É possível a cumulação dos pedidos formulados em ação de investigação de
paternidade e de anulação dos assentos civis do investigante, quanto à
paternidade registral, pois o cancelamento deste é simples consequência da
procedência do pedido formulado na investigatória. O entendimento é da
Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar recurso
formulado pelo suposto pai.
No caso, Mônica (a suposta filha) ajuizou, em 1997, ação ordinária de
reconhecimento de paternidade apenas contra o suposto pai. Posteriormente,
em razão de determinação do juiz da causa, foram incluídos também seus
genitores constantes do assento civil, ou seja, o seu pai registral e a mãe,
o que levou à retificação do nome jurídico da ação para “anulação parcial de
registro c/c investigação de paternidade”.
Nessa ação, a causa de pedir relacionava-se ao direito de Mônica ao
reconhecimento de seu real estado de filiação, mediante investigação de
paternidade do seu suposto pai, considerando o fato de que, à época da sua
concepção, sua mãe mantinha relacionamento amoroso com o investigado.
No entanto, esse processo foi extinto sem julgamento de mérito. O juízo de
primeiro grau entendeu que faltava ao pedido de reconhecimento de nova
paternidade “o indispensável interesse jurídico, enquanto que não se tenha
por anulado o primitivo registro civil”, além de se tratar de pedido
juridicamente impossível, “pois o ordenamento jurídico vigente não admite
paternidade dupla” e, portanto, cumulação entre os pedidos de reconhecimento
de paternidade e anulação parcial de registro civil.
O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) deu provimento ao apelo da
suposta filha. Entretanto, no julgamento dos embargos infringentes (recurso
somente possível quando a decisão é por maioria) interpostos pelo
investigado, o tribunal estadual restabeleceu a sentença, lembrando o fato
de que o interesse material de Mônica, de anulação parcial de seu registro
de nascimento, somente se configuraria após a verificação da efetiva
paternidade do suposto pai.
Segunda ação
Após o trânsito em julgado da demanda, a suposta filha ajuizou, em 2006, uma
segunda ação – agora intitulada “ação de investigação de paternidade c/c
anulação do registro de nascimento” – contra as mesmas pessoas anteriormente
abrangidas na demanda.
Desta vez, fundamentou sua pretensão na existência de relação amorosa, à
época, entre sua genitora e o investigante e, também, no fato de que, após a
realização de exame de DNA, ficou definitivamente excluída a paternidade do
seu pai registral.
Essa nova ação teve seu processamento deferido pelo juízo de primeiro grau,
que afastou a preliminar, suscitada pelo suposto pai, de ofensa à coisa
julgada. Contra esta decisão, houve a interposição de agravo de instrumento,
o qual não foi provido pelo TJRJ, que entendeu que a extinção da primeira
ação ensejou coisa julgada apenas formal, o que viabilizaria o ajuizamento
de nova ação.
O suposto pai recorreu, então, ao STJ, sustentando que a extinção do
processo sem resolução do mérito, por carência de ação, impede o autor de
ajuizar nova ação, ante o óbice da coisa julgada material e a
impossibilidade de o julgador analisar novamente as questões já decididas.
Além disso, alegou que “não se discute nos autos a possibilidade teórica” de
cumulação dos pedidos de investigação de paternidade e de anulação de
registro civil, “mas apenas se é possível a repetição ipsis litteris de ação
anteriormente proposta e da qual o autor foi julgado carecedor da mesma por
acórdão transitado em julgado”.
Voto
Segundo o relator, ministro Raul Araújo, quando da propositura da segunda
ação, por meio da reformulação do pedido e da causa de pedir próxima, não
mais persistiam os óbices apontados na primeira demanda. No seu entender,
está configurado o interesse processual, em seu binômio
necessidade-adequação, bem como a possibilidade jurídica do pedido,
sobretudo considerando o entendimento doutrinário e jurisprudencial no
sentido da possibilidade de cumulação entre os pedidos de investigação de
paternidade e de anulação do registro de nascimento, na medida em que este é
consequência lógica da procedência daquele.
“Não se pode inviabilizar o ajuizamento de nova ação quando houver apenas
coisa julgada formal na extinção do processo anterior e a ação
posteriormente proposta atender aos pressupostos jurídicos e legais
necessários ao seu processamento. Deve, ao reverso, ser possibilitado, nesta
segunda ação, o conhecimento pela autora de sua real filiação, com a
consequente alteração de seu registro civil de nascimento, se for o caso”,
afirmou o ministro.
O número deste processo não é divulgado em razão de sigilo. |