Ação Declaratória - Inexigibilidade obrigação - Anulação título de Crédito - Apontamento por indicação - Protesto - Envio para aceite ou devolução - Necessidade

- A autorização dada pelo art. 21, § 3º, da Lei nº 9.492/97 para o apontamento de duplicata para protesto, por indicação, tem como pré-requisito o envio do título para aceite e devolução, sem a devolução no prazo legal.

- Antes do envio da duplicata para aceite ou devolução, o apontamento do título para protesto, por indicação, prejudica o exercício do direito, pelo sacado, de manifestar justa recusa de aceitação do título, conforme lhe garantem os arts. 7º e 8º da Lei nº 5.474/68.

Apelação Cível n° 1.0319.04.015758-2/001 - Comarca de Itabirito - Apelante: Cia. Itabirito Industrial Fiação e Tecelagem de Algodão - Apelada: Teg Indústria Gráfica Ltda. - Relator: Des. Luiz Carlos Gomes da Mata

A C Ó R D Ã O

Vistos etc., acorda, em Turma, a 13ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, em dar parcial provimento ao recurso.

Belo Horizonte, 19 de março de 2009. - Luiz Carlos Gomes da Mata - Relator.

N O T A S T A Q U I G R Á F I C A S

DES. LUIZ CARLOS GOMES DA MATA - Trata-se de recurso de apelação interposto por Cia. Itabirito Industrial Fiação e Tecelagem de Algodão contra sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da Vara Única de Itabirito, que, em ação declaratória de inexigibilidade de obrigação cumulada com pedido de anulação de título de crédito, julgou improcedentes os pedidos ao entendimento de que a causa debendi do título restou demonstrada pela nota fiscal juntada aos autos, conforme recibo de entrega das mercadorias juntado aos autos, que não foi impugnado, dando por irrelevante a questão da inexistência física do título, já que reputa legítimo o apontamento para protesto por indicação, mediante a remessa de dados.

Alega a apelante que não houve entre as partes relação negocial no valor do título protestado, no qual se deu uma indevida e ilegal inclusão de juros e encargos estranhos à duplicata, ou seja, ao valor da transação comercial ocorrida entre as partes; aduz, ainda, que, em não havendo aceite, a discrepância entre o seu valor e aquele que foi acordado é causa de ilegalidade do apontamento para protesto; questiona a falta de apresentação do título para aceite ou devolução, sugerindo que nem mesmo a emissão do título tenha ocorrido, mas sim uma simples emissão de boleto bancário.

Pede a apelante, ainda, que sejam revistos os honorários advocatícios arbitrados, ao argumento de que ao caso deve ser aplicado o § 3º do art. 20 do CPC, e não o § 4º, como fez o Juiz a quo.

Não foram oferecidas contrarrazões ao recurso (certidão de f. 61-v.).

Custas recusais recolhidas, conforme comprovante de f. 60.

Este é o relatório.

Decido.

Conheço do recurso de apelação interposto, porquanto próprio e tempestivo.

Na inicial da ação declaratória de inexigibilidade da obrigação, que foi cumulada com pedido de anulação do título de crédito utilizado no apontamento para protesto, a ora apelante sustentou ter sido "a duplicata indevidamente apontada desprovida de aceite" e que "a ré não apresentou o referido título para aceite ou devolução".

Na contestação (f. 19/21), não houve contrariedade a tal afirmação, razão pela qual restou incontroverso que não houve a apresentação do título para aceite ou devolução. É que "a falta de impugnação do fato pelo réu, na contestação, o torna incontroverso, com as exceções estatuídas no art. 302 (cf. RTJ 93/162)" (NEGRÃO, Theotônio; GOUVÊA, José Roberto F. Código de Processo Civil e legislação em vigor. 38. ed. atual. até 16 de fevereiro de 2006. São Paulo: Saraiva, 2006).

Assim, fixada tal premissa fática, cabe analisar a possibilidade de apontamento para protesto do título de crédito por indicação, tal como procedido pela apelada, a teor do documento de f. 12.

A questão tem suscitado controvérsia neste egrégio Tribunal, havendo inúmeros julgados admitindo, tal como o fez o MM. Juiz a quo, que seja tirado o protesto do título de crédito por indicação.

Entretanto, filio-me à corrente jurisprudencial que, não obstante acate o protesto por indicação, exige que sejam cumpridas as disposições do art. 13, § 1º, da Lei nº 5.474/68, e do art. 21, § 3º, da Lei nº 9.492/1997, mediante a prévia remessa do título de crédito para aceite ou devolução.

Colaciono, a propósito, os seguintes precedentes deste egrégio Tribunal, verbis:

``Ementa: Ação declaratória de nulidade de título. Protesto por indicação. Boleto bancário. Ausência de remessa para aceite. Negócio jurídico originário inexistente. - A duplicata é título de crédito vinculado à existência de um negócio subjacente: uma compra e venda mercantil, ou uma prestação de serviços, devendo ser anulada se não tiver fundamento em negócio jurídico. - Os pressupostos que legitimam o protesto por indicação são: a remessa do título ao devedor para aceite e a não devolução do mesmo no prazo legal, a teor do disposto no art. 21, § 3º, da Lei 9.492/97 e art. 13, § 1º, da Lei 5.474/68. - O simples boleto bancário não enseja apontamento de protesto, por não estar previsto na legislação como título representativo de dívida, máxime quando não comprovado o lastro em nota fiscal correspondente e a remessa do título para aceite'' (TJMG - 13ª C. Cível - Apelação Cível n° 1.0040.06.044830-1/001 - Comarca de Araxá - Apelante: Agros Com. Ltda. - Apelado: Banco Bradesco S.A., Scorsolini Com Combustíveis Ltda. - Relatora: Des.ª Cláudia Maia - DJ de 19.01.2009).

``Ementa: Duplicata - Inovação recursal - Protesto por indicação - Ausência de prova da retenção - Protesto indevido. - Nos termos do art. 517 do CPC, é admitida a inovação de fatos não articulados nos autos, desde que haja força maior. Como o apelante não provou a força maior, os fatos novos alegados nas razões recursais não devem ser apreciados, por se tratar de inovação em sede recursal. - Para que a duplicata seja protestada por indicação, deve haver prova de que as duplicatas foram retidas pelo comprador, nos termos do art. 13, § 1º, da Lei 5.474/68. Como as duplicatas foram juntadas nos autos, não havendo prova de que as mesmas foram enviadas para o aceite, o protesto é nulo, devido ao vício no procedimento. - O comprador possui o direito à recusa lícita do aceite, conforme preceitua o art. 8º da Lei 5.474/68. - Os boletos bancários não suprem o dever da remessa das duplicatas para o aceite, conforme art.13, § 1º, e art. 15, II, c, ambos da Lei 5.474/68'' (TJMG - 15ª C. Cível - Apelação Cível n° 1.0027.06.084085-0/001 - Comarca de Betim - Apelante: Plasmolde Ltda. ME (microempresa) - Apelada: Resinet Importação Exportação Ltda. - Rel. Des. Tibúrcio Marques - DJ de 18.06.2008).

``Ementa: Falência - Protesto por indicação - Ato formal e solene - Requisitos - Observância rigorosa. - Destinando-se a consubstanciar pedido de falência por impontualidade, deve o protesto ser tirado com a mais rigorosa observância dos seus requisitos legais, admitindo-se que se faça por indicação somente quando a duplicata for remetida ao sacado para aceite ou pagamento e não restituída, de tal sorte que, não demonstrada a retenção do título pelo devedor, afigura-se o protesto por indicação inapto para caracterizar a impontualidade que viabiliza o pedido de falência'' (TJMG - 8ª C. Cível - Apelação Cível n° 1.0024.03.149293-7/001 - Comarca de Belo Horizonte - Apelante: Pom Pom Produtos Higiênicos Ltda. - Apelada: Brio Distribuidora Importação Export Ltda. - Relator: Des. Duarte de Paula - DJ de 15.03.2006).

No mesmo sentido está a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, v.g. in:

``Direito comercial. Duplicata mercantil. Protesto por indicação de boletos bancários. Inadmissibilidade.

I - A retenção da duplicata remetida para aceite é conditio sine qua non exigida pelo art. 13, § 1º, da Lei nº 5.474/68 a fim de que haja protesto por indicação, não sendo admissível protesto por indicação de boletos bancários.

II - Recurso não conhecido'' (STJ - 4ª Turma - Recurso Especial 2006/0055256-4 - Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro - DJ de 17.09.2007 p. 295)

Observo que a autorização dada pela Lei nº 9.492/97 de fato condiciona o apontamento de título para protesto, por indicação, ao cumprimento de certos requisitos, entre os quais o envio para aceite e devolução, sem a devolução no prazo legal, como se pode ver in verbis:

"Art. 21. O protesto será tirado por falta de pagamento, de aceite ou de devolução. [...]

§ 3º Quando o sacado retiver a letra de câmbio ou a duplicata enviada para aceite e não proceder à devolução dentro do prazo legal, o protesto poderá ser baseado na segunda via da letra de câmbio ou nas indicações da duplicata, que se limitarão a conter os mesmos requisitos lançados pelo sacador ao tempo da emissão da duplicata, vedada a exigência de qualquer formalidade não prevista na Lei que regula a emissão e circulação das duplicatas".

Sem a observância de tais requisitos, o apontamento para protesto, antes do envio da duplicata para aceite ou devolução, prejudica o exercício do direito, pelo sacado, de manifestar justa recusa de aceitação do título, conforme lhe garantem os artigos 7º e 8º, da Lei n.º 5.474/68.

No mesmo passo, colho da doutrina o ensinamento de Ermínio Amarildo Darold, que aborda a questão com ponderações deveras pertinentes, como se pode ver in verbis:

"A lei somente autoriza o protesto por indicação de duplicata quando remetida ao sacado para aceite e este não a devolve. Logo, para que possa o requerente do ato moratório valer-se da hipótese excepcionalíssima do protesto por indicação, tem de demonstrar que existe uma duplicata da qual é portador e que ela não se encontra sobre sua posse porque, remetida ao sacado para aceite, não obteve a devolução. Sem a prova de tais requisitos impossível o protesto por indicação [...] razão pela qual os famigerados boletos bancários, que prosseguem sem qualquer status de título de crédito ou de documento representativo de dívida, não podem, de forma alguma, serem admitidos a protesto" (Darold, Ermínio Amarildo - Protesto Cambial - Duplicatas x Borderô. Juruá: Curitiba, 1998, p. 54/55).

Destarte, não tenho como legítimo, no caso, o apontamento para protesto por indicação, uma vez que restou incontroverso não ter sido o título enviado para aceite ou devolução, conforme determina o art. 6º da Lei nº 5.474/68.

Noto, entretanto, que não há nos autos notícia de que o protesto tenha sido lavrado, razão pela qual entendo ser o caso de reforma parcial da sentença para deferir, em parte, o pedido feito na inicial, para declarar a inexigibilidade da indicação de título feita para fins de protesto, determinando que não seja o ato realizado pelo Sr. Tabelião de Protestos, ou que seja cancelado caso já tenha sido praticado.

Quanto ao pedido de declaração de inexigibilidade da obrigação, não vejo como acolhê-la, visto que a prova dos autos foi no sentido de que de fato ocorreu o negócio entre as partes, com o recebimento das mercadorias objeto da compra e venda, conforme nota fiscal de f. 30.

A propósito, o recurso trata apenas do excesso de valor do apontamento feito para protesto, questão que fica prejudicada pelo acolhimento do pedido de anulação do referido instrumento de indicação.

O último tema recursal versa sobre o arbitramento de honorários, que será resolvido na redistribuição da sucumbência, tendo em vista o resultado da lide decorrente do provimento parcial da apelação.

Entendo que está correta a aplicação do art. 20, § 4º, do CPC, visto que não se trata de sentença condenatória a ensejar a aplicação do § 3º do mesmo dispositivo.

Entretanto, não vislumbro no caso um grau de complexidade ou qualquer outra circunstância que justifique o arbitramento dos honorários em valor quase coincidente com o da obrigação em questão, razão pela qual os reduzo para R$ 2.000,00 (dois mil reais), que entendo suficiente para remunerar a boa atuação dos profissionais envolvidos.

Diante da sucumbência recíproca, deverá a autora da ação, ora apelante, arcar com 40% (quarenta por cento) das custas e dos honorários advocatícios arbitrados, cabendo à ré, ora apelada, arcar com os restantes 60% (sessenta por cento) de cada uma das referidas verbas.

Custas recursais, pelas partes, na mesma proporção.

Feitas tais considerações, dou provimento parcial ao recurso e reformo parcialmente a sentença, para, deferindo em parte o pedido feito na inicial, declarar a ilegalidade da indicação de título feita para fins de protesto, determinar que não seja o ato realizado pelo Sr. Tabelião de Protestos, ou que seja cancelado, caso já tenha sido praticado, e redistribuir os ônus da sucumbência, nos termos da fundamentação deste voto.

Votaram de acordo com o Relator os Desembargadores Francisco Kupidlowski e Cláudia Maia.

Súmula - DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO.


Fonte: Diário do Judiciário Eletrônico do TJMG - 20/11/2009.

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