AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DANOS AO MEIO AMBIENTE - VEGETAÇÃO DE PRESERVAÇÃO LEGAL
- DEVER DE REPARAÇÃO IN NATURA - IMPOSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO COM
INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL COLETIVO
- A preservação da fauna e flora e ainda dos recursos hídricos é de
interesse de toda coletividade e da própria humanidade e deve ser
fiscalizada pelo Ministério Público, sem prejuízo da atuação da Polícia
Militar e do Instituto Estadual de Florestas.
- O dever de indenizar dano ambiental à vegetação decorre do liame entre a
efetivação de desmatamento em determinado local e o comprovado prejuízo
sofrido pelo ecossistema daquela área.
- Nos termos do art. 3º da Lei nº 7.347/85, a ação civil pública não pode
ter por objeto a condenação cumulativa de cumprimento de obrigação de fazer
ou não fazer e indenização em pecúnia, visto que a recomposição in natura
exclui o prejuízo sofrido com o dano.
Apelação Cível n° 1.0713.07.074297-6/001 - Comarca de Viçosa - Apelante:
Ministério Público do Estado de Minas Gerais - Apelado: Vale Rio Sul
Mineradora Ltda. - Relatora: Des.ª Vanessa Verdolim Hudson Andrade
A C Ó R D Ã O
Vistos etc., acorda, em Turma, a 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do
Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador Eduardo Andrade,
incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos
julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, em negar
provimento.
Belo Horizonte, 23 de março de 2010. - Vanessa Verdolim Hudson Andrade -
Relatora.
N O T A S T A Q U I G R Á F I C A S
DES.ª VANESSA VERDOLIM HUDSON ANDRADE - Trata-se de recurso de apelação
apresentado às f. 437/443 pelo Ministério Público de Minas Gerais, nos autos
da ação civil pública movida contra Vale Rio Sul Mineradora Ltda., visando à
reforma da sentença de f. 425/431, que julgou procedente em parte os pedidos
iniciais, para condenar a requerida a promover a reparação ambiental
necessária à reconstituição do local onde exerceu atividade extrativa, sob
pena de multa diária equivalente a R$ 800,00.
Em suas razões recursais, alega o apelante que, conforme autorizado pela
Súmula 37 do STJ, os danos materiais e patrimoniais podem ser cumulados.
Ressalta que, no caso em tela, os danos ambientais nas proximidades de curso
d'água, com construção de barragens para atividades de mineração, além de
terem lesado o meio ambiente em si considerado, causaram um mal-estar
coletivo.
Devidamente intimado para apresentar contrarrazões, a requerida quedou-se
inerte.
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de
apelação.
Inexistindo preliminares, passo ao exame do mérito.
Como se extrai dos autos, a requerida Vale Rio Sul Mineradora Ltda. foi
autuada pelo Instituto Estadual de Florestas - IEF e pela Polícia Militar de
Minas Gerais, sendo apenada à reparação florestal necessária para a
reconstituição do local onde se exerceu atividade de extração de minério de
ferro.
O apelante discorda da improcedência do pedido de indenização pelo dano
moral ambiental.
Há que se ver, de início, que o art. 3º da Lei nº 7.347, de 24 de julho de
1985, que disciplina a ação civil pública de responsabilidade por danos
causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor
artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico (vetado), e dá
outras providências, dispõe que:
"A ação civil poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o
cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer".
Não prevê, portanto, a cumulação desses dois preceitos. É que a condenação
do cumprimento de fazer leva à recomposição do dano in natura e dispensa a
indenização, que iria constituir um bis in idem. Assim, a cumulação das duas
condenações não se harmoniza com o art. 3º da Lei 7.347/85.
Esse, inclusive, o entendimento do STJ:
"Ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente
- Lei 7.347/85 - Violação ao art. 11 - Cessação de atividade - Cominação de
multa - Imposição legal - 1. A determinação legal contida no art. 11 da Lei
7.347/85 tem o objetivo imanente de fazer valer a obrigação, uma vez que
retirada da mensagem legal a imposição de pena, é consectário lógico a
mitigação da ordem, à míngua de punição ante seu descumprimento 2. Conforme
o art. 3º da Lei nº 7.347/85, não pode a ação civil pública ter por objeto a
condenação cumulativa de cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer e
dinheiro. 3. Recurso parcialmente provido" (STJ - REsp 205153-GO - 1ª T. -
Rel. Min. Francisco Falcão - DJU de 21.08.2000 - p. 00098).
O ilustre colega Des. Geraldo Augusto corrobora:
"Conforme se sabe, em se tratando de dano ambiental, antes de qualquer
indenização pecuniária, deve o Juiz, sempre que possível dar efetividade ao
princípio de que a recuperação do meio ambiente degradado é prioridade e só
quando for absolutamente impossível a execução específica é que se deve
convolar a obrigação de recuperação/ recomposição ambiental em perdas e
danos. O dano ecológico não se satisfaz com a mera indenização; exige-se a
recomposição do bem lesado" (Ap. Cível nº 1.0024.03.971351-6/001, j. em
25.03.2008).
Ademais, é certo que o dano moral coletivo deve ser afastado. O dano moral
ofende direito personalíssimo, que não se confunde com a noção de
transindividualidade que propõe o MP.
Para o STJ:
"Processual civil. Ação civil pública. Dano ambiental. Dano moral coletivo.
Necessária vinculação do dano moral à noção de dor, de sofrimento psíquico,
de caráter individual. Incompatibilidade com a noção de transindividualidade
(indeterminabilidade do sujeito passivo e indivisibilidade da ofensa e da
reparação). Recurso especial improvido" (REsp 598281/MG, Rel. para o acórdão
Min. Teori Albino Zavascki; julgamento: 02/05/2006; publicação; fonte: DJ de
01.06.2006, p. 147).
De qualquer forma, a sentença é irrepreensível e não merece reforma. O
pedido de dano moral coletivo não merece acolhida, seja pela impossibilidade
do dano moral que transcende a pessoa do indivíduo, seja porque há, no caso,
a possibilidade de reparação ambiental.
Com tais considerações, nego provimento ao apelo, mantendo, in totum, a
sentença a quo.
Custas recursais, pelo apelado nas formas da lei.
DES. ARMANDO FREIRE - De acordo.
DES. ALBERTO VILAS BOAS - O objeto da apelação é saber se é possível, no
âmbito da ação civil pública por dano ambiental, cumular a obrigação de
fazer com a de indenizar os danos materiais e morais em razão de exploração
mineral.
No julgamento de causa similares e oriundas da comarca de Mariana, tenho
argumentado que a reparação ambiental deve ser a mais ampla possível em face
do poluidor, mesmo porque a lei civil não veda que sejam cumuladas as
obrigações de fazer e dar (STJ, REsp nº 625.249 e nº 605.323).
Mas, minha posição é isolada nesta 1ª Câmara Cível, haja vista que a maioria
do colegiado considera que a concretização da obrigação de fazer basta para
promover a reparação ambiental quando o laudo pericial assim o determina.
Reconhece-se então, com a ressalva de minha convicção pessoal, que a
sentença deve ser mantida, e, para tanto, adoto as razões de decidir da
eminente Relatora.
Com essa ressalva, nego provimento ao recurso.
Súmula - NEGARAM PROVIMENTO. |