Processo de execução - Bem de família - Impenhorabilidade - Não-cabimento

 

JURISPRUDÊNCIA CÍVEL

PROCESSO DE EXECUÇÃO - IMÓVEL - BEM DE FAMÍLIA - AUSÊNCIA DE PROVA - IMPENHORABILIDADE - NÃO-CABIMENTO - HASTA PÚBLICA - CÔNJUGE - INTIMAÇÃO - DESNECESSIDADE - LEILÃO - NULIDADE - INEXISTÊNCIA


Ementa: Apelação cível. Impenhorabilidade. Bem de família. Não-comprovação. Intimação da praça. Nulidade. Inocorrência. Intimação do cônjuge. Desnecessidade.

- Não há que se falar em impenhorabilidade do bem se o devedor não comprova a existência dos requisitos previstos na Lei 8.009/90.

- Não há obrigatoriedade da intimação do cônjuge do devedor acerca da designação da hasta pública.

Apelação não provida.

Apelação Cível n° 1.0479.02.036614-8/001 - Comarca de Passos - Apelantes: William Mattar Farjalla e outro - Apelado: Banco do Brasil S.A. - Relator: Des. Roberto Borges de Oliveira

A C Ó R D Ã O

Vistos etc., acorda, em Turma, a 10ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, em negar provimento.

Belo Horizonte, 06 de novembro de 2007. - Roberto Borges de Oliveira - Relator.

N O T A S  T A Q U I G R Á F I C A S

DES. ROBERTO BORGES DE OLIVEIRA - Cuida-se de apelação cível interposta por Willian Mattar Farjalla e Jane Joele Farjalla contra sentença prolatada pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Passos, nos autos da ação anulatória ajuizada em desfavor do Banco do Brasil S.A.

Adoto o relatório da sentença e esclareço que o MM. Juiz de Direito julgou improcedente o pedido inicial e condenou os autores ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atribuído à causa, suspensa a exigibilidade, tendo em vista a concessão da justiça gratuita.

Inconformados, os apelantes insurgem contra a sentença, aduzindo que pretendem a nulidade dos atos processuais que culminaram com o leilão e a arrematação do único bem imóvel, caracterizado como bem de família, nos autos da ação de execução, em apenso, que lhes move o Banco do Brasil S.A.

Afirmam que os documentos de f. 14/23, as certidões imobiliárias juntadas e as testemunhas ouvidas dão ensejo a concluir que o aludido imóvel constitui bem de família.

Dizem que, ainda que esse imóvel não seja o único de que dispõem, é nele que residiam, sendo esse fato suficiente para caracterizar o bem como de família.

Sustentam que não foram intimados acerca do leilão designado para os dias 06.08.2001 e 16.08.2001, que culminou com a arrematação que se busca anular.

Alegam que não se pode afirmar que estavam em lugar incerto e não sabido, uma vez que sequer mandado de intimação foi expedido.

Ressalta que, havendo suspeita de ocultação da parte, deveria ter-se realizado a citação por hora certa.

Pede, então, o provimento do recurso.

Embora intimado, o apelado não apresentou contra-razões, conforme certidão de f. 265/266.

Conheço do recurso, mas entendo que o mesmo não merece prosperar.

A Lei 8.009/90, que dispõe sobre a impenhorabilidade do bem de família, visa proteger da coação executiva apenas o imóvel utilizado pela família do executado para fins residenciais, desde que este se caracterize como o único imóvel dessa entidade familiar.

É o que dispõem os artigos abaixo transcritos:

"Art. 1º O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta Lei."

"Art. 5º Para os efeitos de impenhorabilidade, de que trata esta Lei, considera-se residência um único imóvel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia permanente.

Parágrafo único. Na hipótese de o casal, ou entidade familiar, ser possuidor de vários imóveis utilizados como residência, a impenhorabilidade recairá sobre o de menor valor, salvo se outro tiver sido registrado, para esse fim, no Registro de Imóveis e na forma do art. 70 do Código Civil".

O referido benefício é norma de exceção, exigindo, portanto, redobrada análise quanto à presença dos requisitos necessários para a sua concessão. Apenas a prova robusta e incontestável justifica a concessão da medida.

No entanto, no caso dos autos, os apelantes não se desincumbiram do seu ônus da prova, no sentido de que a constrição judicial atingiu o único imóvel de propriedade do ente familiar ou que, possuindo vários imóveis, o penhorado é o que serve de residência.

Tal prova é eminentemente documental, sendo que os testemunhos de f. 206/209 e os documentos de f. 14/23 não têm o condão de individualizar o imóvel como o único que a família possui.

Nessa linha, não há que se falar em impenhorabilidade do bem.

A alegação de nulidade da praça realizada em 03 - e não 06 - de agosto e 16 de agosto de 2001, por falta de intimação do devedor e de sua esposa, também não prospera.

Conforme f. 103-v. da ação de execução em apenso, o oficial de justiça compareceu ao endereço dos apelantes por três vezes e ainda a outro endereço por uma vez, tendo conversado com a esposa e com a filha do executado sem obter êxito quanto à intimação do mesmo ou quanto ao local onde poderia ser encontrado:

"Em tempo: Certifico, ainda, que quando da intimação da Sra. Jane Joele, por essa me foi dito, que talvez seu esposo Willian viesse a Passos no último feriado do dia 02/11, motivo pelo qual, aguardei até aquela data, e lá novamente estive por três vezes, e não encontrei ninguém em casa, pelo menos não fui atendido. Certifico, ainda que procurei novamente no dia de ontem pela manhã, e novamente encontrei o imóvel fechado, e, sendo de meu conhecimento que a esposa do executado às vezes é encontrada à Rua Santo Antônio, 394, lá estive, e fui atendido por uma jovem que se identificou como Júlia, filha de Willian, e por essa me foi dito que seu pai possui um endereço em São Paulo-SP, mas que trata-se de casa de um irmão, não sendo ele sempre encontrado lá, vez que encontra-se viajando por outros Estados, e se negou a fornecer esse endereço de São Paulo, bem como informou que ele não compareceu no último feriado nesta cidade, motivos pelos quais deixei de intimar Willian Matar Farjala, considerando-o em local incerto e não sabido (...)".

Depois disso, às f. 117, novamente foi tentada a intimação do executado, também frustrada:

"Certifico que, em cumprimento ao r. mandado, diligenciei por diversas vezes na residência, digo, no endereço constante do mandado, e não localizei o requerido Willian Mattar Farjalla, tendo diligenciado mesmo nas festividades carnavalescas, sem o encontrar. Certifico mais que segundo informações obtidas junto a colegas de trabalho, tal pessoa encontra-se residindo em São Paulo-SP, mas em endereço desconhecido, motivo pelo qual, deixei de intimá-lo, considerando-o em local incerto e não sabido".

Como se vê, não foi possível a intimação do executado por meio de oficial de justiça, haja vista que ele se encontrava em local incerto e não sabido.

Nessa linha, alternativa não restou ao exeqüente, senão promover a intimação editalícia do executado, nos termos do que dispõe o inciso II do art. 231 do CPC, a qual foi realizada, às f. 132/135, com a observância de todos os requisitos legais.

Não há que se falar, portanto, em nulidade da intimação do apelante Willian Mattar Farjalla.

Quanto à sua esposa, inexiste necessidade de intimação, haja vista que:

"quando não é parte no processo de execução, o cônjuge do devedor não precisa ser intimado da realização da alienação judicial, ainda que esta objetive bem imóvel" (Negrão, Theotonio. Comentários ao Código de Processo Civil e legislação processual em vigor. 37. ed. São Paulo: Saraiva, p. 775).

O § 5º do art. 687 do CPC somente determina a intimação do devedor acerca da designação da hasta pública.

Nesse sentido:

a) "Agravo de instrumento. Ação de execução. Praça. Intimação pessoal do devedor. Prazo. Intimação pessoal do cônjuge do devedor. Desnecessidade. Descrição do imóvel. Nulidade afastada.

I - Somente haverá nulidade da arrematação, por ausência da intimação pessoal do devedor, quando tal intimação não for feita antes da realização da hasta pública, já que o CPC não prevê prazo mínimo para execução de tal medida. Assim, não se pode exigir, antes da realização da praça, a comprovação da intimação pessoal do devedor.

II - Não sendo parte no processo de execução o cônjuge do devedor, não há falar em sua intimação para hasta pública, ainda que esta objetive bem imóvel, ressalvando-se a obrigatoriedade da precedente intimação da penhora; III - (...)" (AI nº 1.0432.03.003327-3/001, 17ª CC TJMG, Rel. Des. Luciano Pinto, j. em 12.04.2007).

b) "Embargos à arrematação. Hasta pública. Intimação do executado pela via editalícia. Viabilidade. Intimação do cônjuge do executado. Desnecessidade. Vício no edital. Inocorrência. Preço vil. Conceito. Valor superior a metade da avaliação. Não-caracterização. Compensação. Matéria indiscutível em sede embargos. - A intimação do devedor da realização da hasta pública pode realizar-se através de edital, caso haja impossibilidade de proceder a sua comunicação pessoal. O art. 687, § 5º, do CPC prevê tão-somente a intimação pessoal do devedor acerca da alienação judicial, sendo desnecessária a intimação de seu cônjuge. (...)" (AC nº 1.0487.05.016567-8/001, 14ª CC TJMG, Rel. Des. Elias Camilo, j. em 25.01.2007).

In casu, o cônjuge varoa não é parte no processo executivo, tendo a ação sido promovida apenas em face de Willian Mattar Farjalla.

Assim, como a Sra. Jane Joele Farjalla não é parte nos autos da execução, não há falar em nulidade por falta de sua intimação para a praça, devendo ser ressaltado que, quando da penhora do bem, o cônjuge varoa foi devidamente intimado (f. 25 da ação de execução).

Nego provimento ao recurso.

Custas recursais, pelos apelantes, suspensas nos termos do art. 12 da Lei 1.060/50.

Votaram de acordo com o Relator os Desembargadores Alberto Aluízio Pacheco de Andrade e Cabral da Silva.

Súmula - NEGARAM PROVIMENTO. 
 


Fonte: Jornal "Minas Gerais" - 19/02/2008

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