Credor pode desistir de execução sem que devedor concorde


Ao credor é facultado desistir da execução independentemente da anuência do devedor. O entendimento adveio da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), seguindo decisão do ministro Raphael de Barros Monteiro.

O Banco do Brasil S/A entrou com ação de execução por título extrajudicial (cédulas de crédito rural) contra João Bosco Filizzola e Gracinda Mendes Tavares Filizzola. Posteriormente, pediu desistência da execução, o que foi homologado em primeira instância, tendo o juiz extinguido essa ação, assim como os embargos opostos pela devedora, sem o julgamento do mérito, com base nos artigos 569 e 267, VIII, do Código Processual Civil (CPC), impondo à instituição a obrigação quanto às custas e aos honorários advocatícios no valor de R$ 2 mil.

O casal apelou, e a Quinta Câmara Cível do Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais, à unanimidade de votos, deu provimento ao apelo dos executados para cassar a sentença e determinar o prosseguimento dos embargos. O entendimento foi que, se os embargos não envolvem apenas questões processuais, mas a própria relação creditícia (questão material), o pedido de desistência da execução só pode ser acolhido após ser definido o valor do crédito, impugnado através dos embargos.

A decisão levou o Banco do Brasil a recorrer ao STJ, argumentando que o credor pode desistir do processo de execução em qualquer caso, independentemente da concordância do executado. Afirmou ainda que o parágrafo único do mencionado artigo 569 do CPC, introduzido pela Lei n. 8.953/94, apenas dispôs sobre os efeitos da desistência em relação à ação de embargos; manteve, porém, íntegro o princípio de que a execução existe para satisfação do direito do credor.

Ao apreciar o recurso, o relator, ministro Barros Monteiro, entendeu que o banco tem razão quanto ao seu objetivo de ver o pedido de desistência da execução analisado desde logo, pois ao credor é dado desistir da execução independentemente da anuência do devedor, conforme dispõe o artigo 569, caput, do CPC: O credor tem a faculdade de desistir de toda a execução ou de apenas algumas medidas executivas.

Para o ministro, é diferente a situação dos embargos do devedor em relação à desistência da execução. "Se esses embargos versarem questão de natureza exclusivamente processual, serão eles também considerados extintos (art. 569, parágrafo único, alínea ‘a’, do Código de Processo Civil). Se, porém, de outro lado, cuidarem eles de questão relativa ao direito material, ou seja, da própria relação creditícia, a extinção dependerá da concordância do executado embargante (alínea ‘b’ do referido parágrafo único)."

A própria jurisprudência do STJ segue nesse sentido; o precedente do ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira afirma que "constitui princípio, albergado na legislação vigente (CPC, art. 569), que o exeqüente tem a livre disponibilidade da execução, podendo desistir a qualquer momento, em relação a um, a alguns ou a todos os executados, mesmo porque a execução existe em proveito do credor, para a satisfação do seu crédito". Conclui que, se a desistência ocorre após o oferecimento dos embargos, imprescindível se faz a audiência da parte executada para aferir-se o seu interesse no prosseguimento dos embargos.

Explica o ministro Barros Monteiro que isso significa ter o credor a faculdade de, a qualquer tempo, desistir da execução, mantido que se acha o princípio segundo o qual "a execução existe para a satisfação do direito do credor (cfr. REsp n. 75.057-MG, relator Ministro Ruy Rosado)". E continua: "o devedor é que, na forma do disposto no parágrafo único do indigitado art. 569 da Lei Processual Civil, pode opor-se à extinção dos embargos quando neles tiver suscitado questões de direito material".

De acordo com o relator, disso tudo resulta que o acórdão da Justiça mineira, ao relegar a apreciação do pedido de desistência para a oportunidade posterior ao julgamento dos embargos do devedor, efetivamente contrariou a regra do artigo 569 do Código de Processo Civil, discordando, além do mais, do julgado proferido pela própria Quarta Turma do STJ.

"É caso, assim, de decretar-se a extinção da execução nos termos do art. 267, VIII, combinado com o art. 569, ambos do diploma processual civil. A ação de embargos deverá prosseguir em seus ulteriores termos, conforme ordenado pelo decisum recorrido, até final sentença que então definirá os encargos sucumbenciais pertinentes à controvérsia", concluiu o relator, julgando, assim, extinta a execução sem o conhecimento do mérito.

 

Fonte: Site do STJ - 23/12/2005