Brasília - O Conselho Federal de Medicina publicou na última sexta-feira
(31) resolução considerada um avanço pelos médicos. É a diretiva antecipada
de vontade. Isso quer dizer que qualquer pessoa maior de 18 anos ou
emancipada poderá registrar sua opção por não receber determinados
tratamentos, caso enfrente uma situação de doença terminal. O chamado
testamento vital pode ser feito em qualquer momento da vida, por pessoas
saudáveis ou não, mas que estejam com inteiro poder de suas faculdades
mentais.
Os procedimentos a serem dispensados deverão ser discriminados no testamento
vital, como por exemplo o uso de respirador artificial (ventilação
mecânica), tratamentos com remédios, cirurgias dolorosas e extenuantes ou
mesmo a reanimação em casos de parada cardiorrespiratória.
Esta decisão deve ser manifestada em conversa com o médico, que a registrará
no prontuário do seu paciente. Não é necessário haver testemunhas e o
testamento só poderá ser alterado por quem o fez. O interessado pode ainda
procurar um cartório e eleger representante legal para garantir o
cumprimento do seu desejo.
Este recurso poderá ser usado em casos de doenças crônicas, em pacientes
terminais, mas a resolução do Conselho Federal de Medicina terá que ser
discutida entre os médicos para que eles possam definir o que fazer em
outros casos, como, por exemplo, acidentes.
De acordo com Herman Alexandre Von Tiesenhausen, médico especializado em
atendimento nas unidades de tratamento intensivo e membro do Conselho
Regional de Medicina de Minas Gerais, de forma geral, os médicos priorizavam
a vontade do paciente, porém, esta resolução traz a forma e os limites da
dispensa de procedimentos. Ele ressalta que nada muda com relação à
eutanásia, que continua ilegal no Brasil.
Anelise Buschken, médica e coordenadora da Enfermaria de Cuidados Paliativos
do Hospital de Apoio do Distrito Federal, ressalta que a resolução é
extremamente positiva, mas as pessoas precisam de muita informação. “Antes
de o paciente tomar uma decisão, ele tem quer ser informado sobre as suas
possibilidades, quais as consequências dos procedimentos e quais as
consequências de abdicar deles”, afirma e acrescenta que o médico deve
checar se o paciente está ciente dos efeitos que este testamento pode
trazer.
Buschken destaca que, com o testamento, o doente não vai rejeitar cuidados
paliativos. “Devemos cuidar até a última instância, não deixar o paciente
jogado. Levar em conta a dor física e tratar emocionalmente,
espiritualmente. Trabalhar com a qualidade de vida antes da morte”, disse.
Mesmo assim, se o tratamento necessário para diminuir ou curar a dor do
paciente estiver entre os que ele optou por não receber, esta vontade será
respeitada, lembrando que, caso o paciente esteja consciente, ele pode
revogar a qualquer tempo sua manifestação de vontade.
No âmbito jurídico, Luciana Dadalto, advogada e autora do livro Testamento
Vital (Lumen Juris, 2010), acredita que o Brasil tem muito o que avançar
nessa área. Ela lembra que a resolução do Conselho Federal de Medicina não
tem força de lei e, no caso de os parentes acusarem os hospitais de omissão,
esses não estarão respaldados juridicamente: “Existem alguns entendimentos
de que a gente tem instrumentos jurídicos contra esse tipo de acusação,
porém vai variar de cada julgado” afirma a advogada.
O testamento vital faz parte das regras hospitalares em vários país. Em
Portugal entrou em vigor em agosto uma lei federal que autoriza o registro
das diretivas antecipadas de vontade, autorizando o que os portugueses
chamam de “morte digna”. Na Argentina a legislação sobre este tema tem três
anos. Holanda e Espanha também contam com esse dispositivo. Nos Estados
Unidos, o testamento vital tem valor legal e existe desde 1970. |