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29/11/2016

A atuação das Juntas Comerciais na conferência dos documentos que serão arquivados é apenas formal

RECURSO DE APELAÇÃO - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - JUNTA COMERCIAL DE MINAS GERAIS - ALEGAÇÃO DE FRAUDE NA ASSINATURA DA ALTERAÇÃO CONTRATUAL QUE INCLUIU O AUTOR NA CONDIÇÃO DE SÓCIO DE UMA EMPRESA - AUSÊNCIA DE DIVERGÊNCIA GROSSEIRA ENTRE A ASSINATURA AUTENTICADA E A ASSINATURA PRESENTE NA ALTERAÇÃO CONTRATUAL - AUSÊNCIA DE OBRIGATORIEDADE DA JUNTA EM EXIGIR QUE OS ATOS LEVADOS A REGISTRO ESTEJAM AUTENTICADOS - NÃO DEMONSTRAÇÃO DE QUE HOUVE FALSIDADE - AUSÊNCIA DE ATO ILÍCITO E INEXISTÊNCIA DE NEGLIGÊNCIA - DEVER DE INDENIZAR AFASTADO - SENTENÇA MANTIDA

- A atuação das Juntas Comerciais na conferência dos documentos que serão arquivados é apenas formal, sendo que, nos termos do art. 63 da Lei nº 8.934/94, a Jucemg não tem a obrigação de exigir, para o devido arquivamento, que as assinaturas constantes nos atos como a alteração contratual tenham reconhecimento de firma.

- Inexistindo demonstração de que a Jucemg não atuou com cautela na execução de suas tarefas ou de que tenha sido negligente quanto à alegada existência de falsificação, não se verifica a presença de qualquer ato ilícito que gere a obrigação de indenizar.

Apelação Cível nº 1.0024.13.264752-0/001 - Comarca de Belo Horizonte - Apelante: Chahine Layoun - Apelado: Jucemg - Junta Comercial de Minas Gerais - Relator: Des. Carlos Roberto de Faria

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em negar provimento ao recurso.

Belo Horizonte, 1º de setembro de 2016. - Carlos Roberto de Faria - Relator.

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

DES. CARLOS ROBERTO DE FARIA - Trata-se de recursos de apelação aviados às f. 82/91 e 92/101 por Chahine Layoun, nos autos da ação de indenização que move contra a Junta Comercial de Minas Gerais (Jucemg), demonstrando inconformismo perante a sentença, proferida às f. 77/81, que julgou improcedente o pedido inicial e condenou o requerente ao pagamento das custas e honorários advocatícios, que fixou em R$1.000,00 (mil reais), mas suspendeu a exigibilidade destes em face da justiça gratuita concedida.

Para fundamentar a pretensão de reforma da decisão, alega o recorrente que a apelada tinha a obrigação legal de verificar a autenticidade dos documentos, bem como a prova de identidade dos titulares e dos administradores da empresta mercantil. Ressalta que a apelada atuou de forma negligente e que em decorrência disso passou por situação constrangedora e angustiante, sendo que teve sua moral abalada por ter seu nome no polo passivo de diversos processos no TRT, 3ª Região, e no TJMG, e que ainda sofreu o bloqueio judicial de valores em sua conta. Sustenta que a apelada ainda não retirou seu nome do quadro social da empresa, bem como não tomou qualquer providência para minimizar os danos sofridos.

Explana que o dano moral no presente caso é presumido. Cita julgados favoráveis à sua pretensão. Por fim, pugna pelo provimento do recurso, a fim de que: seja declarada nula a sentença no tocante à condenação ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, bem como para que lhe seja concedida a gratuidade da justiça; seja excluído o seu nome do quadro social da Limpadora e Conservadora Capri Ltda.; seja a apelada condenada ao pagamento de danos materiais no valor de R$2.199,44 e danos morais no valor de R$80.000,00.

A apelada apresentou contrarrazões às f. 105/111, pelo não conhecimento do recurso e, sucessivamente, pelo desprovimento do mesmo e manutenção da sentença.

É o relatório.

Inicialmente, considerando que a legislação processual que rege os recursos é aquela vigente na data da publicação da decisão judicial, registro que a presente causa deverá ser analisada segundo as disposições do Código de Processo Civil de 1973.

Preliminar suscitada de ofício - preclusão consumativa.

Percebe-se que a autor protocolou dois recursos de apelação, às f. 82/91 e 92/101.

Uma vez protocolado o recurso de apelação, não pode a parte aditá-lo ou protocolar novo recurso, uma vez que se opera a preclusão consumativa.

Sendo assim, não conheço do 2º recurso de apelação aviado pelo autor, qual seja o de f. 92/101.

Quanto à 1ª peça recursal juntada, verifica-se que a apelada pleiteia que lhe seja negado seguimento, por força dos arts. 508 e 518 do CPC/73. No entanto, ao contrário do que alega a apelada, de forma genérica inclusive, estão presentes os seus pressupostos de admissibilidade.

Contudo, no tocante ao pedido de que ``seja declarada nula a sentença no tocante à condenação ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, bem como para que lhe seja concedida a gratuidade da justiça;'', notória a ausência de interesse recursal do autor. É que a justiça gratuita já foi concedida às f. 31/33, sendo que o Magistrado sentenciante destacou na decisão que as custas e demais despesas ficariam suspensas nos termos da Lei nº 1.060/90. Portanto, de ofício, acolho a preliminar de parcial ausência de interesse recursal e não conheço do recurso nesse ponto.

No entanto, nos demais pontos, devidamente presentes os pressupostos de admissibilidade, como já exposto, conheço do recurso de apelação aviado às f. 82/91.

Cuida-se de particular que pleiteia a retirada de seu nome da empresa Limpadora e Conservadora Capri Ltda., bem como a condenação da Junta Comercial de Minas Gerais ao pagamento de danos morais, no montante de R$80.000,00 (oitenta mil reais) e danos materiais referentes ao valor de R$227,00 (duzentos e vinte e sete reais) que foi bloqueado de sua conta, aos gastos que teve com requerimentos e autenticações e os honorários que teve que pagar ao advogado que a está representando na presente ação.

Narra o autor que, em 16.03.2013, recebeu um comunicado do Banco Bradesco de que o valor remanescente de sua conta, R$227,00 (duzentos e vinte e sete reais), havia sido bloqueado por determinação judicial em ação trabalhista. Juntou cópia do extrato bancário (f. 27) e cópia dos comunicados do Banco Bradesco informando o bloqueio em razão de decisão judicial e, posteriormente, a transferência do valor para a Caixa Econômica Federal (f. 24).

Expõe que a ação trabalhista na qual foi proferida a decisão que determinou o bloqueio em sua conta foi ajuizada para o recebimento do valor de R$117.364,31, referente a verbas previdenciárias devidas por uma empresa de que teoricamente seria sócio. Traz que nunca foi sócio da Empresa Conservadora Capri Ltda. e que, após ter conhecimento dessa ação, lavrou um Boletim de Ocorrência (doc. juntado à f. 25). Coloca que o RG apresentado na alteração contratual é de terceiros e que é grotesca a falsificação de sua assinatura em tal alteração. Trouxe cópia da alteração contratual na qual foi incluído como sócio (f. 08/10) e de outra alteração anterior, bem como do contrato social (f. 15/17), sendo que nestes últimos não figurava no quadro societário (f. 11/14).

Além desses documentos, o autor instruiu a inicial com cópia de sua carteira de identidade autenticada (f. 07) e do andamento processual referente à execução na qual figura como réu (f. 26).

A Jucemg, por sua vez, juntou cópia da ficha cadastral da Limpadora e Conservadora Capri Ltda. (f. 52/54), sendo que em tal ficha consta o nome do autor como sócio administrador e o número do CPF e identidade dele são de fato os mesmos que constam na documentação apresentada em sua inicial. Juntou, ainda, cópia da ficha cadastral de outras empresas nas quais o autor também ocupa a função de sócio (f. 55/68).

São esses os únicos documentos que instruem os presentes autos, sendo que a Jucemg e o próprio autor, que pleiteou tão somente a expedição de ofícios ao TRT, à Junta Comercial e à Receita Federal, pugnaram pelo julgamento antecipado da lide, conforme se verifica às f. 70, 71 e 73. À f. 72, o Magistrado indeferiu a expedição dos ofícios requeridos, não tendo o autor se insurgido contra tal decisão.

A análise das provas que instruem os autos não nos permite concluir que houve qualquer vício na atuação da Junta Comercial, não sendo possível também verificar de plano a ocorrência da alegada falsidade, sendo que o simples confronto entre a assinatura autenticada do autor (f. 07) e a assinatura constante na Alteração Contratual arquivada na Jucemg (f. 10), alteração esta na qual o nome do autor foi incluído na dita empresa, não remete à falsificação.

Eventual constatação de que a assinatura presente na alteração contratual é falsa carece de conhecimentos técnicos de um perito, o que poderia se dar por meio de perícia grafotécnica, que, contudo, não foi pleiteada pelo autor. Embora o juiz não esteja vinculado ao laudo pericial, podendo embasar sua decisão com outros elementos ou fatos observados nos autos, nos termos do art. 436 do CPC/73, no caso concreto e diante da ausência de divergência manifesta entre as assinaturas, a elaboração de laudo pericial judicial, ou ao menos a instrução da inicial com laudo particular, seria de extrema relevância.

Cumpre destacar que, não obstante a assinatura feita na alteração contratual arquivada não tenha reconhecimento de firma, o arquivamento da mesma pela Jucemg deu-se com amparo no art. 63 da Lei nº 8.934/94, que dispõe sobre o Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins e dá outras providências. Vejamos:

``Art. 63. Os atos levados a arquivamento nas juntas comerciais são dispensados de reconhecimento de firma, exceto quando se tratar de procuração.

Parágrafo único. A cópia de documento, autenticada na forma da lei, dispensa nova conferência com o original; poderá, também, a autenticação ser feita pelo cotejo da cópia com o original por servidor a quem o documento seja apresentado''.

No mesmo sentido é a redação do art. 40 do Decreto nº 1.800/96, que regulamenta a lei federal acima transcrita:

``Art. 40. As assinaturas nos requerimentos, instrumentos ou documentos particulares serão lançadas com a indicação do nome do signatário, por extenso, datilografado ou em letra de forma e do número de identidade e órgão expedidor, quando se tratar de testemunha.

§ 1º Verificada, a qualquer tempo, a falsificação em instrumento ou documento público ou particular, o órgão do Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins dará conhecimento do fato à autoridade competente, para as providências legais cabíveis, sustando-se os efeitos do ato na esfera administrativa, até que seja resolvido o incidente de falsidade documental.

§ 2º Comprovada, a qualquer tempo, falsificação em instrumento ou documento arquivado na Junta Comercial, por iniciativa de parte ou de terceiro interessado, em petição instruída com a decisão judicial pertinente, o arquivamento do ato será cancelado administrativamente''.

Tais normas nos revelam, portanto, que a atuação das Juntas Comerciais na conferência dos documentos que serão arquivados é apenas formal, sendo que possuem, entre outras funções constantes no art. 8º da Lei nº 8.934/94, a atividade de registro Público. O art. 32 de tal lei define em que consiste o registro:

``Art. 32. O registro compreende:

I - a matrícula e seu cancelamento: dos leiloeiros, tradutores públicos e intérpretes comerciais, trapicheiros e administradores de armazéns-gerais;

II - O arquivamento:

a) dos documentos relativos à constituição, alteração, dissolução e extinção de firmas mercantis individuais, sociedades mercantis e cooperativas;

b) dos atos relativos a consórcio e grupo de sociedade de que trata a Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976;

c) dos atos concernentes a empresas mercantis estrangeiras autorizadas a funcionar no Brasil;

d) das declarações de microempresa;

e) de atos ou documentos que, por determinação legal, sejam atribuídos ao Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins ou daqueles que possam interessar ao empresário e às empresas mercantis;

III - a autenticação dos instrumentos de escrituração das empresas mercantis registradas e dos agentes auxiliares do comércio, na forma de lei própria''.

Como cediço, os requisitos essenciais para que se tenha responsabilidade civil, com consequente obrigação de indenizar, são: o ato ilícito do agente, o dano e o nexo de causalidade entre eles, observado os arts. 186 e 927 do Código Civil de 2002.

Contudo, após acurada análise dos autos, percebe-se que o autor não logrou êxito em comprovar os fatos constitutivos de seu direito, ônus que lhes incumbia, nos termos do art. 333, I, do CPC de 1973.

Por todo o exposto, inexistindo demonstração de que a Jucemg não atuou com cautela na execução de suas tarefas ou de que tenha sido negligente quanto à alegada existência de falsificação, não se verifica a presença de qualquer ato ilícito que gere a obrigação de indenizar, não se podendo falar ainda na condenação da Jucemg ao pagamento de danos materiais aos quais não deu causa ou na determinação de que a Jucemg exclua o nome do autor do quadro societário da empresa apontada, visto que as alegações do autor de que a assinatura não é sua, dissociadas de outras provas, não demonstram a pretensa constatação de irregularidade. Acrescente-se que o Boletim juntado à f. 25 traz alegações feitas pelo próprio autor, e não fatos constatados pela autoridade policial.

Em casos análogos, já se manifestou este Tribunal:

``Apelações cíveis. Registro de sociedade empresária. Falsificação de documentos. Nulidade da alteração contratual. Impedimentos lançados no nome da vítima. Indenização postulada em face da junta comercial. Descabimento. Atribuição legal da autarquia que se restringe à conferência formal dos documentos. Inexistência de falsificação grosseira perceptível à simples vista. Sucumbência recíproca. Honorários advocatícios. Possibilidade de compensação ressalvada. Confirmação da sentença. 1 - A atribuição legal das Juntas Comerciais, no que tange ao registro de sociedades empresárias e alterações contratuais, limita-se à conferência formal dos documentos que lhe são apresentados. 2 - Verificando-se, no caso concreto, que a cópia do documento de identidade da parte se encontrava autenticada, inexistindo, à simples vista, falsificação grosseira da assinatura no contrato social da empresa, descabido o pedido de indenização em face da autarquia, pelos prejuízos aventadamente ocasionados por ato ilícito praticado por terceiro. 3 - Recursos não providos'' (TJMG - Apelação Cível nº 1.0024.10.245449-3/001, Relatora: Des.ª Áurea Brasil, 5ª Câmara Cível, j. em 02.10.2014, publicação da súmula em 14.10.2014).

No voto cuja ementa se transcreveu acima, inclusive, a Em. Des. Áurea Brasil faz interessante consideração quanto às normas que determinam a atuação das juntas comerciais e dispensam a exigência de documentos com assinaturas autenticadas. Permito-me transcrever:

``Não se olvida, decerto, dos questionamentos a esse regramento, notadamente por parte da sociedade, que se torna vulnerável aos agentes fraudadores, ressaltando-se, ademais, a dificuldade em se identificar o indivíduo responsável pela prática do ato ilícito.

Cuida-se, todavia, de questões metajurídicas, afetas ao plano político-econômico, afigurando-se, pois, despiciendas nesta ação judicial com partes formais, em que se discute o direito subjetivo atribuído a cada uma delas''.

No mesmo sentido, transcreve-se julgado na 2ª Câmara Cível, no qual, mesmo com a realização de perícia grafotécnica que entendeu que havia falsificação de assinatura, não entendeu estar presente ato ilícito da Junta Comercial, uma vez que a divergência das assinaturas não era grotesca e ``o fato em si, somente foi gerado por uma ação própria de fraudadores, sem qualquer participação da apelada para a ocorrência dos danos experimentados pela apelante, não há que se falar em sua responsabilização pelo evento danoso, eis que ausente a correlação lógica entre as condutas praticadas e o dano produzido''. Veja-se:

``Indenização. Danos materiais e morais. Fraude. Inclusão do nome como sócia de sociedade empresária. Registro e arquivamento pela Junta Comercial do Estado de Minas Gerais. Falsificação das assinaturas. Negligência na conferência. Inocorrência. Conduta ilícita. Ausência de comprovação. Art. 333, I, do Código de Processo Civil. Apelação a que se nega provimento. 1 - O art. 186 do Código Civil de 2002 estabelece que somente haverá responsabilidade civil subjetiva se houver a culpa, dano e nexo de causalidade. 2 - A obrigação de indenizar surge de uma conduta capaz e suficiente de produzir o evento danoso, não podendo a responsabilidade recair sobre fato alheio a vontade do agente, que demonstra ter agido nos limites da lei, e principalmente quando resta comprovada a ocorrência de fraude. 3 - O art. 333, I, estabelece que compete ao autor a demonstração dos fatos constitutivos de seu direito, sob pena de ver julgado improcedentes seus pedidos'' (TJMG - Apelação Cível/Reexame Necessário nº 1.0024.09.589739-3/001, Relator: Des. Marcelo Rodrigues, 2ª Câmara Cível, j. em 11.02.2014, publicação da súmula em 24.02.2014).

Em conclusão, ausente a demonstração de ato ilícito do agente, não merece reparos a sentença que julgou improcedente o pedido autoral.

Assim sendo, nego provimento ao recurso.

Custas recursais, pelo apelante, suspensa a exigibilidade dessas em virtude da gratuidade da justiça concedida.

Votaram de acordo com o Relator os Desembargadores Teresa Cristina da Cunha Peixoto e Ângela de Lourdes Rodrigues.

Súmula - NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO.

Fonte: Diário do Judiciário Eletrônico


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