Direito de preferência - Inaplicabilidade do art. 504 CC - Imóvel passível de cômoda divisão

APELAÇÃO CÍVEL - DIREITO DE PREFERÊNCIA DO CONDÔMINO À AQUISIÇÃO DO IMÓVEL - AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO PRÉVIA - ART. 504 DO CC/2002 - INAPLICABILIDADE - IMÓVEL PASSÍVEL DE CÔMODA DIVISÃO - SENTENÇA MANTIDA

- É inaplicável o disposto no art. 504 do CC/2002, sendo, pois, dispensável a notificação prévia da alienação ao condômino se o imóvel for divisível.

Apelação Cível n° 1.0710.04.007836-6/001 - Comarca de Vazante - Apelante: Gilberto Batista Diniz e outros - Apelados: Calsimec Indústria Comércio Ltda., José Gustavo Rosa e outros - Relator: Des. Generoso Filho

A C Ó R D Ã O

Vistos etc., acorda, em Turma, a 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, em rejeitar preliminar e negar provimento.

Belo Horizonte, 24 de março de 2009. - Generoso Filho - Relator.

N O T A S  T A Q U I G R Á F I C A S

DES. GENEROSO FILHO - Consta dos autos que foi proposta ação de preferência para a aquisição de imóvel, proposta por Gilberto Batista Diniz e outros em face de Calsimec Indústria Comércio Ltda. e José Gustavo Rosa e outros, na qual alegam serem proprietários de um imóvel, em condomínio com os requeridos, tendo estes últimos alienado suas frações ideais, sem antes notificá-los para exercer o seu direito de preferência.

Em sentença proferida às f. 119/123, o MM. Juiz a quo afastou a preliminar arguida, bem como a prejudicial de mérito, julgando improcedente o pedido, por entender ser inaplicável ao caso o disposto no art. 504 do CC/2002, já que o imóvel não seria indivisível, ainda que eventualmente esteja indiviso.

Dessa decisão, insurge-se Gilberto Batista Diniz e outros, alegando, às f. 126/133, inicialmente, que há divergência entre as datas da publicação da sentença, "induzindo a um raciocínio lógico, s.m.j., de sentença adredemente preparada" (f. 126), que pede seja analisada por este Tribunal. No mérito, narram que, na data de 14.07.2004, os requeridos venderam a área de 14.414,34 m² de terra no local denominado Fazenda Vazantes, sendo que, na mesma fazenda, os apelantes afirmam possuir a área de 127.769,11m², dentro da área maior de 433.430,48m², que é a área total do condomínio. Afirmam não terem sido notificados para exercer o direito que lhes é assegurado pelo art. 504 do CC/2002, pelo que ajuizaram a ação e efetuaram o depósito do valor referente ao negócio. Mencionam divergência entre o acórdão citado na sentença e o caso ora tratado. Aduzem que tiveram grande prejuízo com a venda do referido imóvel, já que os apelados teriam escolhido a melhor parte do imóvel, desrespeitando, dessa forma, a igualdade entre os condôminos. Dizem que os apelados violaram o disposto no art. 1.314 do CC/2002, que deverá ser conjugado com o disposto no art. 504 do CC/2002. Citam julgados do STJ e deste Tribunal a respeito. Por fim, afirmam que, sendo o valor da causa fixado em R$ 2.490,00, não poderia o valor dos honorários advocatícios ser fixado em R$ 1.000,00, sendo excessiva e incompatível com o valor econômico da causa. Por essas razões, requerem seja reformada a sentença e julgado procedente o pedido.

Os primeiros apelados apresentaram contrarrazões às f. 150/154, alegando, preliminarmente, a deserção do recurso e, no mérito, requerendo a manutenção da sentença.

Os segundos apelados apresentaram contrarrazões às f. 155/161, rebatendo as alegações dos apelantes e requerendo a manutenção da sentença.

Decido.

Preliminarmente.

Rejeito a preliminar de deserção do recurso, tendo em vista que foi devidamente recolhido o preparo, conforme se confere à f. 125-v.

Quanto à dúvida suscitada em relação às datas de publicação da sentença, apenas verifico que houve um equívoco, que não ensejou prejuízo aos apelantes, já que foram regularmente intimados da decisão.

Do mérito.

O pedido dos apelantes embasa-se no disposto no art. 504 do CC/2002, segundo o qual:

"Art. 504. Não pode um condômino em coisa indivisível vender a sua parte a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto. O condômino, a quem não se der conhecimento da venda, poderá, depositando o preço, haver para si a parte vendida a estranhos, se o requerer no prazo de cento e oitenta dias, sob pena de decadência".

A controvérsia em torno do mencionado dispositivo legal está em saber se a indivisibilidade compreende os imóveis que, embora indivisos, sejam passíveis de divisão, ou se referem apenas aos indivisíveis por natureza ou por força de lei, havendo divergência na doutrina e jurisprudência sobre o tema.

Adoto o primeiro posicionamento, como bem explicitado na sentença, "a norma em questão visa à pacificação social, a fim de evitar que um terceiro passe a ser proprietário comum de um bem indivisível, fisicamente, ou que a lei vede a sua divisão, esse é o inconveniente a ser evitado, as coisas impassíveis de divisão quando com muitos possuidores tendem a gerar relações mais complexas, que podem piorar quando um condômino é um estranho" (f. 121). No entanto, sendo o imóvel passível de divisão, é inaplicável o referido artigo, já que há possibilidade de ser desmembrado o bem, evitando-se que haja conflito com os demais condôminos.

Nesse sentido:

"Civil. Condomínio. Direito de preferência. - A regra do art. 1.139 do Código Civil tem aplicação restrita às coisas indivisíveis, não sendo por ela abrangidas as simplesmente indivisas. Recursos conhecidos e providos" (REsp 109.787/MG, Rel. Ministro Waldemar Zveiter, Rel. p/ acórdão Min. Costa leite, Terceira Turma, j. em 17.08.1999, DJ de 17.12.1999, p. 351).

Sobre o assunto, vale trazer a seguinte lição:

"Se a coisa é divisível, nada impede que o condômino venda a sua parte a estranho, sem dar preferência aos seus consortes, pois estes, se não desejarem compartilhar o bem com aquele, poderão requerer a sua divisão" (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2004, v. III, p. 220).

No caso ora tratado, verifico que o imóvel, embora esteja indiviso, é passível de cômoda divisão, sem qualquer alteração da destinação, já que a área total é de 43.39.30,48 ha, e a fração ideal (01.44.14,34ha.), havendo certidão da Prefeitura Municipal de Vazante à f. 76 declarando que o imóvel "divide-se com perímetro urbano desta cidade, é passível para ser loteada em conformidade com as legislações pertinentes para o caso".

Portanto, não há que se falar em indivisibilidade da parte do imóvel alienada, não se aplicando ao caso as disposições do art. 504 do Código Civil.

Nem há que se falar na impossibilidade da divisão em razão da existência de ônus de restrição de uso sobre o imóvel em razão da exploração de minério, que inclusive já foi cancelado em dezembro de 2004, já que não impede a divisão do imóvel, apenas limita a sua utilização.

No que se refere à aplicação do disposto no art. 1.314 do CC/2002, entendo não haver incompatibilidade com o disposto no art. 504, tendo em vista a possibilidade de divisão do imóvel e consequente alienação do mesmo, permitindo ao proprietário se utilizar, em conformidade com o art. 1.228 do CC/2002.

Finalmente, entendo que o valor arbitrado a título de honorários (R$ 1.000,00), respeitou os limites impostos em lei, baseado nos requisitos previstos no § 3º do art. 20 do CPC, quais sejam o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e a importância da causa, o trabalho realizado pelo procurador e o tempo exigido para o serviço, devendo ser mantida a sentença, nesse ponto.

Pelo exposto, rejeito a preliminar e nego provimento ao recurso.

Custas recursais, pelos apelantes.

DES. OSMANDO ALMEIDA - Trata-se de apelação aviada por Gilberto Batista Diniz e Conceição Aparecida de Lourdes Batista Diniz contra a r. sentença de f. 119/123, proferida pelo MM. Juiz de Direito da Comarca de Vazante nos autos da ação de preferência intentada pelos ora apelantes contra a Calsimec Indústria e Comércio, José Gustavo Rosa e Nízia Pereira da Silva Rosa.

A r. decisão objurgada julgou improcedente o pedido inicial, impondo a sucumbência, fixados os honorários advocatícios em R$ 1.000,00 (mil reais) para cada parte requerida, com fundamento no art. 20, § 4º, do Código de Processo Civil, o que causou a insurgência dos apelantes que pretendem a sua reforma.

Insurgem-se, inicialmente, contra a demora do Juízo em proferir a r. sentença, asseverando que há erro nas datas da r. decisão e as certificadas pelo cartório, suscitando ser "paradoxal a demora em sentenciar e a pressa em certificar e publicar tal sentença com datas divergentes induzindo a um raciocínio lógico, s.m.j., de sentença adredemente preparada" (f. 126), sugerindo erro de conduta, afirmando que "tais fatos são incomuns e causam dúvida. À Justiça e aos seus operadores não poderão jamais pesar suspeitas quanto à conduta, ainda mais em se tratando do MM. Julgador e do Escrivão, que são responsáveis pelo funcionamento do Judiciário. Esse fato precisa ser submetido ao crivo deste Tribunal para evitar exceções de suspeição" - f. 126/127. Alegam que intentaram a presente ação visando o desfazimento do negócio celebrado entre os réus, ao fundamento de que foram preteridos no seu direito de preferência e prejudicados com a venda de parte do imóvel, do que não foram sequer notificados. Dizem que houve o depósito do preço e que nenhum prejuízo, portanto, haverá para os recorridos com o desfazimento do negócio. Alegam que a venda, tal como feita, causou aos recorrentes grande prejuízo, pois "os adquirentes escolheram a seu bel prazer o local ideal para a sua posse, ou seja, o ponto mais comercial de todo o imóvel, desrespeitando o equitativo de cada condômino" - f. 130. Insurgem ainda os recorrentes contra o montante dos honorários fixados, alegando que se revelam excessivos, "incompatível com o valor econômico da causa, representando uma pena injusta" - f. 133. Pugnam, ao final, pelo provimento do recurso com o reconhecimento da procedência do pedido e a modificação dos honorários. Com as razões, vieram cópias de decisões - f. 134/147.

Vieram as contrarrazões de f. 150/154 e 155/161, sendo que a apelada Calsimec Indústria e Comércio Ltda. suscitou preliminar de não conhecimento, alegando deserção. No mérito, ambos os recorridos estão em evidente infirmação.

Por prejudicial, passo à análise da preliminar deduzida pelos apelados.

Preliminar - Deserção do recurso - Violação do art. 511 do Código de Processo Civil.

Alega a apelada Calsimec Indústria e Comércio Ltda. que a apelação deve ser julgada deserta ante a ausência de regular preparo, devendo os apelantes sofrer as sanções previstas no art. 511 do Código de Processo Civil.

Sem nenhuma razão. Penso que passou despercebido para a recorrida que a parte apelante efetivou regularmente o preparo, conforme consta das respectivas guias de f. 125-v., obedecida, portanto, a regra legal dita violada, pelo que nada mais há para ser dito a respeito, sob pena de tautologia.

Rejeito a preliminar.

Passo à análise do recurso aviado e o faço, inicialmente, pela alegação trazida quanto ao que o apelante entende tratar-se de irregularidade nas datas apostas no processo. Entendo que essa questão não merece ser examinada como preliminar, seja porque assim não foi arguida, seja porque as divergências de datas se me aparentam mero erro material que, em nada, absolutamente nada, prejudicou os recorrentes.

Ressalto, inicialmente, que a presteza na solução dos conflitos é a grande meta buscada por aqueles que aplicam o direito e que os atrasos no trâmite procedimental decorrem, evidentemente, do acúmulo de processos que superlotam as prateleiras dos nossos cartórios e gabinetes, inviabilizando a célere prestação jurisdicional.

De outro lado, a data aposta na r. sentença (01.02.2008 - f. 123) e aquela constante da certidão de f. 123-v. (30.01.2008) revelam-se simples erro material, não podendo ser alçado à condição de nulidade, visto que, como dito alhures, nenhum prejuízo foi causado aos apelantes que interpuseram o recurso dentro do prazo legal (11.02.2008), sequer exaurindo todo ele.

Suma venia, nefelibata e inoportuna a alegação de que a r. sentença fora "adredemente preparada", pois isso implicaria grave acusação contra o d. Magistrado presidente do feito. Na verdade, os apelantes trouxeram ao conhecimento do Tribunal fatos que, por si só, não resultam em comprometimento da imparcialidade do Magistrado e, igualmente, não evidenciam prejulgamento da lide ou mesmo o interesse no julgamento da causa a favor de uma das partes de forma a caracterizar a sua suspeição, que deve ser fundada necessariamente em um dos motivos enumerados no art. 135 do Código de Processo Civil e demanda procedimento próprio, do que se pode aferir, não manejado pelos recorrentes.

Quanto ao mérito, esclareço que a questão alegada pelos apelantes de que "os adquirentes escolheram a seu bel prazer o local ideal para a sua posse, ou seja, o ponto mais comercial de todo o imóvel, desrespeitando o equitativo de cada condômino" - f. 130 - demanda, em tese, procedimento próprio, além do que foi inovada em sede de apelação, o que não se pode admitir ante os constitucionais princípios do plurigrau, da ampla defesa e do contraditório, não podendo ser objeto de análise nesta instância revisora.

Batem-se os apelantes pela possibilidade de sua pretensão, alegando que "não se pode ler o art. 504 do Código Civil de forma isolada, uma vez que, se assim se proceder, o art. 1.314, como seu parágrafo único, seria absolutamente inútil, porquanto sem finalidade nenhuma" - f. 130. Entretanto, razão não lhes assiste.

Estabelece o art. 504 do Código Civil que não pode um condômino em coisa indivisível vender a sua parte a estranhos se outro consorte a quiser tanto por tanto; ipso facto e a contrario sensu, em se tratando de coisa divisível, não cabe ao condômino a preferência.

Confiram-se as disposições do texto legal referido:

"Não pode um condômino em coisa indivisível vender a sua parte a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto. O condômino, a quem não se der conhecimento da venda, poderá, depositando o preço, haver para si a parte vendida a estranho, se o requerer no prazo de cento e oitenta dias, sob pena de decadência".

E o parágrafo único:

"Sendo muitos os condôminos, preferirá o que tiver benfeitorias de maior valor e, na falta de benfeitorias, o de quinhão maior. Se as partes forem iguais, haverão a parte venda os comproprietários, que a quiserem, depositando previamente o preço".

Muito ao propósito, trago aqui a lição do inolvidável Carlos Maximiliano sobre a interpretação dos textos legais:

"Em geral, a função do juiz, quanto aos textos, é dilatar, completar e compreender; porém não alterar, corrigir, substituir. Pode melhorar o dispositivo, graças à interpretação larga e hábil; porém não - negar a Lei, decidir o contrário do que a mesma estabelece. A jurisprudência desenvolve e aperfeiçoa o Direito, porém como que inconscientemente, com o intuito de o compreender e bem aplicar. Não cria, reconhece o que existe; não formula, descobre e revela o preceito em vigor e adaptável à espécie. Examina o Código, perquirindo das circunstâncias culturais e psicológicas em que ele surgiu e se desenvolveu o seu espírito; faz a crítica dos dispositivos em face da ética e das ciências sociais; interpreta a regra com a preocupação de fazer prevalecer a justiça ideal (Richtiges Recht); porém tudo procura achar e resolver com a lei; jamais com a intenção descoberta de agir por conta própria, proeter ou contra legem.

Todo Direito escrito encerra uma parcela de injustiça. Parece justa a regra somente quando as diferenças entre ela e o fato são insignificantes, insensíveis. Preceitua de um modo geral; é impossível adaptá-la, em absoluto, às mil circunstâncias várias dos casos particulares. Permitir abandoná-la então, sob o pretexto de buscar atingir o ideal de justiça, importaria em criar mal maior; porque a vantagem precípua das codificações consiste na certeza, na relativa estabilidade do Direito.

A norma positiva não é um conjunto de preceitos rijos, cadavéricos, e criados pela vontade humana; é uma força viva, operante, suscetível de desenvolvimento; mas o progresso e a adaptação à realidade efetuam-se de acordo, aproximando, ou pelo menos aparente, com o texto; não em contraste com este".

Ainda que tão somente para argumentar, se fosse admissível o direito de preferência reclamado, percebe-se que consta do aditamento da escritura de compra e venda encartada às f. 25 que houve alteração do valor de venda do imóvel para R$ 27.500,00 (vinte e sete mil e quinhentos reais), valor impugnado pelos apelantes às f. 67; entretanto prova alguma fizeram no sentido de comprovar a simulação do preço de venda do terreno.

Sobre a alegada contradição entre os arts. 504 e 1.314 do Código Civil, constata-se que o e. Des. Luciano Pinto, no julgamento da Apelação 1.0155.04.007507-1, bem definiu a matéria, quando dispôs no corpo do seu voto, o qual se amolda como mão à luva à hipótese em julgamento:

"Nesse contexto, se se pretender que se deva extrair do art. 504 do Código Civil a idéia, implícita de que, quando ali se diz coisa indivisível, se está também a dizer coisa indivisa, deve-se, por consequência, então, aceitar que, em nenhuma hipótese, pode haver a venda de fração condominial a estranho sem que haja direito de preempção, contudo, tal raciocínio equivocado iria implicar a absoluta inutilidade do art. 1.314 e de seu parágrafo único do mesmo Código.

Isso porque o art. 1.314 permite o alheamento (rectius: venda) de fração ideal a terceiro, sendo que o parágrafo único do mesmo artigo, quando determina que nenhum dos condôminos pode dar posse de parte da coisa comum a terceiro, sem o consenso dos demais, tão só, na harmonia do sistema, reconhece a possibilidade da venda, mas ressalva que a posse dela decorrente só pode ser pela via consensual (e quando tal via não sobrevenha, por óbvio, a mesma harmonia do sistema resolve a situação com a ação de divisão, quando a parte vendida é então destacada, haja vista a natureza divisível do todo).

Ora, imaginar que o art. 1.314 e seu parágrafo único do Código Civil têm comandos vãos em face de uma leitura (diga-se: equivocada) do art. 504 do mesmo Código implica violação ao sistema do Código, além de desprezo ao bordão de que a lei não tem palavras demais.

Além disso, mesmo se se pretendesse que haveria uma contradição entre os arts. 504 e 1.314 do Código Civil, em razão do argumento sedes materiae, o art. 504 se sobrelevaria, dada a dimensão de peso (dimension of weight).

Assim, como o art. 504 do Código Civil figura no tópico das relações contratuais e, como na presente demanda se busca a ineficácia do contrato, por óbvio, em razão da sede da matéria, ele é sobrelevante; e o fato de ele assinalar a vedação da alienação por condômino de coisa indivisível impõe, por lógica inelutável, o entendimento de que, quando a coisa seja divisível, possa haver a venda.

Isso de tal artigo estar a cavaleiro não implica a perda da juridicidade do art. 1.314 e seu parágrafo único do mesmo Código Civil, porque, como já dito, a situação há de resolver-se por superveniente divisão para destaque da parte vendida, dando-se, pois, completa harmonia ao sistema. [...]

No REsp nº 60.656-0/SP, o Min. Eduardo Ribeiro, após discorrer sobre a diversidade de entendimentos em relação à questão, assim se pronunciou:

'Com todo o respeito de que é merecedor esse entendimento, peço vênia para manter-me fiel ao acolhido nesta Terceira Turma. Para que aquele outro se pudesse aceitar, seria necessário admitir-se que a expressão 'indivisível', contida no artigo 1.139 do Código Civil, equivale a 'indivisa', aumentando-se notavelmente a restrição estabelecida pela lei. E isso não se me afigura viável.

Com efeito, caso se pretendesse fazê-la mais ampla, abrangendo também as divisíveis, embora não divididas, bastaria se houvesse consignado que ao condômino não era dado vender sua parte a estranhos. Não seria mister referência a coisa indivisa, já que o condomínio supõe a indivisão. Fez-se constar, entretanto, que não poderia efetuar a venda o condômino 'em coisa indivisível' e a exegese ora em exame importa supressão dessas palavras.

Interessante salientar, de outra parte, que, segundo relata Agostinho Alvim, não havia, no texto do projeto de Código Civil, originário da Câmara, alusão a coisa indivisível. Dizia simplesmente: 'Não podem os condôminos vender a estranhos sua respectiva parte...'. A modificação resultou de emenda introduzida no Senado, por Rui Barbosa, que observou não se dever aplicar a norma a qualquer espécie de propriedade comum, mas só à coisa indivisível (Da compra e venda. 1ª ed. Rio de Janeiro: Forense, p. 114/5).

[...]

Ora, em nenhum momento da petição inicial foi dito que o imóvel em questão é indivisível, mas, tão só indiviso".

Conclui-se, portanto, que não cabe a preferência em se tratando de direitos hereditários sobre bem divisível. Assim sendo, qualquer herdeiro pode ceder o seu direito à herança a estranho sem o consentimento dos demais herdeiros.

Por fim, insurgem-se os apelantes contra os honorários de sucumbência, fixados em R$ 1.000,00 (mil reais), "para cada parte requerida", pedindo a sua redução considerando-se o valor de R$ 2.490,00 (dois mil, quatrocentos e noventa reais) dado à causa e à sua simplicidade.

Data venia, aqui também a queixa recursal não tem como ser ouvida. O § 4º do art. 20 do Código de Processo Civil estabelece que, nas causas de pequeno valor, nas de valor inestimável, naquelas em que não houver condenação ou for vencida a Fazenda Pública e nas execuções, os honorários serão fixados consoante apreciação equitativa do juiz, atendidas as normas das alíneas a, b e c do parágrafo anterior.

Por sua vez, o parágrafo terceiro prevê que os honorários advocatícios serão fixados devendo se levar em conta o grau de zelo do profissional, o lugar da prestação de serviço, a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.

Compulsando os autos, verifica-se que, desde o ajuizamento da demanda (17.12.2004, verso da 2º capa) até a presente data já se passaram aproximadamente 4 anos e 2 meses. Assim, pode-se afirmar que o tempo exigido para o serviço até o momento foi de certa forma razoável.

Lado outro, convém destacar o zelo profissional despendido pelos procuradores da parte ex-adversa, que, além da elaboração das peças de defesa e juntada de documentos, participaram de audiência, ainda apresentaram resposta ao presente recurso, bem como realizaram outros atos que se fizeram necessários para o deslinde processual.

Entendo, portanto, que a fixação dos honorários advocatícios em R$ 1.000,00, (mil reais) para o patrono de cada parte contrária se mostra equânime com os trabalhos realizados durante o trâmite do processo e em conformidade com os parâmetros legais.

Com tais acréscimos, acompanho o e. Relator e também rejeito a preliminar trazida com as contrarrazões e nego provimento à apelação.

DES. TARCISIO MARTINS COSTA - De acordo.

Súmula - REJEITARAM PRELIMINAR E NEGARAM PROVIMENTO.


Fonte: Diário do Judiciário Eletrônico do TJMG  - 24/08/2009.

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