ISS - Decisão de Sumaré estabelece tributação na forma de Trabalho Pessoal do Registrador

Processo Nº 604.01.2008.016074-8

Texto integral da Sentença

Vistos. Trata-se de AÇÃO DECLARATÓRIA CUMULADA COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA ajuizada por ANA MARIA FALCONE em face da PREFEITURA MUNICIPAL DE SUMARÉ. Consta da petição inicial (fls. 02/26), que:

a) a requerente exerce atividade de Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutela da Sede da Comarca de Sumaré-SP;

b) em seu ramo de atuação realiza serviços registrais, os quais, de acordo com oi artigo 237, da CF/88, são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público;

c) com a entrada em vigor da Lei Complementar nº 116/2003 foi adicionado à lista de serviços tributáveis pelo ISS Imposto Sobre Serviços, diversos serviços, dentre eles os de registros públicos cartorários registrais e notariais;

d) dessa forma, os prestadores de serviços notariais e de registro estão, no âmbito da Lei Complementar 116/2003, sujeitos à cobrança do ISS;

e) mencionada Lei fixa alíquota de até 5%, estabelecendo como base de cálculo a receita bruta auferida em caso de pessoas jurídicas;

f) em relação ás pessoas físicas que exercem trabalho pessoal a lei manteve alíquotas fixas ou variáveis, em função da natureza do serviço ou de outros fatores pertinentes, nestes não compreendida a importância paga a título de3 remuneração do próprio trabalho, tendo em vista a vigência do artigo 9º do Decreto-Lei nº 406/68;

g) porém, referida exação foi instituída em Sumaré, pela Lei Complementar nº 3.919, de 30.12.2003, e fixou a alíquota de 4% sobre o valor dos serviços prestados pela requerente, desconsiderando a vigência do artigo 9º do Decreto-Lei nº 406/68, que não foi revogado;

h) a requerente pretende cobrar o ISS sobre o rendimento bruto da requerente, e não como pessoa física, como deveria ser, com o que não concorda a requerente uma vez que a tributação em face dos cartórios deve ser realizada na forma de trabalho pessoal;

i) não existe em nosso ordenamento a modalidade de bitributação, sendo certo que, como pessoa física já arca com o pagamento do imposto de renda, de molde que não pode suportar outro tributo, no caso, o ISS, sobre a mesma base de cálculo;

j) o artigo 9º do Decreto-Lei nº 406/68 está em vigor e deve ser observado;

k) várias decisões já acenaram nesse sentido;

l) a delegação é outorgada em caráter pessoal, sendo seu enquadramento tributário diferenciado, em que pese a obrigação da existência de inscrição no CNPJ;

m) o Decreto-Lei nº 5844/1943, ao dispor sobre a cobrança e fiscalização do Imposto de Renda, trata dos rendimentos de tabeliães e notários em sua primeira parte;

n) assim sendo não há que se falar em equiparação do cartório à pessoa jurídica, visto que seu titular é pessoa física;

o) requere a concessão de tutela antecipada para autorizar o recolhimento do ISS na forma de trabalho pessoal em conformidade com o artigo 9º do Decreto-Lei nº 406/68, a fim de se evitar quaisquer cobranças e/ou execuções;

p) requer a procedência da pretensão com a declaração em definitivo da tributação da autora sob a forma de trabalho pessoal. A antecipação da tutela foi deferida (fls.103).

A Municipalidade foi regularmente citada (fls. 106/107). Ao ter sido contestada a ação (fls. 120/151), foi aduzido que:

a) a tributação da requerente é a variável, porquanto exerce atividade por meio de conjugação de esforços e não de forma unipessoal;

b) a própria lei que regulamenta a atividade já rechaça a possibilidade de trabalho pessoal, vez que necessita de uma organização técnica e administrativa para desenvolver os serviços notariais e de registro;

c) os serviços prestados pelos Cartórios de Notas, embora constem da lista de serviços tributáveis pelos ISSQN, não atendem aos requisitos legais para que possam ser tributados por alíquota fixa;

d) não há dúvida que os valores recolhidos aos cofres estaduais, sob e denominação de emolumentos ou custas, têm a natureza de taxa. Entretanto esta remuneração não é titularizada pelos notários, que têm direitos apenas ao repasse;

e) o que é remunerado por taxa são os serviços notariais e registrários prestados direta ou indiretamente pelo Estado-membro, sendo certo que o titular do tributo é o Estado e não os notários ou registradores;

f) não há dúvida de que o agente delegatário tem natureza privada na sua constituição, organização e funcionamento;

g) a parcela transferida do estado aos agentes delegatários é sempre de natureza contratual ou quase-contratual, caracterizando a onerosidade ínsita ao fato gerador do ISSQN e, quantitativamente, a base de cálculo deste imposto;

h) não há qualquer inconstitucionalidade na previsão da Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003, que prevê a incidência do ISSQN sobre os serviços de registros públicos, cartorários ou notariais, quando prestados por agentes delegatários de caráter privado;

i) apenas quando for prestado diretamente pelo Estado é que se estará diante de hipótese de remuneração integral por taxa;

j) a pretensão não procede.

Houve manifestação da ré sobre fls. 111/117 (fls. 157) e da autora sobre fls. 158 (fls. 160/162).

É o relatório. DECIDO.

Pretende a requerente o afastamento da exação instituída pela Lei Complementar Municipal nº 3.919, de 30 de dezembro de 2003, que fixou a alíquota de 4% (quatro por cento) sobre o valor dos serviços prestados por ela, porquanto tal dispositivo municipal afronta o artigo 9º do Decreto-Lei nº 406/68, o qual ainda está em plena vigência. Está a requerente inconformada, porquanto a Municipalidade de Sumaré insiste na cobrança do ISSQN sobre o seu rendimento bruto, ao tempo que referida tributação deveria ser feita na forma de trabalho pessoal, porquanto tal modalidade não foi revogada pela Lei Complementar 116/2003 e deve ser aplicada aos notários e registradores.

Razão assiste à requerente. Isso porque realiza serviços registrais, os quais, de acordo com o artigo 236 da Constituição Federal são de caráter privado por delegação do Poder Público. Não há dúvida, portanto, que a delegação é outorgada em caráter pessoal, sendo vedada sua alienação ou transferência. Tal delegação é dada pelo Estado que autoriza o exercício da atividade. Assim é que a tributação deve ser entendida apenas sobre o trabalho pessoal daquele que responde pela delegação.

O ISSQN deve ser cobrado da autora pelo Município na forma do regime especial (alíquota fixa) estabelecido no artigo 9°, § 1º, do Decreto-lei 406/68 não revogado pela Lei Complementar 116/03, como já dito acima, em especial pela natureza do servido prestado, que é essencialmente pessoal e exercido por delegação do Poder Público, e não sobre a receita bruta de toda arrecadação.

Posto isso, JULGO PROCEDENTE a pretensão para determinar o recolhimento do ISSQN pela requerente pelo regime especial estabelecido no Decreto-Lei 406/68. Condeno a requerida ao pagamento das custas processuais e verba honorária que fixo em R$800,00, com espeque na norma do artigo 20, parágrafo 4º, do Código de Processo Civil. Oficie-se aos demais Serviços Delegados a respeito do teor desta decisão acompanhada por cópia da sentença. P. R. I. C. Sumaré, 02 de julho de 2009.

ANDRÉ GONÇALVES FERNANDES
Juiz de Direito


Fonte: Site da Arpen-SP - 10/07/2009.

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