A transferência de bens do devedor ocorrida
após a inscrição do débito tributário em dívida ativa configura fraude
contra a execução fiscal, independentemente de haver qualquer registro de
penhora e de ser provada a má-fé do adquirente. Essas condições são
exigíveis apenas para se caracterizar a fraude em caso de dívidas não
tributárias, conforme decidiu a Primeira Seção do Superior Tribunal de
Justiça (STJ).
A decisão foi tomada no julgamento de um recurso da fazenda nacional
destacado como representativo de controvérsia. De acordo com o artigo 543-C
do Código de Processo Civil, o entendimento deverá agora orientar as
decisões da Justiça sobre os demais recursos que abordam a mesma questão
jurídica, e que haviam sido sobrestados à espera de uma posição do STJ.
O relator do caso, ministro Luiz Fux, afirmou em seu voto que “a lei
especial prevalece sobre a lei geral, por isso que a Súmula 375 do STJ não
se aplica às execuções fiscais”. A súmula citada diz que “o reconhecimento
da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da
prova de má-fé do terceiro adquirente”.
De acordo com o ministro, isso é válido para as demandas cíveis, reguladas
pelo Código Civil e pelo Código de Processo Civil. Já a fraude à execução
fiscal é tratada pelo artigo 185 do Código Tributário Nacional (CTN). “Os
precedentes que levaram à edição da Súmula 375 não foram exarados em
processos tributários”, disse ele.
Na origem do processo, a Fazenda Nacional ajuizou ação para executar a
dívida de um contribuinte do Paraná. Três dias depois de receber a citação,
em outubro de 2005, o contribuinte vendeu uma motocicleta importada da marca
Yamaha, ano 2000. Em 2007, a Justiça deferiu a penhora do veículo. O
comprador, então, entrou com embargos de terceiro, que foram julgados
procedentes na primeira instância.
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) manteve a decisão do juiz.
“Não se configura fraude à execução se, à época da compra e venda, inexistia
restrição judicial sobre o veículo alienado. Mesmo com a citação do devedor,
prévia à alienação do bem, seria necessário que o credor provasse a ciência
do adquirente acerca da execução fiscal contra o alienante, para que se
configurasse a fraude”, afirmou o tribunal regional.
Caráter absoluto
Ao analisar o recurso da Fazenda contra a decisão do TRF4, o ministro Luiz
Fux assinalou que, segundo o artigo 185 do CTN, “consideram-se fraudulentas
as alienações efetuadas pelo devedor fiscal após a inscrição do crédito
tributário na dívida ativa”. Antes de junho de 2005, quando esse artigo foi
modificado, era preciso que a venda ocorresse após a citação do devedor.
“A fraude de execução, diversamente da fraude contra credores, tem caráter
absoluto” – afirmou o relator, esclarecendo que nesse caso não há
necessidade de se provar conluio entre o vendedor e o comprador. Para o
ministro, a constatação da fraude é objetiva e não depende da intenção de
quem participou do negócio: “Basta que, na prática, tenha havido frustração
da execução em razão da alienação”.
“A diferença de tratamento entre a fraude civil e a fraude fiscal
justifica-se pelo fato de que, na primeira hipótese, afronta-se interesse
privado, ao passo que, na segunda, interesse público”, disse o ministro,
destacando que “o recolhimento dos tributos serve à satisfação das
necessidades coletivas”.
Também o registro da penhora, segundo o ministro, “não pode ser exigência à
caracterização da fraude no âmbito dos créditos tributários”, pois nesse
caso há uma regra específica – o artigo 185 do CTN, que estabelece, como
únicos requisitos para a configuração da fraude, a inscrição da dívida em
data anterior à alienação e a inexistência de outros bens que possam
satisfazer o credor.
Com esse entendimento unânime, a Primeira Seção decidiu o caso a favor da
Fazenda.
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