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25/09/2013

Mediação e diálogo solucionam 80% dos conflitos com acordos

Diante da morosidade do judicial, população busca formas mais rápidas de resolver suas disputas 

O sistema de Justiça brasileiro é conhecido, primordialmente, por sua lentidão. Recorrer ao auxílio de tribunais para solucionar uma disputa e ter direitos garantidos requer, sobretudo, paciência. Entre o ingresso de uma ação judicial e o término do processo, pode-se levar, com sorte, semanas ou meses, mas o comum é que a espera dure anos, muitos anos.

O último relatório Justiça em Números, divulgado no ano passado pelo Conselho Nacional de Justiça, revelou que, em 2011, cerca de 84 milhões de processos tramitaram na Justiça. Daí vem a morosidade, agravada pela grande quantidade de recursos possíveis contra condenações. Diante do "congestionamento" que surge, resta à população buscar formas alternativas de resolver questões sem passar pela Justiça.

Nos casos de cobrança de dívida, conflitos familiares, conflitos de imóvel e locação, atritos entre vizinhos e problemas no pagamento de pensão alimentícia, por exemplo, a mediação tem sido uma maneira mais rápida e simples de encontrar a solução para um impasse ou disputa. O procedimento funciona da seguinte maneira: ambas as partes em divergência são convocadas a uma audiência e tenta-se, a partir do diálogo, chegar a um acordo.

O serviço é oferecido por meio da Defensoria Pública do Estado, do Fórum Clóvis Beviláqua, centros de assessoria jurídica de universidades, do Ministério Público do Estado do Ceará, entre outros. Este último possui 10 núcleos de mediação em quatro municípios (seis somente em Fortaleza), onde, apenas no primeiro semestre desse ano, já foram atendidas 14.777 pessoas.

Resolução

A maioria das reclamações, cerca de 24%, refere-se a conflitos familiares, seguidos dos atrasos no repasse de pensões alimentícias (19%), cobranças de dívida (12%) e os conflitos entre vizinhos (11%).

O elevado índice de resolutividade comprova a validade da iniciativa. Entre 80% e 87% das disputas são solucionadas apenas na base da conversa e no estabelecimento de tratos a serem cumpridos, sem qualquer apelo judicial.

"Com a mediação, restaura-se a comunicação, a escuta. Isso provoca não só a resolução dos conflitos, mas mudanças pessoais, além de evitar que esse desentendimento se torne algo de natureza mais agravante. Também é muito vantajoso porque não paga e é mais rápido que o Sistema Judiciário", afirma Francisco Edson Landim, coordenador dos núcleos de mediação do MP/CE.

A dona de casa Marineuda de Souza, 41, não teve sorte com a Justiça. Há alguns anos, entrou com ação para exigir do ex-marido o pagamento da pensão dos três filhos pequenos, mas até receber o dinheiro, foram quase dois anos de espera.

Diante da experiência insatisfatória, recentemente optou por resolver um conflito de locação de imóvel através da mediação. Marineuda alugou uma casa e assinou contrato para um ano de arrendamento, porém, três meses depois, o proprietário pediu a residência de volta. Ainda trabalhando no acordo, a dona de casa diz que vai continuar na tentativa de resolver o problema com diálogo.

Rapidez

"Em menos de uma semana, já marcaram a primeira audiência para a mediação. É menos trabalhoso e mais rápido. Se fosse para a Justiça, talvez precisasse contratar um advogado, o que sairia mais caro", afirma.

Andrea Coelho, defensora pública do Estado, explica que outra vantagem da mediação é fazer com que as pessoas encontrem uma solução para as disputas por conta própria, sem a intervenção de terceiros.

"No Judiciário, quando é dada a sentença, muitas vezes as partes não ficam conformadas, porque foi imposta uma solução. Na mediação, elas conversam, cedem para que encontrem uma resolução mais viável e a longo prazo", destaca.

Quando o problema é a violação dos direitos do consumidor, o Procon Fortaleza tem sido, desde 2003 - ano em que foi implantado na Capital - um instrumento a mais para interceder na relação entre empresas e clientes. O índice de sucesso dos casos levados ao órgão também é grande: em torno de 70% se desdobram com acordos, muitos já no momento em que a empresa recebe a primeira carta de notificação sobre a queixa. Outra grande parte é levada a pequenas audiências e apenas poucas reclamações precisam ser encaminhadas à Justiça.

"Só nos juizados especiais, boa parte das ações são oriundas das relações de consumo. Imagine se não tivesse órgãos de defesa para diminuir essa fila de espera", pontua George Valentim, coordenador geral do Procon em Fortaleza. Segundo ele, o tempo médio entre o envio da notificação e a audiência de conciliação é de 60 dias. De janeiro a agosto desse ano, o órgão realizou 7.320 atendimentos e 2.696 audiências. Destas, cerca de 53% tiveram acordo.

Desafogar o sistema

As alternativas não são vantajosas apenas para a população. Segundo a desembargadora Maria Nailde Pinheiro, do Tribunal de Justiça do Ceará, o Sistema Judiciário também se beneficia da agilidade que a mediação e as audiências extrajudiciais oferecem. Grande parte das pequenas causas que seriam levadas aos juizados são resolvidas de maneiras bem mais práticas.

"Os avanços na diminuição do número de processos em tramitação são notáveis. Já é possível notar predileção às soluções dialogadas e mediadas em detrimento da espera do julgamento por um juiz. Deixa-se a cargo deste os conflitos mais complexos, insuscetíveis de uma solução por meio de técnicas como a mediação", destaca Nailde.

Mediação

Núcleos de mediação do Ministério Público estadual

Telefone: 3231.1792

Núcleos de justiça comunitária da defensoria pública do estado

Telefone: 129 (Alô Defensoria)

Centro judiciário de solução de conflitos do Fórum clóvis beviláqua

Telefone: 3492.8030 / 32 / 34

Núcleo de solução de conflitos do tribunal de justiça do estado

Telefone: 3207.6872 / 74 / 76

Escritório de prática jurídica da unifor

Telefone: 3477.3317

Procon
Telefone: 3105.1136


Arbitragem é opção à Justiça comum

Ainda pouco conhecida no Ceará, a arbitragem também é uma alternativa à Justiça comum para sanar disputas que envolvam bens patrimoniais disponíveis, como questões imobiliárias e de sociedade em empresas. No Ceará, o Tribunal Arbitral de Fortaleza atua desde 2003 para dar maior celeridade à resolução de conflitos, prometendo finalizar processos no período máximo de seis meses.

O diferencial da técnica em relação ao Tribunal tradicional, conforme Harold de Melo Martins, presidente do foro, é que, no lugar do juiz, há um árbitro especialista no tema ao qual o caso diz respeito que irá analisar os argumentos de cada parte. "Dependendo do caso, é colocado um árbitro que seja formado na área. Se o problema estiver relacionado à medicina, será um médico. Se for na engenharia, será um engenheiro, e assim por diante. Pode ser qualquer pessoa de confiança das partes", explica Martins.

Entretanto, ao contrário da mediação, na qual o caso ainda pode ser levado à Justiça se não houver acordo, a arbitragem determina uma sentença ao final da audiência, que não pode ser contestada por nenhum dos envolvidos no conflito e nem mesmo pelo Poder Judiciário. O juiz deverá apenas fiscalizar e avaliar se houve alguma irregularidade, gerando a necessidade de refazer a decisão do árbitro.

Conforme o presidente do Tribunal, um dos principais benefícios da arbitragem é o prazo reduzido para a conclusão do caso. Em no máximo 15 dias é marcada uma audiência de conciliação e, de acordo com a complexidade da questão, uma segunda reunião é realizada em até 30 dias, onde será dada a sentença.

"Na Justiça comum, nenhum processo acaba em menos de três, quatro anos, porque existem dezenas de recursos para atacar todas as decisões de uma juiz. Na arbitragem, além de não caber recurso, temos, por lei, até seis meses para entregar uma decisão", ressalta Martins.

Ele afirma, ainda, que o Tribunal se empenha para resolver a maior parte dos problemas na etapa da conciliação, o que, de fato, acontece. Aproximadamente 80% das disputas são encerradas nessa primeira audiência, demonstrando o bom resultado da técnica.

Valor

A opção também pode custar menos aos bolsos da população. Igualmente à mediação, a presença do advogado é opcional, mas em alguns casos é recomendada. "Quando vai acontecer a arbitragem de fato, na audiência de julgamento, orientamos que ambas as partes estejam acompanhadas de advogado", afirma o presidente do foro.

Harold de Melo Martins ressalta a importância de divulgar as técnicas de arbitragem e mediação entre a sociedade. Segundo ele, utilizar o diálogo para solucionar conflitos, além de ser mais ágil, impede que pequenas brigas se tornem problemas mais graves e acabem na instância policial. "Grande parte dos casos que chegam às delegacias são situações cotidianas, como briga de vizinhos, cobrança de dívidas. Se as pessoas conhecessem melhor a arbitragem e a mediação e houvesse mais incentivo do governo, essas disputas poderiam ser encerradas de forma mais fácil", acredita.


FIQUE POR DENTRO

Técnica é aplicada desde a colonização

A arbitragem é realizada no Brasil desde a época da colonização portuguesa, quando eram solucionados conflitos de respeito à Legislação comercial. Mais tarde, no Império, a técnica começou a ser mais utilizada na esfera cível, já se estabelecendo a impossibilidade de haver recursos contra a sentença.

Desde o período, a arbitragem era realizada sem orientação legislativa vigente, até que em 1996 instituiu-se a Lei da Arbitragem, cuja finalidade é suprir a demanda do Sistema Judiciário e resolver de forma ágil as disputas que acarretam morosidade para a Justiça.


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