AÇÃO DE CANCELAMENTO DE PROTESTO COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA PARCIAL
E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - PROTESTO DE DUPLICATA - DUPLICATA SEM
LASTRO - INSTITUIÇÃO FINANCEIRA - ENDOSSO TRANSLATIVO - EXCLUSÃO DA LIDE -
CULPA EXCLUSIVA DA ENDOSSATÁRIA - RECURSOS
As instituições financeiras são partes ilegítimas para figurar na ação de
cancelamento de protesto se receberam o título apenas como endosso mandato,
devendo ser excluídas da lide e extinto o processo em relação a elas. Cabe à
empresa de factoring, endossatária do título, antes de enviar o título a
protesto, certificar-se da regularidade da cártula, sob pena de responder
solidariamente com o sacador pelos danos causados ao sacado.
Apelação Cível n° 1.0024.05.661731-9/001 - Comarca de Belo Horizonte -
Apelantes: 1ª) Devax Factoring Ltda.; 2º) Banco Mercantil do Brasil S.A.;
3º) Banco Bradesco S.A. - Apelados: Devax Factoring Ltda., Banco Mercantil
do Brasil S.A., Banco Bradesco S.A., Hidrofit Ltda. - Relator: Des. Generoso
Filho
A C Ó R D Ã O
Vistos etc., acorda, em Turma, a 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do
Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos e das notas
taquigráficas, à unanimidade de votos, em negar provimento à primeira
apelação e dar provimento à segunda e terceira.
Belo Horizonte, 12 de agosto de 2008. - Generoso Filho - Relator.
N O TA S T A Q U I G R Á F I C A S
DES. GENEROSO FILHO - Conheço dos recursos porque próprios e tempestivos,
presentes os requisitos de admissibilidade previstos em lei.
Trata-se de ação de cancelamento de protesto, com pedido de tutela
antecipada parcial e pedido de indenização por danos morais que Hidrofit
Ltda. move em face de Parafusalto Comercial Ltda., Devax Factoring Ltda.,
Banco Mercantil do Brasil S.A. e Banco Bradesco S.A. em curso perante o
juízo da 19ª Vara Cível desta Comarca de Belo Horizonte.
Pela sentença de f. 126/129, ao entendimento de que tanto a empresa de
factoring como os estabelecimentos bancários requeridos, mesmo em caso de
endosso translativo, assumem os riscos pelo protesto de títulos de crédito
desprovidos de lastro, responsabilizando-se solidariamente com o suposto
credor, bem como eventuais endossatários que se descuidaram em observar a
higidez das cártulas, conforme orientação jurisprudencial que cita, condenou
o ilustre Juiz sentenciante todos os requeridos em caráter solidário a pagar
indenização que fixou em dez mil reais (R$ 10.000,00), julgando procedente o
pedido inicial e determinando o cancelamento do protesto, condenando os
requeridos a pagar custas e honorários advocatícios, que fixou em dois mil
reais (R$2.000,00), na forma do art. 20, § 3º, do CPC. Opostos embargos
declaratórios, foram rejeitados.
Dessa sentença recorrem os apelantes pelas razões seguintes:
1º apelante - Devax Factoring Ltda. (f. 140/145).
A recorrente afirma que é mera endossatária da duplicata e não emitente. E,
ao receber a mesma, cuidou de exigir da emitente endossante Parafusalto
Comercial Ltda. não só a nota fiscal emitida, mas também a confirmação da
devedora do recebimento dos serviços. Assim, se há alguém que agiu de má-fé,
é a empresa Parafusalto Comercial Ltda., que nem sequer compareceu aos autos
para defender-se, é a própria apelada que confirmou o recebimento dos
serviços. Portanto, como endossatária e terceira de boa-fé, não deve arcar
com o ônus e/ou dano causado à apelada nem pode ser condenada a arcar com
uma sentença que declara o cancelamento de um débito cuja duplicata tem
todos os requisitos preenchidos, que é legal, portanto válida. Cita
jurisprudências referentes à autonomia da cambial, diz que, como pessoa de
boa-fé, não pode sofrer prejuízo alheio a sua atitude. Pede a reforma da r.
sentença com improcedência do pedido inicial com referência à apelante, com
inversão dos ônus sucumbenciais.
2º apelante - Banco Mercantil do Brasil S.A. (f. 150/165).
Banco Mercantil do Brasil S.A. insurge-se contra a sentença com base nos
arts. 663 e 667 do Código Civil, que atestam a responsabilidade exclusiva do
mandante, no caso a Devax Factoring Ltda., quando o apelante mandatário age
nos exatos termos do mandato outorgado, estipulando negócios expressamente
em nome daquela.
Cediço que o endosso mandato não transfere a propriedade do título.
Que, como portador do título por endosso mandato, cumpria-lhe a obrigação
por exigência contratual e legal, a teor do art. 667 do CC/02, de tomar as
providências em defesa dos direitos do representado, razão pela qual a
sentença está a merecer providencial reforma, reconhecendo a patente
ilegitimidade passiva do apelante.
Entendeu o Sentenciante que houve prática de ato ilícito do apelante, por
não se acautelar sobre o título, pelo que o condenou a pagar indenização.
Ocorre que a operação não é de caução, mas de cobrança simples, agindo o
apelante como mero mandatário.
Cita o apelante jurisprudências do Supremo Tribunal Federal, do STJ e deste
Tribunal de Justiça em favor da tese de sua ilegitimidade (f. 152/153) e
pede a reforma da sentença por ser parte ilegítima, com condenação da
apelada nos ônus sucumbenciais.
Nega o apelante tenha praticado ato ilícito, cita jurisprudência no sentido
de que não lhe cabe como endossatário, por endosso mandato, averiguar
previamente a causa da duplicata, pelo que nenhuma responsabilidade tem o
apelante pelo dano causado.
Diz que inexiste, in casu, ato contrário ao direito praticado pelo apelante,
que inexiste nexo de causalidade no caso para vincular o apelante e que, ao
protestar o título, cumpre-se o disposto no art. 21 da Lei 9.492/97,
possibilitando o registro do protesto pelo que legítimo o ato praticado pelo
apelante.
Com base no art. 21 da Lei 9.492/97 e art. 667 do Código Civil, afirma que
não praticou qualquer ato ilícito e pede a reforma para julgar o apelante
parte ilegítima.
Na hipótese de mantida a condenação, pede a redução do valor para menor e
cita jurisprudências.
3º apelante - Banco Bradesco S.A. (f. 168/185).
Pede a reforma da sentença para ser declarado parte ilegítima para figurar
no pólo passivo. Apresenta a mesma tese: que é apenas mandatário da cedente,
pede a extinção do processo sem julgamento de mérito em face do ora
apelante. Também diz que não praticou qualquer ato ilícito, pelo que não
pode ser condenado a indenizar. Defende a tese de que o protesto lavrado,
decorrido o prazo, após notificado o devedor, sem sua manifestação, não gera
direito de indenização por danos morais, citando acórdão do Tribunal de
Justiça ao julgar a Apelação 286.690-6, em que foi relatora Maria Elza.
Assim, pede a reforma da sentença para ser julgado o apelante parte
ilegítima, com extinção da ação, sem julgamento de mérito, com inversão do
ônus de sucumbência.
Aos recursos, a Hidrofit Ltda. apresentou as contra-razões de f. 188 a 192 e
as de f. 195 a 201.
Passo a julgar os recursos dos estabelecimentos bancários Banco Mercantil do
Brasil S.A. e Banco Bradesco S.A.
Pelas extensas razões lançadas nas razões dos respectivos recursos, julgo-os
partes ilegítimas para figurar no pólo passivo desta ação, pelo que os
excluo da lide, julgando extinta a ação, sem julgamento do mérito, nos
termos do art. 267, VI, do CPC.
Quanto ao recurso da apelante Devax Factoring Ltda., proprietária do crédito
duplicata por endosso translativo, entendo que a razão se encontra com o
Sentenciante, pois, ao exame dos autos, verifico que à f. 13 consta certidão
de protesto de título duplicata de responsabilidade de Hidrofit Ltda.
(devedora), sendo credora Devax Factoring Ltda., sendo sacadora Parafusalto
Comercial Ltda., ou seja, Duplicata nº 632, no valor de mil e duzentos e
reais (R$1.200,00), vencida em 27.12.2004, sendo portador o Banco Mercantil
do Brasil.
Ou seja, a Parafusalto Comercial Ltda. Sacadora, emitiu a Duplicata 632
acima, no valor de mil e duzentos reais (R$1.200,00) em desfavor da devedora
sacada Hidrofit Ltda. e endossou o título em favor da Devax Factoring Ltda.
- endossatária.
Portanto, a Devax Factoring Ltda. recebeu a duplicata 632, emitida e
endossada pela credora original Parafusalto Comercial Ltda., duplicata a ser
paga pela Hidrofit Ltda. - sacada.
Igualmente, à f. 14, consta protesto de uma duplicata no valor de dois mil e
quatrocentos reais (R$2.400,00), sacada por Parafusalto Ltda. contra a
sacada devedora Hidrofit Ltda., sendo credor Devax Factoring Ltda. e
apresentante Banco Bradesco S.A.
Em ambos os protestos, os estabelecimentos bancários agiram por endosso
mandato, conforme consta das respectivas certidões de protesto.
Em sua contestação, a requerida Devax Factoring Ltda., alegando ser terceiro
de boa-fé e endossatária da duplicata, diz que não cometeu nenhum ilícito
para ser responsabilizada.
Diz que as relações cambiárias são autônomas, o que significa o
desprendimento do título da relação cambial que lhe deu origem, que o vício
de uma relação não afeta a outra, que posto em circulação passa a valer o
título cambial por si mesmo, que é um princípio do direito cambiário o da
inoponibilidade de exceções ao terceiro de boa-fé. Que assim as exceções
pessoais que possa ter o devedor com o credor original não podem ser opostas
ao terceiro de boa-fé.
No entanto, verifica-se que essa empresa de factoring, tendo comprado o
crédito da duplicata diretamente das mãos da sacadora da duplicata
Parafusalto Comercial Ltda., agiu com negligência ao comprar a duplicata, ao
aceitá-la das mãos desta última, não se acautelando no sentido de confirmar
com a devedora sacada Hidrofit Ltda. a existência do crédito, a origem do
mesmo, a emissão da nota fiscal, a fim de não ser surpreendida com a
negativa de pagamento pela devedora, sob alegação de se tratar de uma
duplicata fria, sem lastro.
Bem que, em suas razões recursais, esta apelante disse que, "ao receber o
título em pagamento, cuidou-se sim de exigir da endossante Parafusalto
Comercial Ltda. não só a nota fiscal emitida, mas também a confirmação da
devedora do recebimento dos serviços".
No entanto, nenhuma prova a esse respeito ela trouxe aos autos para
comprovar a veracidade de tais afirmações.
Muito ao contrário, verifica-se que tais afirmações não representam a
verdade.
Isso porque se tivesse mantido contato com a autora, suposta devedora,
ficaria sabendo da recusa da autora em pagar uma duplicata fria, e, então,
ela, empresa de factoring, não teria recebido as duplicatas frias e assim
não haveria a transação de cessão de duplicata a esta apelante.
Assim, por ter agido com negligência, a Devax Comercial Ltda. contribuiu
para que o nome da autora apelada fosse negativado, pelo que sua
responsabilidade no caso mostra-se patente.
Pelo exposto e pelas leis e jurisprudências citadas na sentença recorrida e
pelos fatos acima mencionados, dou provimento ao recurso de apelação dos
estabelecimentos bancários, Banco Mercantil do Brasil S.A. e Banco Bradesco
S.A., julgando extinta a ação sem julgamento de mérito quanto a eles, por
serem partes ilegítimas nos termos do art. 267, VI, do CPC.
Condeno a autora, tendo em vista a sucumbência quanto aos requeridos, Banco
Mercantil do Brasil S.A. e Banco Bradesco S.A., a pagar vinte por cento
(20%) das custas processuais e honorários advocatícios de mil reais (R$1.000,00)
em favor do advogado de cada um dos excluídos da lide.
Mantenho a sentença recorrida quanto ao valor da causa, ao dano moral,
honorários advocatícios de sucumbência, cancelamento de protesto, com
referência aos demais requeridos.
Em conclusão, estou negando provimento à primeira apelação e dando
provimento à segunda e terceira apelações.
Custas recursais, pela primeira apelante.
DES. OSMANDO ALMEIDA - Peço vista.
N O T A S T A Q U I G R Á F I C A S
DES. PRESIDENTE - O julgamento deste feito foi adiado na sessão anterior, a
pedido do Desembargador Revisor, após o Relator negar provimento à 1ª
apelação e dar provimento à 2ª e à 3ª.
DES. OSMANDO ALMEIDA - Após examinar cuidadosamente os autos, cheguei à
mesma conclusão do douto Relator, razão pela qual adiro ao voto por ele
proferido.
De fato, há de ser reconhecida a ilegitimidade passiva dos bancos, tendo em
vista que, conforme consta das certidões exaradas do Cartório de Protesto
(f. 13-14), os títulos foram por eles recebidos mediante endosso-mandato.
Quanto ao mérito, também entendi pela confirmação da r. sentença, uma vez
que a sacadora Parafusalto Comercial Ltda. e a credora Devax Factoring
Ltda., que recebeu o título por endosso translativo, são as responsáveis
pelo protesto indevido: a primeira por ter emitido títulos sem lastro, e a
segunda por tê-los enviado para protesto sem antes se certificar da
idoneidade dos mesmos.
Com essas ligeiras considerações, acompanho o voto proferido pelo ilustre
Relator.
DES. PEDRO BERNARDES - De acordo.
Súmula - NEGARAM PROVIMENTO À PRIMEIRA APELAÇÃO E DERAM PROVIMENTO À SEGUNDA
E TERCEIRA.
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