APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTO - INFORMAÇÃO DE ENDEREÇO DE
EMITENTE DE CHEQUE - SIGILO BANCÁRIO - INAPLICAÇÃO
- O beneficiário do cheque, seu mandatário ou o portador, este quando não
exigida a identificação, tem direito de ser informado pela instituição
bancária sobre o endereço do emitente, a teor do que dispõe a Circular nº
2.989/2000 do Banco Central (art. 4º).
Apelação Cível n° 1.0145.09.529462-8/001 - Comarca de Juiz de Fora -
Apelante: Unibanco União de Bancos Brasileiros S.A. - Apelante adesivo:
Paulo Alexandre - Apelados: Paulo Alexandre, Unibanco União de Bancos
Brasileiros S.A. - Relator: Des. Luiz Carlos Gomes da Mata
A C Ó R D Ã O
Vistos etc., acorda, em Turma, a 13ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do
Estado de Minas Gerais, sob a Presidência da Desembargadora Cláudia Maia,
incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos
julgamentos e das notas taquigráficas, em rejeitar preliminares e dar
parcial provimento à apelação principal, à unanimidade, e não conhecer do
recurso adesivo, vencido o Segundo Vogal.
Belo Horizonte, 8 de abril de 2010. - Luiz Carlos Gomes da Mata - Relator.
N O T A S T A Q U I G R Á F I C A S
DES. LUIZ CARLOS GOMES DA MATA - Trata-se de recurso de apelação contra
sentença que julgou procedente ação de exibição de documento formulada pelo
apelado em face do apelante.
Na apelação principal são suscitadas as seguintes preliminares:
ilegitimidade passiva, ilegitimidade ativa e impossibilidade jurídica do
pedido.
No mérito, o apelante principal afirma que as regras do sigilo fiscal
impedem a apresentação dos documentos, de forma a expor o seu correntista;
diz que a sentença está omissa, pois não impõe penalidade para o caso de
descumprimento da ordem; pugna para que os honorários de sucumbência sejam
arbitrados na forma do § 4º do art. 20 do CPC.
Versa o apelo adesivo sobre o quantum dos honorários advocatícios, arbitrado
em 10% (dez por cento) do valor total.
Contrarrazões ao apelo principal às f. 58/69, pugnando pela manutenção da
sentença.
Contrarrazões ao apelo adesivo às f. 70/78, suscitando preliminar de não
conhecimento, por ausência de interesse recursal, e, no mérito, o
desprovimento do recurso.
Preparo da apelação principal à f. 56; o recurso adesivo não foi preparado,
sustentando-se na gratuidade deferida ao autor.
Esse é o relatório.
Decido.
Apelação principal.
Conheço da apelação, visto que própria, tempestiva e devidamente preparada.
Sustenta o apelante que não tem legitimidade para figurar no polo passivo da
ação cautelar de exibição de documento, tendo em vista que não teve qualquer
participação no negócio entre o autor e o emitente do cheque noticiado na
inicial.
Ora, na ação cautelar de exibição de documento figura no polo passivo quem o
detém. Como o cheque de f. 10 é de conta aberta em estabelecimento bancário
do apelante, evidentemente ele dispõe dos cadastros do emitente, de forma
que é capaz de atender à pretensão do autor.
De acordo com a doutrina de Humberto Theodoro Júnior (Curso de direito
processual civil. 18. ed. Rio de Janeiro: Forense, v. 1, p. 56), para a
definição da legitimidade ad causam, deve-se observar, segundo Arruda Alvim,
"[...] estará legitimado o autor quando for o possível titular do direito
pretendido, ao passo que a legitimidade do réu decorre do fato de ser ele a
pessoa indicada, em sendo procedente a ação, a suportar os efeitos oriundos
da sentença".
Assim, rejeito a preliminar de ilegitimidade passiva.
O apelante afirma, ainda, que o apelado não tem legitimidade ativa para
pedir a exibição de documentos bancários, porque a quebra de sigilo somente
compete a autoridades.
A legitimidade ativa decorre da titularidade do direito pretendido, que, no
caso, é a informação sobre o endereço do correntista para viabilizar a
cobrança de cheque sem fundos.
Rejeito a preliminar de ilegitimidade ativa.
Diz o apelante que o pedido é juridicamente impossível, porque não estaria
previsto no ordenamento jurídico.
Como a ação cautelar de exibição de documentos está regulada no Código de
Processo Civil (arts. 844 e 845), e até mesmo existem instruções do Banco
Central para garantir as informações pretendidas ao beneficiário de cheque
(art. 4º da Circular nº 2.989), não há de se falar em impossibilidade
jurídica do pedido.
Rejeito esta última preliminar.
DES.ª CLÁUDIA MAIA - De acordo.
DES. NICOLAU MASSELLI - De acordo.
DES. LUIZ CARLOS GOMES DA MATA - Passo ao exame do mérito.
O sigilo bancário não é empecilho à informação do endereço do emitente de
cheque, pois tal informação não está protegida pela legislação que rege a
matéria.
Tanto é verdade que o próprio Banco Central garante tal informação ao
beneficiário do cheque, conforme disposto no art. 4º da Circular nº
2.989/2000, que tem o seguinte teor:
"Art. 4º Para efeito do disposto no art. 25 do Regulamento anexo à Resolução
n. 1.631, de 1989, com a redação dada pela Resolução n. 1.682, de 1990, as
instituições financeiras depositárias de recursos em contas de depósitos à
vista devem prestar as seguintes informações, no caso de cheque devolvido
pelos motivos 11 a 14, 21, 22 e 31, mediante solicitação formal do
interessado e observadas as demais condições previstas neste artigo:
I - nome completo e endereços residencial e comercial do emitente, conforme
constarem da ficha-proposta;
II - o motivo alegado para a sustação ou revogação, no caso de cheque
devolvido pelo motivo 21.
Parágrafo 1º As informações referidas neste artigo somente podem ser
prestadas:
I - ao beneficiário, caso esteja identificado no cheque, ou a mandatário
legalmente constituído;
II - ao portador, em se tratando de cheque para o qual a legislação em vigor
não exija identificação do beneficiário e que não contenha referida
identificação''.
A jurisprudência deste egrégio Tribunal reconhece tal direito de informação,
v.g.:
"Apelação cível. Exibição de documento movida contra banco sacado. Cheque
devolvido. Pedido de informação acerca do endereço do emitente. Interesse
processual configurado. Reconhecido o dever da instituição financeira de
informar. Circular 2.989/2000 do Bacen. Não aplicação da Lei Complementar
105/01 ao caso. Inocorrência de ofensa ao sigilo bancário. Recurso provido.
Aplicável ao caso em tela a Circular nº 2.989/2000 do Banco Central do
Brasil, a qual determina a obrigação das instituições financeiras de
informar aos portadores de cheques devolvidos o endereço do correntista, de
forma a lhes assegurar os direitos creditícios. Não há que se falar na
aplicação da Lei Complementar 105/01, pois não se trata de exposição das
operações bancárias da emitente, estando assegurado o sigilo bancário da
mesma'' (TJMG - AC nº 1.0145.06.343960-1/001 - Rel.ª Des.ª Hilda Teixeira da
Costa - DJ de 26.05.2009).
Nada a prover nesse ponto.
A pretensão de que seja aplicada a pena prevista no art. 359 do Código de
Processo Civil é de todo desarrazoada, pois o caso será de busca e
apreensão, sem prejuízo da apuração da ocorrência de tipo penal.
A propósito do arbitramento dos honorários de sucumbência, que o apelante
sustenta devam ser fixados de acordo com o § 4º do art. 20 do CPC, tem razão
o apelante.
Dada a simplicidade da causa e observados os parâmetros traçados nas alíneas
do art. 20, § 3º, do CPC, arbitro os honorários advocatícios em R$ 500,00
(quinhentos reais).
Apelação adesiva.
Diante da falta de preparo, não conheço do apelo adesivo.
É certo que o advogado pode manejar o recurso de apelação em nome de seu
constituinte ou em nome próprio, a fim de buscar proteção aos seus
interesses, quando decorrentes da decisão. Entretanto, em se tratando de
recurso de apelação unicamente com base em interesse recursal do advogado,
não se justifica deixar de recolher o preparo recursal, sendo incabível o
manejo do apelo utilizando-se da gratuidade de justiça concedida ao seu
constituinte.
A gratuidade de justiça é um direito personalíssimo conferido a quem
preenche os requisitos previstos em lei, sendo incabível o seu
aproveitamento por terceiros. Logo, sendo o interesse recursal unicamente do
advogado, a falta de recolhimento do preparo somente seria possível se o
referido causídico comprovasse a sua qualidade de necessitado, o que
definitivamente não ocorreu no presente feito.
A jurisprudência deste Tribunal aponta em tal sentido, inclusive em julgado
oriundo desta mesma Câmara:
"Ação de exibição de documentos. Primeira apelação. Honorários de
sucumbência. Majoração. Interesse exclusivo do advogado. Assistência
judiciária concedida à parte. Não extensão ao causídico. Deserção. Segunda
apelação. Microfilmagem de cheque devolvido sem fundos. Dever de exibição da
instituição financeira. Recusa ilegítima. Sentença mantida.
I - O benefício da assistência judiciária trata de favor personalíssimo
concedido apenas às partes que o advogado recorrente representava, de modo
que não pode interpor recurso, valendo-se da benesse.
II - [...] As instituições financeiras têm o dever de microfilmar todos os
títulos entregues em sua câmara de compensação, de acordo com os preceitos
da Resolução 913/84, do Bacen, arquivando-os pelo prazo prescricional
disposto no art. 177 do Código Civil de 1916, qual seja 20 (vinte) anos'' (TJMG
- Apelação Cível nº 2.0000.00.442.539-4/000 - Rel. Des. Otávio Portes - j.
em 23.04.2004) (Processo nº 1.0145.07.433276-1/001 - Rel. Des. Alberto
Henrique).
Ainda de outra Câmara:
"Ação de cobrança. Caderneta de poupança. Expurgos inflacionários.
Assistência judiciária. Não extensão aos advogados do beneficiado.
Cerceamento de defesa. Inocorrência. Legitimidade de partes. Análise
abstrata. Pertinência. Inocorrência de prescrição. Planos Bresser e Verão.
Manutenção da sentença.
- O benefício da assistência judiciária é direito que não se transfere aos
advogados representantes da parte beneficiada.
- Não se beneficiando da justiça gratuita, deve o apelante proceder ao
recolhimento das custas recursais no momento oportuno.
- Tendo as próprias partes requerido o julgamento antecipado da lide, não se
pode, após a prolação da sentença, alegar cerceamento de defesa.
- Havendo pertinência subjetiva das partes para a causa, sob um prisma
abstrato, verifica-se a legitimidade para figurarem na relação processual.
Por conseguinte, se, em uma análise abstrata, verifica-se que a pretensão
foi deduzida pelo suposto titular do direito em face de quem supostamente
está a violá-lo, presente está a legitimidade de partes.
- A não atualização monetária dos valores vertidos à caderneta de poupança
implica enriquecimento sem causa da instituição financeira, motivo pelo qual
é possível a revisão, pelo Judiciário, das cláusulas que estipulam os
índices de correção monetária.
- Consoante jurisprudência pacificada no STJ, são devidos, para fins de
correção monetária, os expurgos de 26,06% em julho de 1987 e de 42,72% em
janeiro de 1989.
- Nos resgates dos depósitos de caderneta de poupança, devem ser adotados
índices de atualização monetária consentâneos com a realidade inflacionária
do País, com inclusão daqueles que foram expurgados pelos diversos planos
econômicos do governo federal, pois, apenas assim, preservar-se-á o valor
aquisitivo da moeda.
- A fim de atualizar o título executivo consubstanciado na sentença,
aplica-se o índice de correção monetária da tabela da Corregedoria de
Justiça'' (Processo nº 1.0694.07.037910-2/001 - TJMG - Rel. Des. Elpídio
Donizetti).
E também do STJ:
"Processual civil. Recurso especial. Direito autônomo de execução de
honorários advocatícios. Advogado que atua em nome próprio. Assistência
judiciária gratuita. Incomunicabilidade. Deserção.
1. Os honorários advocatícios reconhecidos em decisão transitada em julgado
são direito do advogado, caracterizando-se por sua autonomia em relação ao
direito de propriedade.
2. O benefício da assistência judiciária gratuita é direito de natureza
personalíssima e transferível apenas aos herdeiros que continuarem na
demanda e necessitarem dos favores legais (art. 10 da Lei 1.060/50).
Sujeita-se à impugnação e a pedidos de revogação pela parte contrária,
cabendo ao juiz da causa resolver sobre a existência ou sobre o
desaparecimento dos requisitos para a sua concessão.
3. As isenções de taxas judiciárias, selos, emolumentos e custas devidos aos
juízes, órgãos do Ministério Público e serventuários da justiça, previstos
no art. 3º da Lei 1.060/50 são restritas ao beneficiário da assistência
judiciária, não sendo possível o seu aproveitamento pelo profissional do
direito que o patrocina.
4. Hipótese em que o advogado, procurador da parte que goza do benefício da
Lei 1.060/50, recorrendo em nome próprio para defender seu direito autônomo
previsto no art. 23 da Lei 8.906/94, deixou de recolher o porte de remessa e
retorno, incorrendo na deserção do recurso especial.
5. Recurso especial não conhecido'' (REsp 903400/SP - Rel.ª Ministra Eliana
Calmon - Segunda Turma - j. em 03.06.2008 - DJe de 06.08.2008).
Outro julgado do STJ:
"Assistência judiciária. Benefício individual. Vara de Assistência
Judiciária. Preparo. Deserção. A concessão do beneficio da gratuidade é
individual, e não se estende às demais partes que não fazem jus a gratuidade
nem a requereram, ainda que o feito tramite em vara que, de acordo com a
organização judiciária local, tem competência para processar os feitos com
assistência. Falta de preparo do recurso. Deserção. Art. 10 da Lei 1.060/50.
Art. 511 do CPC. Recurso não conhecido" (STJ - REsp 140731/GO - Rel.
Ministro Ruy Rosado de Aguiar - Quarta Turma - j. em 18.12.1997 - DJ de
16.03.1998, p. 149).
Feitas tais considerações, não conheço do recurso adesivo, rejeito as
preliminares e dou parcial provimento ao apelo principal, apenas para
arbitrar os honorários advocatícios de sucumbência no valor certo de R$
500,00 (quinhentos reais), que deverá ser corrigido a partir da data de
encerramento do julgamento deste recurso.
Custas recursais, pelo apelante principal e pelo procurador apelante
adesivo, visto ter manejado o recurso em interesse exclusivamente próprio.
DES.ª CLÁUDIA MAIA - Estou acompanhando o Relator.
DES. NICOLAU MASSELLI - Peço licença ao eminente Relator para divergir no
que tange à aplicação da pena de deserção ao recurso adesivo.
Isso porque entendo que se deve oportunizar ao apelante adesivo a
possibilidade de realização do preparo, sendo abusiva a aplicação
incontinênti da pena de deserção.
O Superior Tribunal de Justiça já se pronunciou nesse sentido:
"STJ-188945: Afirmada a necessidade de justiça gratuita, seja em que momento
for, não pode o órgão julgador declarar deserto o recurso sem se pronunciar
sobre o pedido de assistência judiciária.
Caso indeferida a gratuidade, deve-se abrir ao requerente oportunidade para
o preparo. Agravo regimental improvido'' (Agravo Regimental no Agravo de
Instrumento nº 622403/RJ (2004/0103781-0 - 6ª Turma do STJ - Rel. Min.
Nilson Naves - j. em 31.08.2005 - unânime - DJ de 06.02.2006).
Assim, tenho comigo que os autos devem ser baixados em diligência, a fim de
que seja concedido prazo ao apelante adesivo, para a realização do preparo.
Recurso principal.
De acordo.
Participaram do julgamento os Desembargadores Cláudia Maia e Nicolau
Masselli.
Súmula - REJEITARAM PRELIMINARES E DERAM PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO
PRINCIPAL, À UNANIMIDADE, E NÃO CONHECERAM DO RECURSO ADESIVO, VENCIDO O
SEGUNDO VOGAL.
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