguei provimento ao referido
recurso, mantendo a sentença que julgou improcedentes os pedidos iniciais.
Na ocasião, por maioria de votos a sentença acabou sendo reformada para
declarar a posse em favor de Luzeni Aparecida de Costa Rocha e Tatiane da
Costa Rocha, ressalvando-se a questão da titularidade a ser discutida em
sede própria.
De início, reitero a presença dos requisitos legais ensejadores do
conhecimento destes infringentes, razão pela qual, igualmente afasto a
preliminar a respeito.
No mérito, reconfortado pela conclusão alcançada pela i. Desembargadora
Relatora destes embargos infringentes, acompanho-a na íntegra, para
acolhê-los, ratificando o meu posicionamento na esteira do voto por mim
proferido à f. 173/182-TJ e pelos mesmos subsídios ali despendidos quando do
julgamento da apelação.
À luz destas considerações, acolho os embargos infringentes, para reformar o
acórdão embargado e julgar improcedente a ação reivindicatória.
Custas recursais, pelas embargadas, suspensa a exigibilidade em razão da
gratuidade da justiça.
É o meu voto.
DES. MARCOS LINCOLN
V O T O
Data venia, ouso divergir da eminente Relatora e rejeito os embargos
infringentes, nos termos do posicionamento que adotei quando do julgamento
da apelação.
É como voto.
DES. WANDERLEY PAIVA
V O T O
Acompanho a i. Desembargadora Relatora para também ACOLHER os Embargos
Infringentes.
DES.ª SELMA MARQUES SÚMULA: "< ACOLHER OS EMBARGOS"
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