AÇÃO DE IMISSÃO NA POSSE - ANTECIPAÇÃO DE TUTELA - POSSIBILIDADE -
REQUISITOS - IMÓVEL ALIENADO FIDUCIARIAMENTE ARREMATADO EM LEILÃO
EXTRAJUDICIAL - ART. 27 E SEGUINTES DA LEI Nº 9.514, DE 20 DE NOVEMBRO DE
1997
- A imissão na posse é devida a quem detenha o domínio da coisa, sem nunca
haver exercido a posse, possuindo como requisitos a existência de título de
propriedade e o fato de nunca haver o proprietário gozado ou fruído da
posse.
- Para a concessão da antecipação de tutela, como se caracteriza o pleito
liminar principal agravado, o art. 273 do Codex Processual Civil exige a
prova inequívoca das alegações do autor, bem como a verossimilhança da
alegação expendida, cumulando-a com o fundado receio de dano irreparável ou
de difícil reparação ou o abuso de direito de defesa ou manifesto propósito
protelatório do réu.
- A arrematação extrajudicial de bem imóvel alienado fiduciariamente dá ao
arrematante o direito à sua imissão liminar na posse, sendo ônus dos
devedores fiduciários a caracterização da verossimilhança capaz de elidir
aquele direito. O fundado receio de dano irreparável é notório, visto que a
persistência da posse dos atuais detentores sobre bem imóvel de manifesta
propriedade de outrem causa a este prejuízos, os quais lhe serão de difícil
ou impossível reparação. A verossimilhança das alegações e a prova
inequívoca caracterizam-se pelo regular título de propriedade adquirido pela
arrematação extrajudicial do bem.
Recurso não provido.
Agravo de Instrumento Cível n° 1.0166.09.025463-1/001 - Comarca de Cláudio -
Agravantes: Adair Alves de Andrade e outros - Agravado: Chang Tian Shui -
Relator: Des. Cabral da Silva
A C Ó R D Ã O
Vistos etc., acorda, em Turma, a 10ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do
Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador Pereira da Silva,
na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à
unanimidade de votos, em negar provimento.
Belo Horizonte, 18 de maio de 2010. - Cabral da Silva - Relator.
N O T A S T A Q U I G R Á F I C A S
Assistiu ao julgamento, pelo agravado, o Dr. João Batista Miranda.
DES. CABRAL DA SILVA - Trata-se de agravo de instrumento aviado por Adair
Alves de Andrade e outros em face da decisão de f. 39/40-TJ, nos autos da
"ação ordinária de imissão na posse", a qual deferiu o pedido liminar para
que a posse do imóvel arrematado em leilão lhe fosse concedida, sob pena de
multa diária.
Em sua minuta recursal, o agravante alegou, em síntese, que a decisão
agravada deve ser substituída, visto que estariam quites com o contrato, não
havendo sido notificadas do primeiro e do segundo leilão, bem como
realizaram investimentos diversos na propriedade. Diante do exposto,
requereu também que fosse concedido o efeito suspensivo, nos termos do art.
527, II, e art. 558 do CPC, a fim de que se revogasse o cumprimento da
decisão liminar agravada.
Em sede de despacho vestibular, indeferi os pedidos de efeito suspensivo e
os benefícios da assistência judiciária e determinei a intimação do
agravado, bem como a comunicação ao Magistrado primevo sobre o teor da
decisão e para que prestasse informações.
Instado a se pronunciar, o i. Juízo a quo prestou as suas informações na f.
143/144-TJ, informando a manutenção da decisão agravada e comunicando o
cumprimento das prescrições do art. 526 do Codex Processual Civil.
A parte agravada, intimada, apresentou contraminuta, sustentando a
legalidade de seu pleito. Apontou a titularidade dos direitos que adquirira
ao arrematar o imóvel no leilão extrajudicial e que foi gravado com ônus
real no CRI, após a consolidação de sua posse. Ao final, requereu que fosse
negado provimento ao recurso e mantida a r. decisão agravada.
Este é o breve relatório.
A ação de imissão na posse, consoante a boa definição de Nelson Nery Júnior
e Rosa Maria de Andrade Nery, conceitua-se como:
"Ação real de quem tenha título legítimo para imitir-se na posse de bem -
decorrência do exercício do direito de sequela do direito real - para quem,
sendo proprietário, ainda não obteve a posse da coisa" (Código Civil
comentado. 5. ed. São Paulo: RT, 2007, p. 849).
Portanto, a imissão na posse baseia-se em que detenha o domínio da coisa,
sem nunca haver exercido a posse. Possui como requisitos a existência de
título de propriedade e o fato de nunca haver o proprietário gozado ou
fruído da posse. Segue pelo rito comum, encontrando guarida no art. 1.228 do
Código Civil de 2002.
Igualmente, para a concessão da antecipação de tutela, como se caracteriza o
pleito liminar principal agravado, o art. 273 do Codex Processual Civil
exige a prova inequívoca das alegações do autor, bem como a verossimilhança
da alegação expendida, cumulando-a com o fundado receio de dano irreparável
ou de difícil reparação ou o abuso de direito de defesa ou manifesto
propósito protelatório do réu.
Na lição de Luiz Guilherme Marinoni:
"A técnica antecipatória visa apenas distribuir o ônus do tempo do processo.
É preciso, portanto, que os operadores do direito compreendam a importância
do novo instituto e o usem de forma adequada. Não há razão para timidez no
uso da tutela antecipatória, pois o remédio surgiu para eliminar um mal que
já está instalado. É necessário que o juiz compreenda que não pode haver
efetividade sem riscos.
A tutela antecipatória permite perceber que não é só a ação (o agir, a
antecipação) que pode causar prejuízo, mas também a omissão, como bem define
a célebre obra de Calamandrei, sistematizando as providências cautelares" (A
reforma do CPC e a efetividade do Processo. Boletim Informativo Bonijuris,
nº 34, p. 2.910-2.914, de 10 de dezembro 1995).
A prova inequívoca, a meu sentir e ver, é aquela translúcida, evidente, a
qual apresenta grau de convencimento tal que seja até mesmo dificultoso
levantar-se dúvida razoável, equivalendo, em última análise, a
verossimilhança da alegação, mormente no tocante ao direito subjetivo que a
parte queira preservar.
Ainda na lição de Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart:
"A verossimilhança a ser exigida pelo juiz, contudo, deve considerar: (I) o
valor do bem jurídico ameaçado, (II) a dificuldade de o autor provar sua
alegação, (III) a credibilidade da alegação, de acordo com as regras de
experiência, e (IV) a própria urgência descrita. Quando se fala em
antecipação da tutela, pensa-se em uma tutela que deve ser prestada em tempo
inferior àquele que será necessário para o término do procedimento"
(Processo de conhecimento. 6. ed. São Paulo: RT, 2007, p. 209).
Compulsando os autos, percebo que o agravado é adquirente do bem imóvel
localizado na zona rural do Município de Cláudio - MG, tendo adquirido a
propriedade do bem em leilão extrajudicial, já havendo registrado no CRI,
após a consolidação da propriedade, nos termos da Lei 9.514, de 1997.
Conforme comprovam os documentos de f. 154/155-TJ, consubstanciando-se a
prova inequívoca e a verossimilhança das alegações exigidas pelo art. 273 do
CPC.
Apesar de alegar o agravante que o imóvel objeto da demanda foi adquirido de
forma ilegal e sem obediência aos ditames legais relativos à notificação
para leilões, a meu ver e sentir, não merece acolhida sua alegação, pois
foram jungidos aos autos documentos comprobatórios do domínio do imóvel por
parte do agravado. Não obstante haver a exibição em f. 45/47 do "contrato
particular de compromisso de compra e venda", não figura a "promitente
vendedora", Sra. Carla Serafim de Oliveira, como proprietária em qualquer
dos registros e averbações constantes do registro pertinente ao imóvel
acostado em f. 18/21.
Não há que falar em justo título oponível à propriedade do agravado se a
posse foi adquirida de alguém que manifestamente nunca deteve a propriedade.
Outrossim, não jungiram os agravantes qualquer prova de que realizaram
benfeitorias ao imóvel capazes de embasar sua alegação de direito de
retenção.
O fundado receio de dano irreparável ao agravado é notório visto que a
persistência da posse dos agravantes sobre bem imóvel de sua manifesta
propriedade lhe causa prejuízos, os quais lhe serão de difícil ou impossível
indenização.
Em verdade, os agravantes adquiriram o imóvel em virtude de contrato de
alienação fiduciária firmado com o Rodobens Administradora de Consórcios
Ltda., tornando-se inadimplentes. Daí o imóvel foi levado a leilão
extrajudicial nos termos do art. 27 e seguintes da Lei nº 9.514, de 20 de
novembro de 1997, sendo arrematado pelo ora agravado, que pretende imitir-se
na posse.
Apesar de alegar que não foi intimado do leilão extrajudicial, há, nas f.
148/150, cópias dos editais publicados em jornal de grande circulação, sendo
presumível a sua intimação. Igualmente, a propositura de ação revisional,
por si só, não tem o condão de suspender os atos executivos previstos na lei
que regulou a alienação fiduciária de bem imóvel. Os agravantes sequer
demonstraram a obtenção de liminar na ação revisional que impedisse a
alienação extrajudicial do imóvel.
Assim, com a a devida vênia, há de ser negado provimento ao presente agravo.
Este é o entendimento de nosso Tribunal, verbi gratia:
"Imissão de posse - Imóvel objeto de financiamento pelo SFH - Adjudicação
pelo agente financeiro - Alienação a terceiro - Ação de imissão de posse -
Antecipação de tutela. - Adjudicado o imóvel objeto de financiamento pelo
agente financeiro e alienado a terceiro, tem este legitimidade para a
propositura de ação de imissão de posse, que tem fundamento na propriedade.
É admissível, na ação de imissão de posse, o deferimento de antecipação de
tutela para a imediata imissão do autor na posse do imóvel adquirido junto
ao agente financeiro, presentes os requisitos do art. 273 do CPC" (Autos nº
1.0024.07.594805-9/001 - Rel. Domingos Coelho).
"Imissão de posse - Imóvel objeto de financiamento pelo SFH - Adjudicação
pelo agente financeiro - Alienação a terceiro - Ação de imissão de posse -
Antecipação de tutela. - Adjudicado o imóvel objeto de financiamento pelo
agente financeiro, e alienado a terceiro, tem este legitimidade para a
propositura de ação de imissão de posse, que tem fundamento na propriedade.
É admissível, na ação de imissão de posse, o deferimento de antecipação de
tutela para a imediata imissão do autor na posse do imóvel adquirido junto
ao agente financeiro, presentes os requisitos do art. 273 do CPC" (Autos nº
1.0024.07.770885-7/001 - Rel. Antônio de Pádua).
Ex positis, conheço do agravo de instrumento e lhe nego provimento para
manter o r. decisum do Juízo singular.
Custas, ex lege.
Votaram de acordo com o Relator os Desembargadores Alberto Aluízio Pacheco
de Andrade e Pereira da Silva.
Súmula - NEGARAM PROVIMENTO. |