Letra de câmbio - Princípio pacta sunt servanda - Observância - CDC - Inaplicabilidade

 

JURISPRUDÊNCIA CÍVEL

AÇÃO ORDINÁRIA - CORRENTISTA - EMPRÉSTIMO BANCÁRIO - INADIMPLEMENTO - BANCO - LETRA DE CÂMBIO - EMISSÃO - POSSIBILIDADE - PROTESTO DE TÍTULO - SUSTAÇÃO - NÃO-CABIMENTO - ABERTURA DE CRÉDITO - PACTA SUNT SERVANDA - RELAÇÃO DE CONSUMO - INEXISTÊNCIA - CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - INAPLICABILIDADE - IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO


Ementa: Letra de câmbio - Princípio pacta sunt servanda - Observância - CDC - Inaplicabilidade.

- O princípio pacta sunt servanda tem que ser observado, tendo em vista que na hora de contratar o devedor toma ciência dos juros e da real postura dos bancos perante esse tipo de contrato.

- O CDC não é aplicável ao caso por não se tratar de relação de consumo, tendo em vista que o crédito fornecido ao devedor é meramente o meio pelo qual adquirirá o produto de um fornecedor, tornando-se, nesse momento, o consumidor final.

Apelação Cível ndeg. 2.0000.00.475682-1/000 - Comarca de Belo Horizonte - Apelante: Banco Itaú S.A. - Apelado: Osmar Antônio Galhardo Mecheluti - Relator: Des. Batista de Abreu

A C Ó R D Ã O

Vistos etc., acorda, em Turma, a 16ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, em dar parcial provimento ao recurso.

Belo Horizonte, 23 de maio de 2007. - Batista de Abreu - Relator.

N O T A S  T A Q U I G R Á F I C A S

DES. BATISTA DE ABREU - Osmar Antônio Galhardo Mecheluti propôs ação ordinária em face de Banco Itaú S.A. pretendendo a anulação de letra de câmbio emitida por mandato e levada a protesto pelo réu, ora apelante; a sustação e cancelamento desse protesto e condenação do réu ao pagamento de indenização por danos morais, alegando, sucintamente, que é cliente do banco, tendo firmado com este uma operação financeira através do contrato nº 000000709375711; que o apelado foi surpreendido com o apontamento para protesto de uma letra de câmbio no valor de R$ 10.997,80 (dez mil novecentos e noventa e sete reais e oitenta centavos) cujo vencimento se deu à vista tendo como credor e sacador o próprio banco; que o apelado alega ainda que a letra de câmbio apontada para protesto foi emitida por mandato para garantia da operação financeira já citada, tendo em vista a existência de saldo devedor em conta corrente, vinculando-se a ele, perdendo sua autonomia e abstração; que o saldo devedor cresceu assustadoramente em virtude do acréscimo de taxas, juros exorbitantes e demais encargos e, diante desse aumento e em vista do vencimento antecipado da dívida, se tornou impossível o pagamento do saldo devedor.

O apelante contestou, alegando (f. 27/35), em síntese, que a emissão e encaminhamento para protesto da letra de câmbio contra a qual o apelado se rebela teve o objetivo de cobrança de saldo devedor em conta corrente, no valor de R$ 10.997,80 (dez mil novecentos e noventa e sete reais e oitenta centavos); que esse título foi emitido e levado a protesto diante da sua inadimplência; e havendo tal fato o mesmo é autorizado, pelo contrato de abertura de conta corrente, a emitir letra de câmbio; que a autorização não é só contratual como legal; que o apelado utilizou-se do crédito colocado à sua disposição sem, no entanto, quitá-lo conforme celebrado entre as partes; que o apelante emitiu em nome próprio título de crédito representativo de débito; que o título enviado a protesto tem o caráter de certeza, liquidez e exigibilidade; que essa quantia corresponde ao saldo devedor em conta corrente, refletindo os ditames do contrato; que inexiste indenização, uma vez que o apelado não demonstrou o dano sofrido.

A sentença, de f. 53/58, julgou procedentes os pedidos formulados pelo autor para declarar ineficaz a letra de câmbio levada a protesto, bem como para condenar o apelante ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), determinando, ainda, o cancelamento do protesto da letra de câmbio, fundamentando, principalmente, que a cláusula que autoriza a emissão da letra de câmbio é iníqua, uma vez que o débito foi apurado unilateralmente pela instituição financeira, sendo, portanto, desprovido de certeza e exigibilidade. Ademais, não houve embasamento legal e fático para a emissão da letra de câmbio, sob a ótica do Direito do Consumidor.

O apelante interpôs recurso de apelação expondo suas razões às f. 60/69, pretendendo a reforma da sentença, sob os mesmos fundamentos expostos na peça contestatória.

Sem contra-razões.

Alega o apelado ilicitude na conduta do apelante em sacar e emitir a letra de câmbio objeto da ação. Porém, quando da assinatura do contrato de abertura de crédito em conta
corrente, o apelado estava ciente de que, em caso de não-pagamento, ocorreria o vencimento antecipado da dívida, autorizando o banco a emitir a letra de câmbio, conforme cláusula contratual 12.1 (f. 44).

O princípio pacta sunt servanda tem que ser observado, tendo em vista que na hora de contratar o devedor toma ciência dos juros e da real postura dos bancos perante esse tipo de contrato. Nessas situações, geralmente, o devedor utiliza-se do crédito, e, no momento do pagamento, quer discuti-lo por considerar os juros e demais encargos abusivos. É o que tem acontecido com freqüência por parte dos clientes dos bancos, por meio da chamada ação revisional de cláusula contratual. Por motivos muitas vezes não demonstrados pelas partes, elas simplesmente deixam de pagar suas dívidas para discuti-las em juízo.

Essa situação se agravou com entendimento de que a relação cliente e banco é uma relação de consumo. A meu ver, o CDC não é aplicável ao caso, por não se tratar de relação de consumo, tendo em vista que o crédito fornecido ao devedor é meramente o meio pelo qual adquirirá o produto de um fornecedor, tornando-se, nesse momento, o consumidor final.

Com base no princípio pacta sunt servanda, ou princípio da obrigatoriedade dos contratos, não cabe prosperar o pedido de anulação da letra de câmbio emitida pelo banco, uma vez que ela estava prevista no contrato de abertura de crédito conforme f. 44, não sendo surpresa para o apelado que tal fato viesse ocorrer em face do inadimplemento noticiado.

Além do mais, se se discute apenas a validade da emissão dessa letra de câmbio, se anulada nenhum efeito produz porque o débito continua, a cobrança pode ser feita de qualquer outra forma, com base no contrato de mútuo.

Ante o exposto, dou provimento à apelação para julgar improcedente o pedido inicial e, invertendo o ônus da sucumbência, condenando o apelado no pagamento das custas do recurso.

Votaram de acordo com o Relator os Desembargadores José Amancio e Sebastião Pereira de Souza.

Súmula - DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO.


Fonte: Jornal "Minas Gerais" - 20/11/2007

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