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17/11/2016

AGRAVO DE INSTRUMENTO - RESTAURAÇÃO DE AUTOS DE DESAPROPRIAÇÃO - MERA RECOMPOSIÇÃO DE AUTOS - DISCUSSÃO DE MÉRITO - AUSÊNCIA - CITAÇÃO DE TERCEIRO INTERESSADO - AÇÃO DE USUCAPIÃO AJUIZADA APÓS SENTENÇA PROFERIDA NA DESAPROPRIAÇÃO - DESNECESSIDADE

AGRAVO DE INSTRUMENTO - RESTAURAÇÃO DE AUTOS DE DESAPROPRIAÇÃO - MERA RECOMPOSIÇÃO DE AUTOS - DISCUSSÃO DE MÉRITO - AUSÊNCIA - CITAÇÃO DE TERCEIRO INTERESSADO - AÇÃO DE USUCAPIÃO AJUIZADA APÓS SENTENÇA PROFERIDA NA DESAPROPRIAÇÃO - DESNECESSIDADE

- A restauração de autos é procedimento que visa à recomposição dos autos desaparecidos, sendo vedada a discussão relativa ao mérito da demanda originária.

- É desnecessária a citação dos recorrentes como terceiros interessados, na medida em que o procedimento de restauração visou apenas a recompor os autos desaparecidos da ação de desapropriação, da qual esses não foram partes, mormente tendo em vista que ajuizaram ação de usucapião anos após a sentença proferida na desapropriação.

Agravo de Instrumento Cível nº 1.0411.05.018937-1/001 - Comarca de Matozinhos - Agravantes: Margareth Clementino Guedes da Silva, Neuza Cordeiro dos Santos, João Cordeiro da Silva - Agravado: Município de Matozinhos - Interessados: Esperança S.A. Administração, Participações, Indústria e Comércio de Imóveis, Sucessores de Usina Queiroz Júnior - Relator: Des. Edilson Fernandes

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em negar provimento ao recurso.

Belo Horizonte, 20 de setembro de 2016. - Edilson Fernandes - Relator.

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

DES. EDILSON FERNANDES - João Cordeiro da Silva e outros interpuseram recurso contra a decisão que indeferiu o seu pedido de f. 128/136-TJ, no sentido de que fosse reconhecida a nulidade total de todos os atos praticados nos autos desde a citação (f. 144-TJ).

Os agravantes noticiam que o Município de Matozinhos, ora agravado, requereu, no ano de 2005, o desarquivamento dos Autos nº 2.439/93, referentes a uma ação de desapropriação por ele ajuizada em face da Usina Queiroz Júnior, posteriormente substituída pela Esperança S.A. Administração, Participações, Indústria e Comércio de Imóveis, tendo sido homologado acordo entre as partes. Informam que, posteriormente, o agravado juntou os documentos que tinha em seu poder e requereu a citação do então síndico da massa falida da Usina Queiroz Júnior, tendo sido realizada a sua citação por hora certa. Afirmam que foi proferida sentença que declarou a restauração dos autos, determinou a expedição de mandado de averbação ao Registro Imobiliário da comarca, bem como autorizou, sem qualquer pedido da parte interessada, a liberação do restante dos valores depositados. Asseveram que, quando do ajuizamento da mencionada ação, já haviam interposto ação de usucapião de parte da área declarada desapropriada e que, mesmo tendo ciência de tal, o Município não determinou a citação deles como terceiros interessados na restauração de autos.

Sustentam que, após terem vista dos autos de restauração, evidenciaram que o mandado expedido não estava em consonância com a sentença homologatória da ação de desapropriação, ausente até o presente momento, porquanto aquela delimitava em 19.348m² o tamanho da área desapropriada em conformidade com a autorização dada pela Lei municipal nº 1.386/1994. Ressaltam que a mencionada lei autorizou e permitiu o acordo em outra ação de desapropriação então em curso pelas mesmas partes. Destacam que pretendem usucapir de 149.581,22m² de uma área total de 188.414.002m², o que não afeta os 19.348m² desapropriados pelo ente municipal. Informam que ajuizaram ação de retificação de registro para modificar a transcrição no Cartório de Registro Imobiliário e ter como de domínio real do expropriante apenas de 19.348,00m² da área originariamente contida na ação de desapropriação.

Alegam que peticionaram nos autos de restauração, apontando as nulidades ocorridas, e que, por tal ser matéria de ordem pública, deveria o Magistrado conhecê-las de ofício, mas que o MM. Juiz da causa nem sequer analisou as matérias alegadas, sendo nula a decisão impugnada por ausência de fundamentação. Defendem que a ausência da sua citação, de nomeação de curador especial ao revel citado por hora certa, e ainda o fato de quem deveria ter sido citado era a empresa Esperança S.A. Administração, Participações, Indústria e Comércio de Imóveis, que substituiu a Usina Queiroz Júnior na desapropriação, eivando de nulidade absoluta o processo de restauração de autos. Pugna pelo provimento do recurso (f. 02/19-TJ).

Da preliminar de impugnação à justiça gratuita.

De acordo com o ordenamento processual civil vigente, o pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso, sendo que, deferido o pedido, a parte contrária poderá oferecer impugnação na contestação, na réplica, nas contrarrazões de recurso ou, nos casos de pedido superveniente ou formulado por terceiro, por meio de petição simples, a ser apresentada no prazo de 15 (quinze) dias, nos autos do próprio processo, sem suspensão de seu curso (arts. 99 e 100 do CPC/2015).

Na hipótese dos autos, verifico que a assistência judiciária gratuita não deferida por este Relator, mas sim pelo Juízo de origem (f. 162-TJ), razão pela qual não é cabível a presente impugnação em sede de resposta.

Rejeito a preliminar.

Da preliminar de ilegitimidade recursal.

O Município agravado suscita a ilegitimidade dos agravados para recorrerem da decisão impugnada, na medida em que não são proprietários nem possuidores do imóvel objeto da ação.

Nos termos da legislação processual civil vigente:

“Art. 18. Ninguém poderá pleitear direito alheio em nome próprio, salvo quando autorizado pelo ordenamento jurídico.

Art. 996. O recurso pode ser interposto pela parte vencida, pelo terceiro prejudicado e pelo Ministério Público, como parte ou como fiscal da ordem jurídica.

Parágrafo único. Cumpre ao terceiro demonstrar a possibilidade de a decisão sobre a relação jurídica submetida à apreciação judicial atingir direito de que se afirme titular ou que possa discutir em juízo como substituto processual”.

Da análise dos dispositivos supracitados, é certo que, para recorrer, a esfera jurídica da parte deve ter sido atingida pela decisão impugnada, sendo vedado, em nome próprio, pleitear direito alheio, salvo quando autorizado pelo ordenamento

Conforme leciona Humberto Theodoro Júnior:

“[...] para recorrer se exige a condição do interesse, tal como se dá com a propositura da ação. ‘O que justifica o recurso é o prejuízo, ou gravame, que a parte sofreu com a sentença’. [...] Dessa maneira, o recurso manifestado tem de apresentar-se como necessário e adequado, na situação concreta do processo, para ser admitido.

Só o vencido, destarte, no todo ou em parte, tem interesse para interpor recurso (art. 499)” (Curso de direito processual civil. 38. ed. Rio de Janeiro: Forense, v. 1, p. 583).

Nesse contexto, com efeito, os recorrentes não possuem legitimidade para recorrer acerca da decisão impugnada no que diz respeito à alegação de nulidades ocorridas nos autos em razão da ausência de nomeação de curador especial ao revel citado por hora certa e ainda de ausência de citação da empresa Esperança S.A. Administração, Participações, Indústria e Comércio de Imóveis, que substituiu a Usina Queiroz Júnior, porquanto tal não atinge a esfera jurídica dos mesmos, sendo-lhes vedado pleitear direito alheio em nome próprio.

Por outro lado, possuem legitimidade para recorrer acerca da ausência da citação dos mesmos na qualidade de terceiros interessados, devendo o recurso ser parcialmente conhecido.

Acolho parcialmente a preliminar e conheço parcialmente do recurso.

A controvérsia a ser apreciada por esta Instância Revisora consiste em saber se deve ser declarada a nulidade do procedimento de restauração dos autos em razão da ausência de citação dos agravantes, na qualidade de terceiros interessados.

Depreende-se dos autos que o Município de Matozinhos, ora agravado, em 03.02.2005, peticionou nos Autos nº 2439-03, referentes a uma ação de desapropriação por ele ajuizada em face da Usina Queiroz Júnior, requerendo o seu desarquivamento (f. 23-TJ), tendo sido certificado pelo escrivão judicial que os mesmos não foram encontrados, “apesar das buscas realizadas nesta Secretaria do Juízo, inclusive arquivo” (f. 30-TJ).

Em razão da supracitada certidão, o recorrido juntou as cópias dos autos que detinha em seu poder, para viabilizar possível restauração dos autos, bem como requereu a intimação do síndico da massa falida da Usina Queiroz Júnior para juntar eventuais cópias (f. 31/63-TJ).

Posteriormente, tendo em vista que não houve qualquer manifestação do síndico, citado por hora certa (f. 90-TJ), o MM. Juiz de origem, considerando que “foi possível a restauração parcial dos autos”, os declarou restaurados, bem como determinou a expedição de mandado de averbação da área desapropriada e a liberação dos valores remanescentes, ainda depositados em juízo, tendo os autos sido arquivados em junho de 2008 (f. 108/110 e 125-TJ).

Em março de 2016, os recorrentes peticionaram nos autos, alegando que deveriam ter sido citados na qualidade de terceiros interessados, porque haviam ajuizado, em 2004, ação de usucapião (nº 041104012238-3), requerendo o reconhecimento da prescrição aquisitiva de parte da área alegadamente desapropriada.

Afirmaram, ainda, que a restauração de autos foi concedida sem a juntada de importantes documentos, como o acordo homologado por sentença, que demonstraria que as terras foram expropriadas em área inferior àquela contida na inicial da desapropriação (f. 129/131-TJ).

O art. 1.063 do Código de Processo Civil/73, atual art. 712 do CPC/2015, prevê que, verificado o desaparecimento dos autos e inexistindo autos suplementares, o meio legal cabível para a recomposição dos atos e termos do processo, necessário à retomada de seu curso, é o procedimento de restauração de autos, o qual, conforme leciona Humberto Theodoro Júnior, “limitase à pesquisa e definição do conteúdo dos diversos documentos que compunham os autos originais” (Curso de direito processual civil. Procedimentos especiais. Rio de Janeiro: Forense, 2010. v. 3, p. 300).

A restauração de autos é, portanto, procedimento que visa à recomposição dos autos desaparecidos, sendo vedada a discussão relativa ao mérito da demanda originária, conforme, no mesmo sentido, já ressaltou este egrégio Tribunal de Justiça:

“Restauração de autos. Impenhorabilidade de bem de família. - Na restauração de autos, não cabe discussão sobre qualquer ponto de direito ou de fato da causa principal” (TJMG - 13ª Câmara Cível - Agravo de Instrumento nº 1.0024.12.281682-0/001 - Relator: Des. Newton Teixeira Carvalho - DJe de 18.09.2014).

“Agravo de instrumento. Restauração de autos de execução fiscal. Pretensão de reconhecimento da prescrição intercorrente. Matéria estranha à decisão recorrida. - A sentença que julga a ação para restauração de autos deve limitar-se às questões relativas à restauração em si, não podendo fazer incursões no mérito da ação principal, pelo que o reconhecimento ou não da ocorrência da prescrição intercorrente se afigura matéria estranha ao objeto da decisão recorrida” (TJMG - Agravo de Instrumento Cível 1.0079.96.004151-9/001 - Relator: Des. Brandão Teixeira - 2ª Câmara Cível - j. em 28.08.2012 - p. em 06.09.2012).

Nesse contexto, verifico a desnecessidade de citação dos recorrentes, na medida em que o procedimento de restauração visou apenas a recompor os autos desaparecidos da ação de desapropriação, da qual estes não foram partes.

Ressalto que o ajuizamento da ação de usucapião pelos recorrentes se deu anos após a sentença proferida nos autos da ação de desapropriação, que data de 11 de maio de 1995 (f. 63-TJ), tendo aquela, inclusive, sido julgada extinta sem resolução de mérito em face da impossibilidade de usucapir bem público (f. 222/226-TJ).

Em síntese, não há falar na citação dos recorrentes para a restauração de autos, uma vez que nessa não se discutiu o mérito da ação de desapropriação.

Nego provimento ao recurso.

Custas, pelos agravantes, suspensa a exigibilidade (art. 98, § 3º, do CPC/2015).

Votaram de acordo com o Relator os Desembargadores Sandra Fonseca e Corrêa Junior.

Súmula - NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO.

Fonte: Diário do Judiciário – TJMG


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