Desnecessidade de apresentação da CND Estadual referente às escrituras lavradas antes da Lei n. 14.699, de 07/08/2003

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS - JUSTIÇA DE 1ª INSTÂNCIA

VARA DE REGISTROS PÚBLICOS
GABINETE DO JUIZ DE DIREITO
COMARCA DA CAPITAL

Processo n. 024.03.163.081-7

Vistos em Sentença.

Dúvida deflagrada perante este Juízo especializado pelo Oficial do 5º Registro de Imóveis de Belo Horizonte, a requerimento de Joab de Oliveira Lima, a propósito de escritura de compra e venda lavrada em notas no 1º Ofício local, tendo por objeto o imóvel matriculado sob o n. 82.097, sendo vendedora Virgínia Maria Ruas Moreira.

Aponta o digno Oficial Registrador que não foi apresentada quando da lavratura do documento a certidão negativa de débitos tributários estaduais. Alega que em agosto do corrente ano foi editada a Lei Estadual n. 14.699, passando a ser obrigatória a apresentação da certidão negativa para a lavratura de escritura pública de compra e venda. Aduz que a escritura pública foi lavrada antes da edição da Lei.

Assim sendo, requer seja dirimida a dúvida ora declarada para que se decida sobre a necessidade de se exigir a certidão no ato de registro..

O interessado apresentou impugnação alegando que a Lei não pode retroagir para atingir efeito jurídico perfeito.

O Dr. Curador de Registros Públicos manifestou-se pela improcedência da dúvida, sob o argumento de que ao tempo da lavratura a Lei não exigia a apresentação da certidão.

É a síntese, no essencial. DECIDO.

Melhor examinando a matéria aqui controvertida, isto é, sobre a necessidade ou não de apresentação da CND estadual, entendo que a exigência somente será válida para a época da lavratura da escritura de compra e venda, conforme nova redação do art. 219, e seu § 2º, da Lei n. 6.763, de 26 de dezembro de 1975, alterada pela Lei n. 14.699, de agosto de 2003, muito embora reconhecendo e louvando o zelo do registrador em procurar assegurar e preservar a segurança da própria adquirente do imóvel.

O princípio da irretroatividade das leis é adotado como regra pela Constituição da República e pela Lei de Introdução ao Código Civil (artigo 6º), e o da retroatividade como exceção. Tal exceção só pode ser aplicada: a) quando não ofender o ato jurídico perfeito (já consumado), o direito adquirido (já se incorporou definitivamente ao patrimônio e à personalidade de seu titular) e a coisa julgada (imutabilidade dos efeitos da sentença, não mais sujeita a recursos); b) quando o legislador, expressamente, mandar aplicá-la a casos pretéritos, mesmo que a palavra "retroatividade" não seja usada.

Desta forma, observa-se no caso que a Lei não poderia retroagir para se exigir a certidão do fato consumado, ato jurídico perfeito, uma vez que, ressalte-se, a Lei não o exigia à época da lavratura da escritura pública.

Frise-se, por outro lado, que o próprio adquirente e aqui suscitado está fazendo questão de deixar de lado a segurança adicional proporcionada pelo cumprimento da exigência do suscitante e que somente a ele próprio viria proteger.

Pelo exposto, desacolho a presente declaração de Dúvida, recomendando ao Oficial que proceda com o registro do título apresentado.

Isento de custas, nos termos do art. 207, da Lei de Registros Públicos. Com o trânsito, à baixa e arquivo dos autos.
 
P.R.I.

Belo Horizonte, 10 de dezembro de 2003.

JUIZ MARCELO GUIMARÃES RODRIGUES