Dúvida registrária. Usucapião. Matéria alheia ao Registro Imobiliário. Procedimento de natureza administrativa

Relator: BRANDÃO TEIXEIRA
Relator do Acórdão: BRANDÃO TEIXEIRA
Data do acórdão: 19/04/2005
Data da publicação: 13/05/2005

Inteiro Teor:

EMENTA: DIREITO CIVIL - REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO - DÚVIDA REGISTRÁRIA - REGISTRO DE SENTENÇA QUE DECLARA AQUISIÇÃO DE DOMÍNIO PELA USUCAPIÃO - PEDIDO INDEFERIDO - ALEGAÇÃO DE EXISTÊNCIA DE REGISTRO DO BEM EM NOME DO ESTADO - IMPOSSIBILIDADE DE USUCAPIÃO SOBRE TERRAS DEVOLUTAS - DÚVIDA IMPROCEDENTE - MATÉRIA ALHEIA AO REGISTRO IMOBILIÁRIO - PROCEDIMENTO DE NATUREZA ADMINISTRATIVA - SENTENÇA CONFIRMADA - RECURSO PREJUDICADO.

Na suscitação de dúvida não cabe discussão a respeito do mérito da questão retratada pelo título. A dúvida registrária é um procedimento administrativo de rito sumaríssimo, determinado, em princípio, pela Lei de Registros Públicos, e em outras normas extravagantes, em que se discute simplesmente a possibilidade do registro. Neste diapasão, a atuação do oficial cartorário está limitada a verificar se o documento apresentado para registro preenche os requisitos previstos em lei.

APELAÇÃO CÍVEL/REEXAME NECESSÁRIO N. 1.0556.02.002742-2/001 - COMARCA DE RIO PARDO DE MINAS - REMETENTE: JD DA COMARCA DE RIO PARDO DE MINAS, APELANTE(S): ESTADO DE MINAS GERAIS - APELADO(A)(S): PERFIL AGROPECUÁRIA FLORESTAL LTDA., INTERESSADO: CARTÓRIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS DE RIO PARDO DE MINAS - RELATOR: EXMO. SR. DES. BRANDÃO TEIXEIRA.

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a SEGUNDA CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM REEXAME NECESSÁRIO, CONFIRMAR A SENTENÇA, PREJUDICADO O RECURSO VOLUNTÁRIO.

Belo Horizonte, 19 de abril de 2005.

DES. BRANDÃO TEIXEIRA - Relator

12/04/2005 - SEGUNDA CÂMARA CÍVEL - ADIADO.

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

APELAÇÃO CÍVEL/REEXAME NECESSÁRIO N. 1.0556.02.002742- 2/001 - COMARCA DE RIO PARDO DE MINAS - REMETENTE: JD DA COMARCA DE RIO PARDO DE MINAS, APELANTE(S): ESTADO DE MINAS GERAIS - APELADO(A)(S): PERFIL AGROPECUÁRIA FLORESTAL LTDA., INTERESSADO: CARTÓRIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS DE RIO PARDO DE MINAS - RELATOR: EXMO. SR. DES. BRANDÃO TEIXEIRA.

Proferiu sustentação oral, pelo Apelante, o Dr. Romeu Rossi, e assistiu ao julgamento, pela Apelada, o Dr. Carlos A. Boson Santos.

O SR. DES. BRANDÃO TEIXEIRA:

Sr. Presidente. Tendo em vista a sustentação oral, peço vista dos autos.

SÚMULA: PEDIU VISTA O RELATOR APÓS SUSTENTAÇÃO ORAL.

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

Assistiram ao julgamento, pela apelada e pelo apelante, os Drs. Maria Noemy S. D. Lopes e Romeu Rossi, respectivamente.

O SR. PRESIDENTE (DES. FRANCISCO FIGUEIREDO):

O julgamento deste feito foi adiado na sessão do dia 12.04.2005, a pedido do Relator, após sustentação oral.

Com a palavra o Des. Brandão Teixeira.

O SR. DES. BRANDÃO TEIXEIRA:

Sr. Presidente. Pedi vista para melhor exame, depois da sustentação oral produzida da tribuna que levantou uma questão relativa à rescisória. Tenho voto escrito e passo à sua leitura.

VOTO - Os presentes autos versam sobre reexame necessário e recurso de apelação interposto pelo Estado de Minas Gerais, em razão da sentença de f. 59/66-TJMG, ter julgado improcedente a suscitação de dúvida promovida pelo Oficial do Registro de Imóveis da Comarca, para determinar a promoção do registro e matrícula do imóvel rural denominado "Fazenda Ribeirão" (Maracaiá), situado no Município de Montezuma/MG, com área de 950 hectares, objeto do mandado e sentença proferida no julgamento de ação de usucapião do aludido imóvel ajuizada por Perfil Agropecuária Florestal Ltda, ora apelada.

Irresignado, o apelante pugna pela reforma da sentença. Em razões recursais de f. 69/74-TJMG, alega que juízo a quo adentrou indevidamente no mérito da ação de usucapião, que está sendo atacada por ação rescisória. Afasta a existência de coisa julgada em se tratando de imóvel público.

JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE - Conhece-se do reexame necessário e do recurso voluntário, diante da presença dos requisitos de admissibilidade.

MÉRITO - A controvérsia reproduzida nos presentes autos versa sobre procedimento de dúvida (direta) de registro suscitado pelo Oficial do Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Rio Pardo de Minas.

O apelado informa que requereu averbação junto à matrícula n. 4.105, para que fosse inscrita a sentença usucapienda e esta produzisse seus efeitos legais. No entanto, o titular do Cartório de Registro de Imóveis suscitou dúvida acerca do procedimento a ser adotado para o registro e matrícula do imóvel denominado "Fazenda Ribeirão". Justificou que "o imóvel em epígrafe já tem origem, encontrando-se registrado nesse CARTÓRIO, sob a Matrícula de n. 4.105, fls. 125, Livro: 2P, de 15 de junho de 2000, pertencendo ao ESTADO DE MINAS GERAIS, como terras devolutas, conforme certidão da Matrícula, em anexo" (f. 02-TJMG).

O ilustre magistrado singular julgou improcedente a dúvida e determinou que, após o trânsito em julgado da sentença, fosse expedido novo mandado de transcrição da sentença, ratificando em iguais termos ao anteriormente expedido.

Permissa venia, a sentença merece ser confirmada, porém, por fundamentos diversos. O magistrado da origem teceu considerações quanto ao mérito da ação de Usucapião, processo n. 0056.02.002742-2, ora em apenso. Enfatizou que "o Estado demonstrou real desinteresse ao não se pronunciar a tempo e modo na ação de usucapião" (f. 65-TJMG).

Com efeito, na suscitação de dúvida não cabe discussão a respeito do mérito da questão retratada pelo título. Nem pelo oficial cartorário, nem pelo julgador. A dúvida registrária é um procedimento administrativo de rito sumaríssimo, determinado, em princípio, pela Lei de Registros Públicos, e em outras normas extravagantes, em que se discute simplesmente a possibilidade do registro.

Neste diapasão, o magistrado não julgará, de forma direta, eventual conflito de interesse entre o apresentante do título e aquele que se julga titular do direito controvertido. Ele estará latente no processo de dúvida, mas não será apreciado pelo juiz. O Juiz deve atuar no processo como uma autoridade da Administração Pública, como um corregedor administrativo, tal como em qualquer processo em curso numa repartição do Executivo ou do Legislativo. Em tais circunstâncias, o juiz corregedor voltará para regularidade formal dos registros. Da mesma forma, a atuação do Tabelião está limitada a verificar se o documento apresentado para registro preenche os requisitos previstos em lei.

E a Lei determina que a sentença que julgar procedente o pedido de usucapião, com a conseqüente expedição do título definitivo de domínio, será transcrita no registro de imóveis mediante mandado judicial.

É o que reza o art. 945, do Código de Processo Civil, expressis verbis:

"A sentença, que julgar procedente a ação, será transcrita, mediante mandado, no registro de imóveis, satisfeitas as obrigações fiscais".

Demais disso, na época em que foi suscitada a presente dúvida, ou seja, em maio de 2001, o art. 167 da Lei de Registros Públicos, com redação dada pela Lei n. 6.216, de 30 de junho de 1975, que introduziu modificações na Lei n. 6.015, de 31 de dezembro de 1973, determinava:

"Art. 167 - No Registro de Imóveis, além da matrícula, serão feitos: I - o registro: (...) 28) das sentenças declaratórias de usucapião".

Portanto, na espécie, em se tratando de mandado judicial determinando o registro da sentença que julgou procedente o pedido formulado em ação de usucapião, não competia ao oficial cartorário indagar se o imóvel em questão poderia ou não ter sido usucapido, ou seja, discutir o teor do título judicial levado a registro. Não consta na esfera de atribuições a ele conferidas proceder a questionamentos acerca da possibilidade de ser o aludido imóvel terra devoluta e, por conseguinte, insusceptível de ser adquirido pela usucapião. Caberia a ele, simplesmente, cumprir o mandado judicial, após observados os procedimentos de estilo.

In casu, a sentença (o título judicial) apresentada para registro está de acordo com a previsão legal. Por isso, se encontra apta pra ser registrada, nos termos do art. 167, inciso I, item 28, da Lei nº 6.015/73. Conforme se infere da certidão de f. 46-TJMG (processo em apenso), além de ter operado o trânsito em julgado da sentença que se pretende levar a registro, prolatada por ocasião do julgamento da ação de usucapião, as "obrigações fiscais" exigidas pela lei foram cumpridas (f. 08-TJMG).

Ressalte-se, porém, que os fundamentos explanados pelo ilustre sentenciante desviam-se da questão a ser apreciada no procedimento de dúvida. Ao invés de fundamentar pela prevalência da coisa julgada sobre o direito de usucapir e de aprofundar em questões tratadas no processo de usucapião em apenso, deveria manifestar-se apenas sobre a possibilidade ou não de se registrar a sentença apresentada pelo apelado, sob o aspecto formal, ou seja, se aquele título apresentado para registro preenche os requisitos exigidos pela lei para tanto.

Por tais motivos, a sentença que julgou improcedente a dúvida merece permanecer incólume, porém, por fundamentos diversos.

CONCLUSÃO - Ex positis, EM REEXAME NECESSÁRIO, CONFIRMA-SE A SENTENÇA DE F. 59/66-TJMG, colacionando-se à mesma os fundamentos aqui expostos.

Sem custas pelo Estado de Minas Gerais, nos termos do disposto na Lei Estadual n. 14.939/2003, art. 10, inciso I, que, reproduzindo integralmente o texto previsto na Lei Estadual n. 12.427/96, conferiu isenção do seu pagamento às pessoas jurídicas de direito público interno.

O SR. DES. CAETANO LEVI LOPES: De acordo com o Relator.

O SR. DES. FRANCISCO FIGUEIREDO: De acordo com o Relator.

SÚMULA: EM REEXAME NECESSÁRIO, CONFIRMARAM A SENTENÇA, PREJUDICADO O RECURSO VOLUNTÁRIO. 


Fonte: Site do TJMG - 17/05/2005