Agravo de Instrumento - Reintegração de posse - Liminar - Descabimento - Ausência de posse nova

- A ocupação de bem público decorrente de ato formal emanado da Administração, como contrato de concessão de direito real de uso, transfere a posse da coisa.

- Ausente a posse nova, datada de ano e dia, é incabível a concessão de liminar na ação reintegratória.

Agravo de Instrumento Cível n° 1.0422.09.010054-2/001 - Comarca de Miraí - Agravante: Município de Miraí - Agravado: Esporte Clube Primeiro de Maio - Relatora: Des.ª Heloísa Combat

A C Ó R D Ã O

Vistos etc., acorda, em Turma, a 7ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador Wander Marotta, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, em negar provimento.

Belo Horizonte, 15 de dezembro de 2009. - Heloísa Combat - Relatora.

N O T A S T A Q U I G R Á F I C A S

DES.ª HELOÍSA COMBAT - Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo Município de Miraí contra a r. decisão do MM. Juiz da Comarca de Miraí, que, nos autos de ação de reintegração de posse, indeferiu a liminar prevista no art. 928 do CPC por entender ausentes os requisitos autorizadores da medida, mormente a posse nova.

Alega o recorrente que o esbulho se iniciou no momento em que o agravado se recusou a se retirar do imóvel, após transcorridos o prazo de 30 dias estabelecido pelo Município.

Aduz que o agravado é mero detentor do imóvel, e não possuidor. Subsidiariamente, alega que, se este fosse possuidor, tratar-se-ia de posse precária.

Ao final, requer seja dado provimento ao recurso, para reformar a r. decisão monocrática.

Ausente o preparo em razão de prerrogativa de ente público.

Indeferido o efeito suspensivo pleiteado às f. 111/112.

Informações prestadas às f. 122/123.

Contraminuta às f. 126/132.

Decido.

Inicialmente, cumpre ressaltar que o agravado não é mero detentor do bem, mas sim possuidor.

Nos termos do art. 1.198 do Código Civil, "considera-se detentor aquele que, achando-se em relação de dependência para com outro, conserva a posse em nome deste e em cumprimento de ordens ou instruções suas". Nada obstante, esta não é a hipótese dos autos.

Como cediço, posse é o exercício de fato de algum dos poderes inerentes à propriedade, quais sejam: usar, gozar e dispor da coisa, bem como reivindicá-la de quem quer que a injustamente possua ou detenha (CC, art. 1.196 c/c art. 1.228).

Assim sendo, conclui-se que o contrato de concessão de direito real de uso celebrado entre as partes transferiu ao agravado poderes inerentes à propriedade, mormente o uso, transferindo, assim, a posse do imóvel.

Vale ressaltar que, conforme reiterada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, quando a ocupação de um bem público é irregular, esta não induz a posse, somente a detenção. Todavia, no presente caso, a posse do agravado decorre de contrato de concessão do direito real de uso, instrumento previsto e regulado pelo Decreto-lei nº 271/67. Em se tratando de ocupação decorrente de ato formal emanado da Administração, como a outorga de concessão, reconhece-se a posse. Nesse sentido:

"Nestes autos, tem-se caso de ocupação de área pública, a qual, dada sua irregularidade, não pode ser reconhecida como posse, mas como mera detenção. Tal conclusão, registre-se, está assentada no próprio acórdão recorrido, que, a despeito de reconhecer a inexistência de posse, admitiu a existência do direito de retenção e obstaculizou o cumprimento do mandado de reintegração de posse. [...]

Ressalte-se que, neste feito, como se abstrai da decisão recorrida, não se vislumbra hipótese de uso especial de bem público legalmente titulado, mas de ocupação irregular de área pública, porque a utilização do imóvel se realiza de forma clandestina, sem base em qualquer ato unilateral ou contrato emanado da Administração.

E diga-se ainda que, somente naqueles casos quando admitido de maneira formal o uso do bem público, particularmente nas hipóteses de permissão e concessão, há de se cogitar do cabimento de eventual indenização pelos prejuízos advindos do ato revogatório" (STJ - REsp 556721/DF, Rel.ª Min.ª Eliana Calmon, 2ª T, j. em 15.09.2005, DJ de 03.10.2005, p. 172).

Verifico, portanto, que o agravado é possuidor do imóvel de propriedade do agravante, tendo tomado posse do mesmo em 1987, em decorrência de contrato administrativo de concessão de direito real de uso, conforme a escritura pública de f. 77/79-TJMG, devidamente averbada na matrícula do imóvel.

Como visto, a posse do agravado decorre diretamente do contrato celebrado, averbado na matrícula do imóvel, e vem sendo exercida há mais de 20 anos. Não há qualquer notícia nos autos do cancelamento deste registro no Cartório de Registro de Imóveis, donde não há de se contar o prazo de ano e dia a partir da notificação levada a termo pelo agravante, mas sim da concessão do direito real de uso, operada em 1987.

Incabível, assim, a liminar na presente ação possessória, visto que ausente a posse nova, requisito essencial da medida.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso, mantendo a decisão agravada por seus próprios fundamentos.

Custas, ex lege.

Votaram de acordo com a Relatora os Desembargadores Wander Marotta e Belizário de Lacerda.

Súmula - NEGARAM PROVIMENTO.


Fonte: Diário do Judiciário Eletrônico de MG - 30/09/2010.

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