Notícias

11/09/2014

Ganhou na Justiça e não levou, a saída é o cartório

TJ do Rio incentiva consumidor a protestar título de empresas que não pagam indenizações

RIO - Uma iniciativa do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) visando a encerrar os 6,5 milhões de processos em fase de execução está ajudando consumidores que recorreram à Justiça pedindo indenizações a receber os valores definidos pelo juiz, mas não honrados por empresas condenadas. O Ato Executivo Conjunto nº 7 de 2014 estabelece que o autor de ação em fase de execução poderá emitir, após requerimento ao juiz, uma certidão com o valor do seu crédito e protestar o título em um cartório extrajudicial, sem custos, caso o pagamento seja negado mais uma vez. Para evitar o protesto, a dívida deve ser paga em 72 horas. O protesto não se aplica apenas a casos de relação de consumo, mas acaba favorecendo esse tipo de ação com valores menores, uma vez que, em sua maioria, são tratadas nos Juizados Especiais Cíveis. 

Se para o cidadão ter um título protestado é uma dor de cabeça, para empresas pode significar prejuízo financeiro, pois, ao ser protestada a companhia fica impedida de obter crédito, de participar de concorrências públicas, e de fusões, por exemplo. 

A contadora Ana Lúcia de Barros Conceição foi um dos 3,5 mil pequenos credores — com dívidas de até R$ 1,2 mil a receber — que recorreu ao protesto para pressionar o devedor. A consumidora conta que esperava há mais de um ano pela execução de sua sentença, que na época era de R$ 800, pelo não cumprimento do contrato firmado com a Affinity Consultoria de Vendas de Planos de Saúde. Ana Lúcia recorreu ao Judiciário porque, apesar do pagamento da primeira parcela, no valor de R$ 258, não recebeu nem o contrato nem a carteirinha do plano. A Justiça chegou a determinar a penhora on-line de bens da empresa, mas Ana Lúcia não se interessou pela mercadoria que lhe ofereceram: uma impressora industrial usada. Enquanto isso, apesar de ter seu direito reconhecido, não conseguia receber o que lhe era devido. 

— Pesquisando na internet descobri a possibilidade do protesto. Eu mesma fiz a petição, no formulário do cartório, e em uma semana recebi uma ligação informando que haviam depositado R$ 1.200 — diz. 

Instrumento de ‘força’ 

A consultoria processada por Ana Lúcia informou que foi obrigada a “arcar com condenação por problema que não deu causa”, uma vez que seria apenas a intermediária da negociação entre a consumidora e o plano de saúde. 

Na avaliação da presidente do TJ-RJ, a desembargadora Leila Mariano, faltava um instrumento “com força” para que devedores — especialmente empresas com grande número de ações judiciais, como bancos, operadoras de telecomunicações e planos de saúde — honrassem seus compromissos com credores que, muitas vezes, têm pouco a receber. 

— E maior força que o protesto, principalmente para as empresas, não existe. Temos que construir uma solução que não dependa de lei, e que dê uma virada nesta mesa — diz Leila. 

Prejuízo para empresa 

Embora já esteja prevista em lei, a possibilidade de solicitar em juízo uma certidão de crédito e protestá-la como um título, esse instrumento não é de conhecimento da maioria, de acordo com o TJ-RJ, que treinou servidores para orientar quem procura o serviço e inscreveu o projeto no Prêmio Innovare. 

André Gomes Netto, presidente do Instituto de Protesto de Títulos do Brasil - Seção Rio, considera que haverá uma “mudança de cultura” por quem não costuma pagar indenizações. 

— Uma empresa que tenha muitos títulos protestados pode ter até a falência solicitada. Esse é um mecanismo coercitivo, que ajudará o elo da corrente que, normalmente, é achatado por quem é economicamente superior — afirma. 

Denise Caetano ainda não conseguiu receber da empresa Aroma do Campo a indenização determinada pela Justiça em 2012. Sua advogada solicitou a certidão de crédito há duas semanas, e vai recorrer ao protesto. Denise, que é vendedora autônoma, perdeu todo o cabelo após usar um produto da marca: 

— Procurei a empresa pelo SAC, me disseram que viriam pegar o produto para analisar, mas nunca vieram. Tive que raspar a cabeça, fazer um tratamento caro e esperar quase um ano para meu cabelo crescer novamente. Foi terrível, perdi clientes porque não saía de casa. Agora, espero receber os R$ 15 mil estabelecidos pela sentença — diz a consumidora. 

A Aroma do Campo informou que está em recuperação judicial e que o protesto não seria o meio mais adequado para a ex-cliente receber o que lhe é devido. 

— Pode ser que o protesto da consumidora acabe sendo mais um dos diversos títulos protestados. Ela deveria procurar o responsável pela recuperação judicial da empresa — avalia Pedro Vaz, advogado da Aroma do Campo.


•  Veja outras notícias