Ministro do STF critica magistrados


O ministro Nelson Jobim, do Supremo Tribunal Federal (STF), criticou o comportamento dos magistrados e a forma, que considera desorganizada, de como tratam as questões administrativas e burocráticas. Qualificou de "desordem" as decisões diferentes tomadas entre os tribunais. "A magistratura não deve ter medo da crítica nem de apanhar; tem de colocar a cara a tapa", afirmou. Disse que o Judiciário precisa reconhecer sua incapacidade administrativa e gerencial e concentrar-se na missão de decidir os conflitos.

Mea Culpa - Jobim critica atuação do Judiciário no País. 

Ministro do Supremo Tribunal Federal afirma que o poder é desorganizado e está "desprofissionalizado". Ele cobra mais integração entre justiça federal e estadual.

O ministro Nélson Jobim, do Supremo Tribunal Federal (STF), criticou ontem, em São Paulo, a falta de organização do Poder Judiciário e apontou a ausência de planejamento estratégico como uma das maiores dificuldades da Justiça. Jobim fez as críticas em palestra realizada pela manhã no Seminário Juizados Especiais Federais: Processo Eletrônico e Juizado Itinerante, no Fórum Social Ministro Gerônymo Ferrante, onde enfocou a necessidade de modernização do Judiciário.

A realidade é que não há ninguém que fale em nome do Poder Judiciário; isso é um fato , disse. Nós desprofissionalizamos o Poder Judiciário; nossa visão é que a solução dos problemas administrativos passa pela criação de leis. Ele cobrou também uma visão global do setor e a articulação entre os poderes Judiciários federal e estaduais. Essa carência de contato prejudica até a discussão das questões salariais com o Executivo, disse.

Ex-presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Jobim evitou falar sobre temas polêmicos, como a reforma agrária na ordem do dia, por causa de invasões realizadas pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), na semana passada e a federalização da segurança pública no Rio, além da reforma da Previdência. 

Para o ministro do STF, compete ao Executivo gerir o processo de negociação com o MST e os desdobramentos dessa ação. Em relação à questão da segurança no Rio, Jobim limitou-se a elogiar o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, destacando que ele tem lucidez, competência, experiência e capacidade de conversação para tratar do assunto.

ARQUIPÉLAGO - Ainda falando sobre a desorganização do Judiciário, Jobim lembra que essa discussão vem da Constituição de 1988, que criou uma estrutura independente para os tribunais estaduais e federais, mas sem visão estratégica. É um grande arquipélago, ilhas sem comunicação. Se não assumirmos que esse problema existe, o Judiciário não terá uma estrutura nacional , afirmou.

O meio de superar isso, segundo o ministro, está na criação do Conselho Nacional de Administração do Judiciário, um órgão centralizador da política nacional da Justiça, que é um dos pontos da reforma em discussão no Senado. Sem isso, não haverá avanço no setor. 

Jobim acredita que o presidente do Congresso, senado José Sarney (PMDB-AP), agiu de forma correta ao reabrir os prazos de debate do projeto de mudança na Judiciário. Segundo o ministro, a renovação de dois terços do Senado impediu que os atuais senadores, eleitos em 2002, tivessem discutido a matéria. Sobre a indicação de três novos membros para o STF, que deve ocorrer até o fim de maio, Jobim acha correta a forma como é feita a renovação: pela indicação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

O STF não é um tribunal de carreira da magistratura, é um tribunal de natureza político-jurisdicional e é fundamental que continue a seguir esse modelo , disse o ministro. Além de escolher os três nomes este ano, em 2004, Lula deve indicar outros quatro ou cinco integrantes do STF.

Esses novos juízes ocuparão as vagas de ministros que, obrigatoriamente, se aposentam ao completar 70 anos de idade. O fato de Lula indicá-los faz parte do processo político democrático, o presidente foi eleito e agora indica os ministros do STF. 

Segundo Jobim, é importante que um tribunal como o STF não seja apreendido por estruturas burocráticas . O ministro preferiu não comentar o fato de existirem quase cem candidatos para as três vagas do órgão. É isso mesmo? Não sei. Quem sabe disso é o presidente da República; isso não me diz respeito. Cada macaco no seu galho , afirmou.

CARA A TAPA - A magistratura não deve ter medo da crítica e nem de apanhar , afirma o ministro Nélson Jobim. Ele disse que o Judiciário precisa reconhecer sua incapacidade administrativa e gerencial e se concentrar na sua missão de decidir sobre conflitos. Temos que botar a cara a tapa. Não podemos ter medo de apanhar. Só não apanha quem é irrelevante , disse. 


Fonte:  Jornal "Estado de Minas" - 11/03/2003