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24/03/2017

Decisão permite que prenome e gênero constem em registro civil de transexual

Decisão da 2ª Vara de Família de Belo Horizonte determinou a alteração do prenome e do sexo nas certidões de registro civil de uma pessoa transgênero, identificada com o sexo feminino desde os sete anos de idade. Agora, portanto, as informações contidas em seus documentos estarão de acordo com sua condição feminina, uma vez que a requerente já realizou cirurgia de redesignação de sexo.

Publicada em 22 de fevereiro deste ano, a decisão foi proferida pelo juiz José Eustáquio Lucas Pereira. Em seu despacho, ele afirmou não haver dúvidas quanto à transexualidade da solicitante, considerando também os constrangimentos pela qual ela era submetida, ao apresentar documentação que não condizia com seus atributos físicos. A questão já havia sido levantada pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), que participa como amicus curiae da ADI 4275 – ainda em tramitação no STF –, cuja intenção é justamente permitir tal direito aos transexuais.

José Eustáquio observou ainda que, em agosto de 2003, data em que a requerente foi operada, estava em vigor a Resolução 1.652/2002 do Conselho Federal de Medicina, a qual exigia que o(a) postulante à cirurgia de transgenitalismo passasse por avaliações de uma equipe médica multidisciplinar. “Afinal, de que adianta realizar uma cirurgia de mudança de sexo, tida pelo Conselho Federal de Medicina como uma solução terapêutica para um transtorno de identidade sexual, se o paciente tem de lidar com os olhares de repúdio das pessoas ao se depararem com documentos que desmentem sua realidade existencial feminina?”, questionou o juiz, que vedou qualquer menção às alterações nas certidões de registro público, visíveis somente nos livros cartorários.

Tereza Rodrigues Vieira, membro do IBDFAM e professora no Mestrado em Direito Processual e Cidadania na Universidade Paranaense (UNIPAR) – onde coordena o projeto de pesquisa “Intolerância, multiculturalismo e proteção das minorias vulneráveis” –, conta que, no Brasil, decisões como esta ocorrem há décadas. Contudo, “considerando o conservadorismo do TJMG nesta seara”, a deliberação aponta progresso. “O Judiciário de vários estados já autoriza adequação do nome e do gênero mesmo sem cirurgia, uma vez que a identidade não se define pela genitália. E, ao reconhecer o direito à adequação da documentação do transexual, o Judiciário deve autorizar no mandado a alteração no Livro de Registro”, explica.

Sendo assim, ainda de acordo com ela, não deverá ocorrer qualquer referência à modificação em nenhum outro documento, nem mesmo na certidão de nascimento. “Os direitos dos transexuais e de terceiros estarão assegurados se a alteração constar apenas no livro do Registro Civil”, acrescenta Tereza. A advogada defende que, para que ocorra a adequação do prenome e do gênero, não há necessidade de cirurgia, muito menos perícia. “O Judiciário já vem reconhecendo este direito há alguns anos. Nome e gênero adequados proporcionam a inclusão do indivíduo, dando-lhe segurança, restringindo situações de vulnerabilidade, discriminações e constrangimentos baseados no preconceito”, completa.

Tereza revela que, em São Paulo, o processo para adequação do prenome tem sido rápido. “Em geral, em um mês, já obtemos o parecer do Ministério Público e a sentença favorável. O nome é a identificação da pessoa na sociedade, portanto deve ser harmônico ao seu autorreconhecimento e personalidade. Sem nome e gênero adequados, a pessoa se sente anulada pelo sentimento de menosprezo e de diminuição, podendo, inclusive, sofrer danos psíquicos e emocionais, comprometendo até a saúde física. Um nome masculino para quem se sente e se apresenta como mulher não a representa, mutila sua dignidade e impede que se expresse em inúmeras situações cotidianas”.

Ainda conforme a advogada, o nome deve comunicar quem é a pessoa. E, quando isso não ocorre, se insurge um conflito negativo sobre a autoestima, prejudicando suas relações sociais e afetivas. “O desconforto causado pelo nome desarmônico com a personalidade impede emocionalmente que a pessoa parta em busca de conquistas, gerando forte sentimento de desânimo, descrédito na vida e exclusão social”, conclui.

Fonte: IBDFAM


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